A MÚMIA - TUMBA DO IMPERADOR DRAGÃO
Rob Cohen, The Mummy: Tomb of the Dragon Emperor, EUA, 2008

Findos (Senhor dos Anéis, Piratas do Caribe) ou já tornados previsíveis (Harry Potter, as enésimas continuações dos super-heróis) os ciclos de blockbusters feitos aproveitando as guinadas tecnológicas dos efeitos especiais, é o momento de fazer o balanço dos talentos. Nada, na verdade, que já não tenha sido insinuado no corpo-a-corpo das operações críticas. Todos são meio unânimes em concordar que Peter Jackson é um péssimo cineasta e que a trilogia dos Piratas do Caribe é de longe o que tem de mais interessante nessa onda toda (alguns hão de evocar Sam Raimi e seus três Homem-Aranha, mas ainda há embate). E que, de uma forma geral, a qualidade do filme varia de acordo com a potencialidade de intervenção lúdica da parte do espectador. Partilhas feitas e partidos tomados, resta ainda lembrar de um grupo de filmes relativamente pouco lembrado (até mesmo aqui na revista, onde os filmes nem ganharam crítica), a franquia da Múmia de Stephen Sommers. Mais até do que os Piratas de Verbinski, os filmes de Sommers pareciam unicamente interessados nas potencialidades restauradoras de crença nos formatos menores de ficção, e utilizavam a maquinaria de efeitos especiais não para adequar a fantasia à plausibilidade do possível, mas ao encantamento lúdico e gratuito, certamente humorístico, que a invenção sintética poderia criar. A relação com o espectador não se dava através de um saber-fazer demiúrgico que criava um mundo imaginário perfeito, mas na cumplicidade do saber-brincar que apenas usa a narrativa como meio sem acreditar nela como fim (e sem precisar da aterrorizante conformidade ao original na qual os nerds fanáticos se transformam em fiscais anti-criação) e trabalha apenas com um mínimo necessário de verossimilhança.

A Múmia – Tumba do Imperador Dragão já tem um handicap inicial de não ser dirigido por Stephen Sommers, apenas produzido. Colocaram Rob Cohen, que é um artesão mediano. Mas desde o começo uma saída genial para explicar a saída de Rachel Weisz e a entrada de Maria Bello em seu lugar é esboçada, de forma sumária, sem precisar cair muito em explicações – na verdade, fazendo piada com isso. E já de partida ele ganha por um certo charme – um charme, aliás, que falta definitivamente a Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal, por exemplo. Apesar desse charme, que persiste ao longo da projeção, o filme não consegue ir muito além disso, alternando momentos simpáticos com outros sem maior brilho. Com Cohen no controle, o filme fica menos frenético, mais estático. Ele certamente é capaz de retirar momentos graciosos de seus atores, mas no geral não sabe muito bem o que fazer para transformar o espaço em terreno fluido. Se há fluidez e poesia, elas aparecem pontualmente, na ascensão de um exército de mortos-vivos maltrapilhos para combater soldados-múmias bem armados, em momentos insanos de deus ex machina, na canastrice adequada de Brendan Fraser para o papel que interpreta. O profissionalismo suga um pouco a saga doidivanas da imaginação, mas algo persiste – não o suficiente para tornar o espetáculo obrigatório, mas também nada que convide ao desprezo. Aquilo que tornava a série distintiva no panorama – a utilização das possibilidades poéticas dos efeitos especiais – já não aparece mais com tanta desenvoltura; trata-se de um filme limitado, bem limitado até, mas um filme a se defender dentro de um cenário que usa o capital como arrogância para a reles tarefa de restituir o visível quando poderia, segundo os termos de Paul Klee, tornar visível.

Ruy Gardnier