OS ESTRANHOS
Bryan Berdino, The Strangers, EUA, 2008

Um casal em uma casa de campo é atacado por estranhos mascarados. A opção aqui é pela divisão com o espectador dos impulsos sádicos vindos dos estranhos. Como as vítimas, não conhecemos suas motivações, suas identidades ou suas armas. Sabemos apenas que eles querem barbarizar. Ficamos com o coração na boca por alguns momentos, já que inicialmente tudo é trabalhado da melhor forma possível a se armar um clima angustiante e apavorante. Embora haja o senão da câmera que insiste em chacoalhar mesmo em momentos calmos, de diálogos entre os protagonistas, como se quisesse gritar: "vejam, estou com a câmera na mão, sou moderno". Trata-se de uma tendência medonha do cinema atual, e tem quem só se interesse por esses sinais enganosos da contemporaneidade. Fazer o quê?

A descrença vem depois de um tempo, já que as vítimas, aquelas com quem dividíamos a tensão, insistem em agir da maneira mais diferente do que qualquer pessoa normal agiria. Diferente demais do que nós agiríamos, é inevitável pensar. Porque numa situação dessas, queremos que os "mocinhos" façam coisas que não teríamos coragem de fazer, ou que eles se agarrem desesperados a uma tentativa de escapar, pois é isso o que queremos: escapar com elas desse cerco irracional.

Separar-se, ficar à frente de janelas, entrar de uma vez em cômodos escuros e se engaiolar num deles não é o que esperamos fazer numa situação improvável dessas, a não ser que o pânico nos tenha tomado toda a capacidade de usar o cérebro. Mas não queremos pensar nessa hipótese, e por isso perdemos qualquer possibilidade de comprar o que vemos na tela. Vejam bem: não se trata de exigir verossimilhança, mas de querer algum ponto de contato com o mundo como o conhecemos, com as atitudes cabíveis que esses personagens tomariam. Uma coerência com o que havia sido nos apresentado até então.

Nesse caso, se perdemos a estética para um compromisso com os irritantes tremores de câmera do cinema atual e os personagens pela fraqueza de suas construções, o que nos sobra é acompanhar o massacre de sádicos. O que possibilita uma outra leitura, que me parece involuntária: esses sádicos estariam agindo pelo bem do cinema, pelo próprio filme e pela longevidade do gênero. Querem eliminar maus personagens, tirar o cinema das amarras das explicações. Teriam conseguido, de uma forma meio canhestra, se o final não impusesse uma verdade pior ainda do que a deles. Em Os Estranhos, nem mesmo os brutos conseguem fazer o serviço completo.


Sérgio Alpendre