São misteriosos os caminhos
que levam à lista dos filmes
que, a cada edição, aparecem aqui por esta seção. Em momentos especiais como
o
dossiê John McTiernan, presente no último número da Contracampo, as vontades
são
inicialmente aleatórias (um comentário aqui, uma conversa de bar ali), mas terminam
organizadas pela batuta do diretor único, com filmes específicos e
ligações claras entre um e outro. Já as edições correntes, onde tentamos dar
conta das atualizações do mercado de home video ou resgatar algum filme
perdido na poeira das locadoras, é o caos o verdadeiro princípio organizador.
E se agora retomamos esta antiga prática da revista, com um pequeno texto sempre
a apresentar as novas edições do DVD/VHS, é porque havia
uma parte da história, uma parte divertida do processo de diálogo com o caos,
que estava se perdendo.
O número 89, por exemplo. Com todas as demandas de uma redação no momento imediatamente
anterior ao início do Festival do Rio, buscar filmes
entre os novos lançamentos em DVD deveria ser uma tentativa de relaxamento, um
desvio
justificado daqueles títulos que cheiram a problema (os bons ou os ruins), para
que a energia acumulada para a maratona que é a nossa tradicional cobertura não
se dispersasse. E talvez isso até fosse possível, caso não estivéssemos sob o
signo do... sim, do caos. A experiência de estar diante de uma prateleira de
locadora repleta de caixinhas de filmes é certamente muito mais radical que nossa
passada de olhos diária pelo cardápio que os jornais trazem com o circuito de
salas comerciais da cidade. Se uma mão se estica para pegar o mais novo filme
de Soderbergh, aposta até que bastante segura, dado o retrospecto do sujeito
por estas bandas (foi outro dia mesmo que um texto meu sobre O Inventor de
Ilusões apareceu por aqui), que diabos move a outra mão a
cruzar o salão da locadora e ir parar lá na prateleira oposta, onde está o também
inédito novo filme de Brad Silberling? E mais ainda: como prever que, daquele
de quem muito esperávamos, vem a pior das decepções, e que de onde não se imaginava
mais que uma distração aparece um filme como Um Astro em
Minha Vida, tornando Silberling um cineasta a ser definitivamente acompanhado?
Impossível relaxar, impossível não despender energia para mergulhar nestes filmes
que nos pegam desprevenidos e nos despertam sensações inesperadas. Antes de ser
disperso, o gás é todo renovado. Os caminhos são
misteriosos, eu já avisara desde o começo...
É daí, dos impulsos e dos desejos dos redatores nestas visitas regulares às locadoras,
edição
a
edição, que o DVD/VHS foi se construindo. Ler esta seção precisa ser como a
experiência do cara-a-cara com a prateleira: o peito aberto para o acaso, a disposição
para o reencontro de velhos conhecidos, o carinho com aqueles que um dia deixamos
escapar sem perceber, mas que agora fazemos questão de recuperar. E daqui para
frente, esta apresentação servirá como aquela atendente super-simpática que sempre
gosta de dar uma palavrinha contigo sobre os filmes antes que
você embarque neles.
Para além dos títulos já mencionados, a edição se completa com dois textos que
seguem lidando com nosso barato pelos filmes de ação e aventura: de um lado a
experiência francesa contemporânea de Não Conte
a Ninguém, do outro a memória reavivada de um clássico da Sessão da Tarde
dos anos 90, Caçadores de Emoção. E do pacote de filmes de Billy Wilder
que a Versátil vem lançando a partir do acervo da Universal,
destacamos A Primeira Página, um dos últimos e certamente dos maiores
filmes
do
gênio.
Com
Stephen
Frears, ao contrário, retornamos a um de seus primeiros trabalhos,
daqueles que desfaz de vez a impressão de que A Rainha fora um
acidente, e não simplesmente a retomada de percurso de um cineasta que viveu
um interessantíssimo momento inicial
na carreira,
mas
que acabou se perdendo na esteira das banalidades. E Minha
Adorável Lavanderia está muito distante delas.
Boa leitura, e divirtam-se.
Rodrigo de Oliveira
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