NOEL, O POETA DA VILA
Ricardo Van Steen, Brasil, 2007

Seria simples justificar o interesse por Noel, o Poeta da Vila atribuindo ao filme a qualidade de nos relembrar de modo afetivo as canções do compositor, e de fato o filme depende em grande medida das criações de Noel Rosa. Mas há algo além: o que o filme tem de mais interessante, mais do que as canções, é o modo que encontra para trazê-las. Noel, o Poeta da Vila lida com personagens que hoje ícones da canção popular brasileira – e trabalha isso na chave do despojamento, do encanto prazeiroso da simples encenação. O filme parece menos preocupado em dar consistência psicológica aos personagens do que permitir que eles simplesmente se imponham no ambiente.

Nesse sentido, é especialmente feliz aqui a relação entre os ícones do passado e os músicos do presente. Parece simples, e de fato o é, usar jovens sambistas como Pedro Miranda e Eduardo Galloti, ou mesmo um já não tão jovem como Wilson das Neves, para trazer ao filme a ambiência das rodas de samba da época – e o trunfo do filme é apostar antes na simples construção do ambiente do que na falsa verossimilhança da recriação posada. Assim, pode-se dizer que o filme se orienta mais para criar imagens que reúnam afetivamente numa construção narrativa as canções de Noel do que para elaborar um universo dramático – como se vê no final, a criação da cena que origina o clássico “Último desejo” é mais interessante como uma invenção fabular do que como um clímax dramático.

Todo o filme tem esse tom, e é isso que lhe dá charme – cada canção parece ter a sua própria estória, sem demandar qualquer espécie de verossimilhança dramática para isso. Desse modo, Noel, o Poeta da Vila merece um elogio singular: é um longa-metragem que parece curta. Não apenas porque tem uma graça que parece torná-lo leve, mas principalmente por, ao ser um somatório de canções, ambientes e momentos encontrados de forma afetiva, demonstra uma discreta e deliciosa liberdade no modo de narrar. Noel, o Poeta da Vila é um filme que mostra mais interesse em adentrar ambientes e rever a beleza das criações musicais do que em seguir os tons, andamentos e modulações dramáticas do academicismo típico. Deste modo, em seus melhores momentos guarda a beleza instantânea de uma boa roda de cantoria com pandeiro, cavaquinho e violão.

Daniel Caetano