CINEMA FALADO, PARTE 4
O teatro e o parasitismo, novamente documentários

RM: Retomando um pouco o papo do Leo sobre os filmes que vieram do teatro ou dos filmes que têm relação com o teatro e com a Globo, tanto Trair e Coçar, o Fica Comigo Esta Noite e o Irma Vap estão entre os dez mais vistos. Depois vêm alguns outros nomes, mas todos esse três pouco acrescentaram como cinema, na verdade são filmes que muito mais se apropriaram, se aproveitaram de um certo...

RG: Parasitismo, né?

DC: Mas porra, cara, graças a Deus que existe um pouco de senso de oportunidade num cinema que ficava completamente com medo de fazer coisas para o grande público.

RG: Estamos falando de um cinema que no ano passado deu Zezé di Camargo e Luciano e que já tinha dado Padre Marcelo Rossi. Eu acho que existe sim um cinema oportunista no bom sentido, Inácio já falava isso, agora a questão é que esses filmes tentaram capitalizar em cima de alguma coisa – parasitismo claro – , mas, enfim, não tem o menor motivo de sermos essencialistas, poderia ser um parasitismo interessante. Mas na verdade é um parasitismo que dá com os burros n’água, porque nem artisticamente eles conseguem ir além – quem viu os filmes fala que eles vão aquém mesmo das peças – , e nem comercialmente, porque eles não fazem fenômeno nenhum.

LL: Se você for ver o número de cópias e o número de público dessas peças, normalmente elas são consideradas fracassos. O Irma Vap teve 100 cópias e 247.000 espectadores. O Trair e Coçar é Só Começar teve 150 cópias e 480.000. O Vestido de Noiva teve 5.000 pessoas pra 16 cópias.

RM: A própria Carla Camurati ainda tentou fazer alguma coisa diferente, mas acrescenta muito pouco. É muito pouco, Daniel.

DC: Eu acho que você pode não gostar do resultado, mas não acho que seja preguiçosa a Carla Camurati.

RM: Eu acho que a Carla Camurati, o que ela tenta fazer, é muito mais uma adaptação obrigatória e forçada da peça de teatro como defesa do que ela tá fazendo. O filme não traz nada de novo.

DC: Eu acho que ela faz muito mais uma homenagem à peça do que de fato uma encenação. Isso fica bem claro no filme. Acho inclusive que o filme paga por isso, porque as pessoas queriam ver a peça e se decepcionam ao ver algo que na verdade nem o Latorraca nem o Nanini são protagonistas. São aqueles dois jovens atores. Agora, acho que tanto esse filme quanto o Espírito Baixou em Mim são casos diferentes. O que eu acho que evidentemente é um filme preguiçoso e pesado, que deu errado e que inclusive historicamente é muito interessante discutir, e que eu assumo minha falha em ainda não ter escrito a crítica, é o Vestido de Noiva. O que eu tenho a dizer sobre o Vestido de Noiva é o seguinte. O Nelson Rodrigues fez uma peça que acabou sendo considerada um marco do teatro, talvez o grande marco do teatro brasileiro moderno, e aí parece que pra homenagear esse grande evento, pegou-se então a maior peça dele, só que pegou-se da maneira mais falha possível, por quê? Porque na verdade o que era moderno em 1949 no teatro, colocado no cinema fica completamente diferente. No teatro, o grande truque da peça é que nada era totalmente visualizado, tudo era misterioso. No cinema, como arte da visualidade direta, ele até poderia tentar criar mecanismos pra esconder as coisas, mas ele não cria: ele mostra. Então a Mulher do Véu você olha e ela não é a Mulher do Véu, ela é a Letícia Sabatella! Você sabe quem ela é, você sabe que ela é a irmã. Essa peça do Nelson, naquele momento, naquele contexto, funcionou como uma revolução moderna, mas ela é, em termos de estrutura, de trama, ela é provavelmente a peça do Nelson mais vazia, até por isso ela se prestou tanto àquelas criações cênicas, até por isso ela foi tão moderna. Então você simplesmente recontar a peça no cinema, como se a trama da peça fosse o mais importante, é esvaziar ela do que ela tinha de mais moderno e mais interessante. É justamente por isso que as outras peças do Nelson podem ser transmitidas pro cinema de uma forma mais fiel. Essa não podia! A modernidade virou caretice!

