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                         Gostando 
                          ou não gostando dos roteiros escritos por Charlie 
                          Kaufman – e eu certamente não me incluo na primeira 
                          opção – há que reconhecer que eles 
                          apresentam sua própria lógica e coerência. 
                          Foi certamente contagiado pela repercussão de 
                          Brilho Eterno de Uma mente Sem Lembranças 
                          que Michel Gondry resolveu seguir a linha de exploração 
                          de uma comédia romântica emoldurada nos 
                          limites da mente e da imaginação. Só 
                          que dessa vez, não existem as espertezas e reviravoltas 
                          do texto de Kaufman e, ao se arvorar como roteirista, 
                          Gondry parece ter criado a raiz para a maioria dos problemas 
                          vistos em Sonhando Acordado. 
                           
                          O "caos ordenado" sobre o qual Kaufman mantém 
                          absoluto controle, dá lugar a uma confusão 
                          que nunca deixa de sugerir uma distribuição 
                          de elementos absolutamente aleatória. Seja no 
                          roteiro, que parece uma colagem mal ajambrada de situações, 
                          seja na direção, que parece acreditar 
                          que a ausência de uma unidade rítmica e 
                          visual seria uma questão de estilo. Ledo engano, 
                          pois no caso de Gondry e seu Sonhando Acordado, 
                          tudo passa o clima de uma bagunça bastante tola. 
                           
                           
                          Um presente nunca realista, sonhos e imaginação 
                          se fundem na história do sempre deslocado e avoado 
                          personagem vivido por Gael Garcia Bernal que ensaia 
                          um romance platônico com a vizinha Charlotte Gainsbourg. 
                          Porém as atribulações do relacionamento 
                          entre os personagens se refletem completamente no filme. 
                          Gael está completamente miscasted no personagem, 
                          e aquilo que deveria ser um sonhador acaba virando um 
                          patético débil-mental. Além disso, 
                          Gondry abusa de situações que deveriam 
                          ressaltar um aspecto simpático, ou por que não 
                          dizer "fofinho" do filme, mas que no fim das 
                          contas acabam se revelando pouco menos que patéticas. 
                           
                          A inserção constante de elementos advindos 
                          das mais variadas formas de cinema de animação, 
                          às quais Sonhando Acordado parece inequivocamente 
                          querer prestar uma homenagem, só vem ressaltar 
                          ainda mais a falta de unidade. Muitas vezes o filme 
                          transmite a sensação de estarmos assistindo 
                          a uma sessão – bastante ruim, por sinal – do 
                          festival Anima Mundi. E no fim das contas, o trabalho 
                          através do qual Michel Gondry supostamente pretendeu 
                          investigar de forma leve e bem-humorada imagens decalcadas 
                          no universo do sono e dos sonhos, acaba se revelando 
                          uma fórmula eficiente apenas para provocar os 
                          mesmos sono e sonhos na audiência. 
                           
                            
                          Gilberto Silva Jr. 
                          
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