KILLSHOT - TIRO CERTO
John Madden, Killshot, EUA, 2008

Mickey Rourke caiu de novo nas graças do público de cinema, e não se pode dizer que é um disparate. Hoje já se tornou possível ouvir um comentário (como o que ouvi quando me dirigia à sala de cinema) de um espectador interessado: “olha o poster do novo filme do Mickey Rourke, tô querendo ver, ele é muito massa”.

Curiosamente, Killshot - Tiro Certo, que estreia meses depois de O Lutador, foi filmado antes, mas teve seu lançamento adiado em dois anos.

Se há algo em comum entre os dois filmes é a incrível capacidade de Rourke de indicar o caminho, modular sua atuação com o restante do elenco e facilitar, assim, o trabalho do diretor na condução dos atores. Hitchcock dizia que ator é gado – numa frase mal interpretada por muitos – e, no caso, o boiadeiro é Rourke.

Dessa afirmação, o óbvio está implícito, apesar que de tão óbvio se torna explícito: quando o ator não está em cena, o filme parece não ter rumo, como um cão privado de seus sentidos. É fácil perceber isso nas cenas que envolvem Diane Lane e Tomas Jane (ótimo ator que já havíamos visto em ótima forma no excelente O Nevoeiro). Sente-se que algo está ausente, um ponto de vista, provavelmente, o que enfraquece tremendamente a crise que incomoda a relação.

Não é culpa dos atores. Diane Lane esbanja charme e sensualidade, e Thomas Jane cai muito bem como o cara errado em lugar e hora errados. O problema é que sentimos falta de Rourke, da modulação que ele imprime às cenas, que ajudam, e muito, a driblar certas soluções preguiçosas. A opção de deixar a trama baseada em Elmore Leonard num tom bem próximo de um realismo de asfalto, quase um cinema físico, deixa a coisa toda ainda mais complicada, pois é necessário experiência dos atores com esse tipo de trabalho. Experiência que só Rourke parecia ter em Killshot. A longa sequência final, por exemplo, com o comportamento de câmera sendo o mais manjado possível, seria um porre com um ator menos carismático no lugar dele.

Se o filme de John Madden é dependente demais de um ator, e se o diretor mais uma vez não consegue fazer triunfar suas habilidades artesanais (já parcialmente demonstradas em filmes passados, como o premiado e irregular Shakespeare Apaixonado) dentro de uma trama que pedia justamente esse tipo de habilidade, há ao menos um momento de brilho raro, desnecessário dizer por conta de quem.

Os dois matadores saem para uma viagem. Richie tinha aprendido com Blackbird que não se pode deixar testemunhas, e que o envolvimento com outra pessoa é extremamente prejudicial. Mas Blackbird se envolve com a namorada do mais novo, e não tem coragem de matá-la na despedida. Richie percebe que uma testemunha sobrava, sai do carro, e só vemos o rosto de um ator demasiadamente humano, e o barulho de um tiro. Em jogo o envolvimento inesperado de Blackbird com a moça, e o ciúme de Richie, por sentir que houve algo entre os dois. Num mundo perfeito, esse seria o clipe de um Oscar merecido.

Sérgio Alpendre