RM: Eu acho esse problema do Vestido de Noiva muito próximo do Irma Vap, que também vai perder essa transposição do teatro pro cinema, uma vez que uma das coisas que mais chamava atenção na peça era aquela interatividade e a rapidez. A rapidez na troca de roupas. E no cinema como você faz, se você vai cortar e juntar um plano a outro?

DC: Mas ela não se acomoda. Ela tenta fazer diferente. O Vestido de Noiva não. Ele é fidelíssimo ao texto, ele parece não entender que o texto é feito pra teatro.

RM: Bem que a Carla Camurati poderia ter mantido o texto que aí o filme teria alguma coisa de bom, né?

DC: É, se ela fosse preguiçosa talvez as pessoas gostassem mais, talvez até o filme saísse melhor. Eu simpatizo com o filme, vejo que o filme não é acomodado, que ela tentou fazer um filme, diferente da transposição de uma peça. A transposição da peça do Vestido de Noiva é acometida da estupidez de achar que, enfim, é só você pegar o texto de uma peça moderna e botar no cinema que vai ficar com a mesma força. Não é. Ele esvazia completamente tudo que a peça tinha de forte. Parece não entender a própria obra do Nelson. Com o passar do tempo as peças do Nelson foram se enchendo de enredo, né? Você conta a história e ela é mirabolante. O Vestido de Noiva é uma não-história, não tem história nenhuma.

LL: Mas essa característica que o Ruy falou bem eu acho que pode ser aplicada a meio que todas as peças, pelo menos em nível de relevância crítica ou até mesmo de público. Todos os filmes baseados em peça nesse ano são de peças que, nos seus mais diversos graus, fizeram grande sucesso – sem querer dar mérito de qualidade a elas – , mas que no cinema não conseguiram repetir o sucesso exatamente porque pra fazer essa transposição de uma peça pro cinema, uma peça comercial, na maior parte dos casos, você tem que pensar como vai ser essa transposição e o que o público vai querer dela. O único caso de sucesso é um que nenhum de nós viu porque não estreou em lugar nenhum fora Minas Gerais, que é o Acredite! Um Espírito Baixou em Mim.

DC: Embora o Irma Vap seja exatamente aquela história...é um fracasso relativo. Porque o filme teve razoável público e vai ter razoável público no dvd, mas é um fracasso relativo diante do que se esperava dele.

LL: Todos os outros são fracassos relativos, fora a Máquina, que realmente é...

DC: A Máquina também é um fracasso relativo, porque perto dos outros filmes ela teve grande público. Só que esperava-se dela que fosse um grande blockbuster, e realmente ficou muito aquém do que se esperou.

(silêncio)

DC: Vamos falar de Estamira? Eu acho que deveríamos falar de Estamira porque, enfim, eu não gosto do filme, mas acho que é o filme que mais confunde, mais difícil de se posicionar. Gostar ou não gostar é muito fácil, mas se posicionar eu acho uma coisa muito complicada. Conversando com o Ruy, eu me lembro que a minha comparação imediata é com o outro filme que eles fizeram juntos, que é o Ônibus 174, e que me pareceu, em um primeiro momento, que o Estamira e o Ônibus 174 têm basicamente falhas muito parecidas, na aproximação com o personagem e na visão de mundo que o filme apresenta. Mas o Ônibus 174 me parece ser um filme que arrisca de fato, ele tá falando de uma questão política, ele topa errar, mas ele ta lá querendo botar um dedo na ferida, enquanto no Estamira eu me sinto um pouco no zoológico. Me senti meio mal com aquele retrato dela, me senti meio mal com as provocações que ele faz a ela, como se quisesse transformar ela num personagem circense.

RG: Na verdade, me parece muito mais com o Ônibus 174 do que me parece com alguns filmes do Werner Herzog. O filme se deixa deslumbrar pela loucura dela como se fosse uma loucura santa, ou uma loucura que seria como a verdade do humano. E ele tenta extrair uma certa graça disso. Mas ao mesmo tempo você vê que em certos momentos de filmagem ele cativa a câmera, a câmera tem uma posição de cativar o fato de que ela comece a gritar contra Deus. Acima de tudo, eu acho um filme com alguns momentos encantadores. Acho que a entrega que o filme dá em alguns momentos me parece encantadora, não como proposta geral. A proposta geral me parece extremamente cínica, mas confesso que eu vi o filme muito tarde, muito depois de todo mundo, e, na verdade, no fim da projeção, eu não saí nem tentando entender o porquê de certo deslumbre nem tentando entender o porquê de certo asco em relação ao filme. Porque no fundo ele é tão inconsistente no approach que ele parece basicamente um filme vão.

