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                    por edição, tema por tema, índice de 
                    artigos por índice de artigos, os acontecimentos cinematográficos 
                    que nos importam são aqueles que acontecem internamente, 
                    ou seja, aqueles que nos conecernem intimamente em nossa relação 
                    com o cinema. Paralelamente, há uma lógica meio 
                    tácita e imperceptível de todo veículo 
                    mais ou menos jornalístico de tentar fazer a cobertura 
                    das atualidades, ou seja, do que está em circuito exibidor 
                    e, preferen cialmente, aqueles filmes que, entrados em cartaz, 
                    fazem os holofotes dos dois circuitos segmentados, os ditos 
                    circuitão e circuitinho. Acontece volta e meia que 
                    esses dois momentos se entrelacem, mas não é 
                    tão comum assim. Esse ano, particularmente, ainda não 
                    surgiu, seja no circuito comercial, seja no circuito de mostras, 
                    algo que coletivamente catalizasse nossas emoções 
                    e deflagrasse perturbações nas nossas formas 
                    usuais de ver e compreender cinema. 
 Mas ano passado houve um, no final do ano, e um muito forte. 
                    Foi Amantes Constantes, de Philippe Garrel, primeiro 
                    longa-metragem do veterano e decisivo diretor francês 
                    a ser lançado no Brasil. Ao longo desse semestre, pelo 
                    fluxo de informações e objetos que caracteriza 
                    nossa era, nos deparamos com a possibilidade de conhecer uma 
                    significativa parte de sua carreira, e o fizemos. Deslumbre 
                    completo em desbravar um universo riquíssimo, pessoal, 
                    de uma intensidade tão forte e original, e infelizmente 
                    tão pouco desbravado fora de seu país de origem 
                    (onde Garrel não ocupa mais do que a voga de um diretor 
                    underground, como um Bressane daqui). Mas, no fundo, isso 
                    guarda em si até um pouco de justiça poética. 
                    Sseus filmes estão longe da lógica do espalhafato, 
                    são peças doces, frágeis, quebradiças 
                    se manuseadas de forma rude, obras intransigentes e definitivamente 
                    voltadas para um campo de afetos aparentemente familiar, mas 
                    profundamente diferente da maior parte do cinema que se faz, 
                    ontem ou hoje.
 
 Há, também, outra paixão, que é 
                    observar as modificações tecnológicas, 
                    históricas e de gosto e perceber como isso influi na 
                    forma como vemos os filmes de hoje, como os filmes constróem 
                    significações, a partir de que pressupostos 
                    trabalham, qual o imaginário, a relação 
                    que se desenvolve com o espectador, em que medida algo muda, 
                    em que medida algo permanece. Nas discussões internas 
                    mas também em algumas críticas publicadas nos 
                    últimos meses, o estatuto da imagem nos filmes de ação 
                    era colocado em evidência, o começo de uma modificação 
                    de percepção que vale a pena acompanhar para 
                    entender. Deixamos então a observação 
                    pontual de lado e decidimos, no momento em que alguns dos 
                    filmes chegam às telas  Homem-Aranha 3, 
                    Piratas do Caribe 3 , dar uma atenção 
                    mais detida às intrigas artísticas e técnicas 
                    de significação do cinema de ação 
                    contemporâneo.
 
 A edição se completa com uma reflexão 
                    acerca de alguns filmes vistos em festivais nacionais e, naturalmente, 
                    com nossa tradicional seção de DVD, que nesse 
                    número traz como principal destaque uma mini-pauta 
                    dedicada a Michelangelo Antonioni. Garrel e cinema de ação, 
                    filmes brasileiros de festival e Antonioni. Para uma tradição 
                    sisuda e ultrapassada, temas impossíveis de estar juntos 
                    numa revista séria (assim como cineasta "de gênero" 
                    como John Carpenter jamais poderiam ser considerados seriamente). 
                    Nós, ao contrário, acreditamos que arte não 
                    é um terreno estanque e bem reconhecível, mas 
                    que, ao contrário, está disseminado por todos 
                    os terrenos de uma área de atividade como o cinema 
                    e, que, por vezes, arrisca passar despercebido graças 
                    a alguns gostos e hábitos adquiridos que, como hábitos, 
                    nunca tem muito de aventuroso ou artístico. Howard 
                    Hawks foi um desses cineastas que sempre filmou a vida como 
                    aventura. Vamos então vivê-la como uma, e fazer 
                    de nossa relação com os filmes algo semelhante.
 
 
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