LANÇAMENTOS DO MÊS EM DVD
coluna mensal

AME-ME ESTA NOITE, de Rouben Mamoulian
Love Me Tonight, EUA, 1932
(Classic Line)


Rouben Mamoulian foi o grande técnico do cinema americano dos anos 30, o que significa que seus filmes dataram muito depois que os experimentos deles foram bem assimilados em Hollywood. Quando fez Ame-me Esta Noite, porém, ainda estava em plena forma (basta comparar com sua outra imitação consciente de Ernst Lubistch, Meias de Seda de 57, que nunca vai além do burocrático). A opereta aqui jamais fluirá como nos filmes do mestre alemão, apesar do ótimo livreto de Rodgers e Hart. No lugar disso, somos jogados num verdadeiro festival de fogos de artifício. Mamoulian não simplesmente dirige um filme, ele precisa nos informar que cada fotograma foi DIRIGIDO. É esta super-direção que garante ao filme sua inegável condição de datado, mas também muito do seu charme. Somos transportados para um momento bastante particular do cinema e na pior das hipóteses o espectador terá uma noção do que passava por entretenimento elegante em 1932. A Classic Line vem fazendo um interessantíssimo trabalho de escavação da opereta, este fenômeno típico dos anos 30. Muitas delas são terríveis (basta ver as dirigidas por Robert Z. Leonard), mas são de inegável valor para o cinéfilo com interesse no cinema americano pré-segunda guerra. E este Ame-me Esta Noite é das melhores.


OS ETERNOS DESCONHECIDOS, de Mario Monicelli
I Soliti Ignoti, Itália, 1958
(Versátil)

Mario Monicelli é outro cineasta para o qual o tempo não foi muito feliz, a grande exceção com certeza sendo Os Eternos Desconhecidos, ainda um grande momento da comédia italiana. Monicelli sempre foi um meio-termo agradável entre o artesanato simpático mas esquecível de um Steno e a radicalidade de um Marco Ferreri. De certa forma é justamente desta posição que Os Eternos Desconhecidos se beneficia. O que Monicelli pratica aqui é o casamento entre a tradição da comédia italiana com certos preceitos já então desgastados do neo-realismo. O encontro dos dois lhes dá um propósito e energia que já não vinham encontrando em separado (Ermanno Olmi levaria a coisa bem mais adiante com O Posto). O equilíbrio entre miséria e humor que o cineasta pratica aqui permanece difícil de repetir, basta ver a primeira metade de Trapaceiros, de Woody Allen. De quebra, Monicelli sempre foi um ótimo diretor de atores, e o elenco aqui tem um pouco do melhor disponível no cinema italiano da época.


A NOITE DE SÃO LOURENÇO, Paolo e Vittorio Taviani
La Notte di San Lorenzo, Itália, 1982
(Versátil)

A Versátil acaba de lançar alguns filmes dos Irmãos Taviani, o melhor sendo este excelente filme de guerra. Os Taviani retornam a II Guerra a partir da perspectiva daqueles que estão derrotados independente do vencedor, mas todo trabalho deles aqui parece existir em função de colocar a guerra em suspenso. O tom de fabula impera – e este é o raro caso de filme onde o olhar infantil é tornado elemento estético – e é servido muito bem pela mistura de realismo e absurdo imposta pelos cineastas (o filme se estrutura como uma espécie de. Odisséia as avessa). Trata-se daquela raridade: um filme de guerra sobre o que acontece as margens do conflito (o que a ênfase dos cineastas nas crianças e idosos deixa mais aparente). A Guerra em si permanece ao mesmo tempo fora do quadro e como um espectro sobre a ação até finalmente retornar de forma caótica e absurda, uma lição de como não é preciso tremer a câmera e construir uma imagem falsamente documental para retratar o horror da batalha. Torce-se agora para a Versátil seguir lançando a obra dos Taviani, incluindo seus dois últimos filmes que permanecem inéditos por aqui.


A RODA DA FORTUNA, de Vincente Minnelli
The Band-Wagon, EUA, 1953
(Warner)

A Roda da Fortuna permanece o grande musical de Vincente Minnelli. A trama é a mais rasa possível, apesar de ter um elemento metalingüístico bem mais forte do que outros musicais sobre bastidores. A execução dos números musicais de Minnelli nunca foi tão precisa, o filme foi realizado no momento exato de equilíbrio, antes do diretor começar a perder o interesse do gênero em favor do melodrama (Some Came Running, Home From the Hill). Minnelli disputa com Demy e Edwards a posição de cineasta de obra mais negativa sobre uma superfície alegre e A Roda da Fortuna entrecorta cada coreografia com uma pesada dose de neurose e fracasso: Triplets continua o número musical mais estranho realizado na MGM e toda a precisão técnica não consegue espantar o aspecto sinistro da paródia noir do balé final. A Warner lança o filme aqui numa edição mais que caprichada, o grande destaque sendo um excelente making of realizado para o DVD, com entrevistas com os envolvidos ainda vivos, cuja força reside muito na forma como suas entrelinhas sugerem que as filmagens do filme foram tão caóticas e pesadas quanto o musical dentro do filme. A Warner também acaba de lançar outros dois musicais de Minnelli (A Lenda dos Beijos Perdidos e Essa Loura Vale um Milhão) que se não atingem a perfeição deste A Roda da Fortuna, ainda assim são filmes bastante fortes.


Filipe Furtado