DC: É, mas ele deslumbrou muita gente com aquela coisa fotográfica e com aquela personagem que se cria.

RG: Sem dúvida, mas se der pra fazer uma fórmula ele é, sei lá, A Pessoa é para o Que Nasce misturada com Werner Herzog.

DC: Eu me sinto muito mal, assim, porque na verdade existem duas personagens em Estamira e ele não investe nelas. Ao contrário, ele procura criar um mito Estamira. Existem dois personagens muito evidentes. A Estamira com a câmera é uma bruxa, uma divindade, que domina a natureza. A Estamira com a família é uma mulher com trauma, que vem à tona e que ela começa a praguejar. Eu me sinto muito mal com o fato, enfim, não sei se é por questão de documentário que identifica, não sei se é um problema, eu teria de elaborar bem pra mim mesmo...

RG: Não me incomoda o lado mitificador não. Inclusive eu acho que ela com a câmera, ela monologando, é muito melhor do que ela em companhia.

DC: Eu acho mais forte, mas ao mesmo tempo eu acho estranho que o filme não tente, em nenhum momento, criar um ruído nessa mitificação dela. Isso sim que me incomoda realmente no filme. Ele parece se aproveitar de um lado pitoresco de uma mulher que fica praguejando contra Deus por ter tido um problema, enfim, grave. A família dela começa a provocar, o escândalo dela é uma coisa muito forte.

RG: Você vê que tem um molequinho meio gordinho, bochechudo, que fica provocando ela, e fica dando risadinha, porque sabe que ela vai estourar. Fica dando risadinha pra câmera, né?

DC: É, exatamente. É uma relação de cumplicidade que eu acho estranha....Eu prefiro a mitificação criada no Ônibus 174, porque é óbvio que o personagem Sandro é mitificado no Ônibus 174 como a Estamira é mitificada nesse, mas o cara, enfim, tá tentando meter a mão num vespeiro social, e ele sabe que essa situação é uma forma de entrar nesse vespeiro social, é uma fora de entrar naquela cadeia. A maneira como ele vai pro lixão e fotografa, tudo bem, é fotograficamente muito bonito mesmo, mas não sei se esse lixão fotográfico com essa bruxa seja algo que me fascine. Eu me dissocio do filme. Me sinto mal com ele, não me prende.

RG: Engraçado, porque basicamente Estamira foi o documentário falado do ano, e curiosamente, sei lá, da mesma forma que eu prestava muito pouca atenção em documentários como Janela da Alma, ao mesmo tempo eu via valor em alguns filmes de fórmula, com uma qualidade que você sabe que mesmo que o filme seja muito bom ele vai ter um valor restrito, porque ele já é confeccionado numa determinada fórmula específica, mas que mesmo assim encanta. O filme que não me parece especial, mas que me parece extremamente competente no que faz anteriormente foi o filme do Evandro Teixeira, e esse ano eu gosto do Carnaval, Bexiga, Funk e Sombrinhas, que apesar de ser um filme extremamente desigual na estrutura, que num dado momento não sabe como passar de um assunto pro outro, ele tem uma certa vivacidade, um certo desejo de levar a câmera pra rua e filmar o lado da cidade que as pessoas não dão muita atenção, o fenômeno off do carnaval, mas o fenômeno off que não é cult, ou ainda não foi apoderado pelo cult, que é o dos bates-bolas, dos clóvis, que basicamente são figuras de Zona Oeste, têm trabalhos nada glamurosos, e convivem numa área que tem delegados, numa área que tem traficantes, muitos dos próprios clóvis, parece, andam armados, são arruaceiros, então o filme trabalha todo um imaginário que me parece que, se ele não tem um acabamento, digamos, perfeito, ao mesmo tempo ele tem um certo encantamento, uma certa entrega que eu sinto muita falta nesse documentário recente que é cheio de dedos, né? Por uma influência, uma digestão mal-feita do Coutinho, tem toda essa idéia do respeito, de uma relação da câmera parada com aquilo que tá sendo filmado, filmando placidamente o que tá acontecendo. Só que é algo que funciona no registro do Coutinho, no recorte do Coutinho, mas que é digerido de uma maneira que parece que serve como uma fórmula pra todo tipo de cinema. Nesse sentido, o Carnaval, Bexiga, Funk e Sombrinhas me aparece como uma exceção muito interessante, ainda que os méritos, volto a dizer, sejam restritos, mas enfim, dentro do universo que ele trabalha, ele trabalha com muita competência e algum brilho.

DC: É o mesmo tema de um filme do Leon Hirszman, né?

RM: Só pegando um outro ponto agora. Esse negócio de documentário e ficção, que já no começo da discussão a gente tinha definido muito, principalmente nos filmes que figuraram nos menos vistos ou que ficaram poucas semanas em cartaz, a gente tinha definido como "documentário", esses "documentários", e a Contracampo sempre teve uma postura de não ser tão definitiva nessas....

RG: Bom, a questão da Contracampo sempre foi fixar que no documentário o que importa é a mise en scène. A mise en scène cria um mundo no documentário tanto quanto na ficção.

RM: Exatamente. Mas é curioso como existem meio que dois tipos de documentário nessa lista, que é uma coisa que a Tati estava falando, e eu estou só retomando. Filmes muito mais conteudísticos, ou que tem muito mais um tema e vai investir nele sem se preocupar com posicionamento de câmera, ou com escala de plano, ou trabalhando menos a questão da mise en scène, e curiosamente são esses os filmes que normalmente são feitos em digital, e são menos vistos, e têm a distribuição mais restrita, e outros filmes que bem ou mal trabalham outras questões, como Estamira, ou Soy Cuba.

EG: Tem a Mochila do Mascate...

RM: A Mochila do Mascate eu não vi, não sei se também é assim. Mas esses são filmes que bem ou mal tão pensando numa estética que não é a do documentário padrão, ou do documentário que a gente vê mais com cara de televisão, como foi citado aqui algumas vezes. Mas, enfim, era só um adendo a essa discussão...

DC: O Soy Cuba especificamente, assim, acho que ele tem um amor pelos seus personagens e pelo seu objeto que é muito interessante, e tem um interesse pelo que pode ser um fracasso artístico e o que é de fato esse objeto mexendo na vida das pessoas, e eu acho isso muito bonito. O que me incomoda no Soy Cuba só, que acho que é um problema do filme, é que em um determinado momento ele se apaixona tanto pelo objeto que ele se sente obrigado a nos convencer que o Soy Cuba original é um grande filme.

EG: Mas o Brilhante também é assim, né? O Brilhante se apaixona, fica elogiando o filme o tempo todo, como aquele filme mudou aquela cidade, como as pessoas se transformaram por conta da produção daquele filme lá, fica só nisso também, né?

RM: Eu ia até falar isso no começo...como os filmes tiveram estratégias diferentes. Até você mesmo, Estevão, comentou como seria interessante se o filme original do Orlando Senna tivesse sido lançado agora, junto e tal...

DC: O Soy Cuba também não foi relançado, porque o filme é um horror! Esse é o grande problema do documentário. O filme original é chatíssimo! Tem quatro ou cinco planos que você vê e no resto do filme você dorme. É um filme bom pra quem tem insônia...

RM: Mas o que eu ia falar que é curioso é que o filme teve uma campanha ancorada num filme que ninguém viu, o Soy Cuba é um filme muito pouco revisto e tal. Mas enfim, o filme já fazia uma referência de estratégia publicitária mesmo, de marketing, sobre um filme que ninguém viu. Ele mitifica o filme já desde antes de seu impacto como "Soy Cuba, o Mamute Siberiano". Até no título ele coloca o filme original como um peso.

LL: Mas ao chamar de mamute siberiano ele está falando exatamente do fato de ninguém ter visto...

BB: O problema do Soy Cuba é que eu acho que ele acaba utilizando uma narrativa tão didática, por isso mesmo que o Raphael falou, de ninguém conhecer o filme a princípio, que o tempo todo parece que aquilo tudo é muito ingênuo. A maneira que ele arranja as idéias com uma certa ingenuidade, o jeito dele de contar a história como uma auto-descoberta dele mesmo acaba virando uma descoberta de criança, não uma descoberta apaixonante e interessante.

DC: Eu acho bonita a maneira como ele vai reencontrar as pessoas que trabalharam no filme, vai juntar elas, eu acho esses momentos do filme muito fortes. Esse é o momento em que ele vai tentar pensar o lugar social da produção de cinema que eu acho muito legal, do choque entre os mundos e o fato deles terem se aproximado e não terem conseguido criar uma relação. Eu acho legal inclusive o fato de ter aquele diretor que é ultra-sofisticado querendo...

RM: Eu não acho que seja compartilhado com o espectador. Você fica lá vendo aquela coisa, aquele cara deslumbrado...

DC: Eu sinto uma emoção. Eu acho, aliás, que a gente tinha que esquecer o filme Soy Cuba, usá-lo só como desculpa, porque acho que quando ele mergulha nos personagens e nas pessoas o filme é bom. E o filme fica ruim quando ele quer dizer que o Soy Cuba, sem ninguém ter visto, é o filme mais influente da América Latina, que pra mim é um contra-senso.

BB: O filme fica ruim principalmente porque ele levanta um monte de questões no início que ele vai abandonando, e eu até concordo com você, Daniel, quando ele abraça os personagens o filme fica mais interessante, principalmente na meia-hora final. Aliás, na meia-hora final ele questiona se o Soy Cuba realmente foi tão bom ou se ele na verdade não conseguiu se adaptar à Cuba. Só que levanta um bando de questões, como a formação da cinematografia latino-americana, ele fala da influência dos fotógrafos soviéticos na cinematografia cubana, só que ele esquece em dois minutos. No início ele levanta um monte de questões, mas vai se confundindo, se confundindo e se perde.

DC: De todo jeito, é um filme sobre cinema muito mais interessante do que o Sal de Prata, que pra mim foi uma decepção, porque o Gerbase é um cara que tem um carinho pelo cinema de gênero, como o Joffily, mas nesse daí, enfim, não tiro nada.

RG: Bom, mas quem já tinha visto Tolerância...

DC: Mas Tolerância é um filme muito mais humilde do que esse...

EG: Tolerância é muito melhor que Sal de Prata.

DC: Com certeza.

LCOJr: Bom, então eu dei sorte de não ter visto Sal de Prata.

EG: Porque Tolerância tem essa filiação com gênero mais feliz que o Sal de Prata não tem. Sal de Prata é uma coisa mais de umbigo mesmo. Pega a linguagem dos diretores lá que fazem cinema em Porto Alegre e fica só nisso, né?

RG: Eu devo confessar que vi bem no comecinho do ano, e que já me fugiu inteiramente da cabeça. E curiosamente no final do ano a gente viu Anchietanos, que de alguma forma lida com o desejo de audiovisual, com roteiros e tal, e entre os filmes que envolvem a produção de audiovisual feitos no sul do país, certamente eu fico com Anchietanos, feito na verdade ainda na década de 90, e como um produto televisivo, do Jorge Furtado, pro Comédias da Vida Privada. E então, mais algum desses filmes-problema, ou vamos para os quatro?

RM: Eu só ia falar do Mulheres do Brasil que, curiosamente, é o filme que faz meio que um contraponto assim do negocio do documentário e ficção, que é um filme que é uma ficção, mas enfim, que tem lá essa coisa de documentário, de retrato, que até no filme é o que mais me incomoda, que eu acho que funciona absolutamente... mal, como ele tenta dá conta do mundo e se... essa forma de documentário, ehh, como se fosse um resguardo mesmo, de aquilo lá como verdade mesmo. Acho que a diretora do... Malu de Martino vai totalmente contra o que a gente pensa mesmo, né. Sem fazer essa diferenciação do documentário e da ficção, como um respondendo mais ao que seria uma realidade, ela parece seguir o caminho contrario assim, acha que o documentário vai revestir o filme dela de uma verdade.

EG: É verdade. Ela usa os depoimentos para legitimar...

RM: Legitimar! Exatamente!

RG: Como tinha feito o filme... daquele rapaz de São Paulo...

DC: Tá falando de quem, do Flávio Frederico?

RG: Não...

EG: Cama de Gato?

RG: Cama de Gato! Que também tem essa relação com o documentário.

LL: Sem contar que o filme já estabelece um problema por se chamar Mulheres do Brasil!

RM: Lançado no Dia Internacional da Mulher!

DC: Ah, garoto!

LCOJr: É verdade.

LL: Tinha um problema desde o inicio.

EG: É um filme todo em torno de clichê. Por exemplo, uma mulher carioca, o que é a mulher carioca? É uma porta-bandeira (risos).

RG: Afinal de contas, toda mulher carioca é uma porta-bandeira!

RM: Não, e esse é o tipo de filme que me incomoda profundamente por essas questões assim, de como ele se coloca como verdade.

RG: Acho que tem alguns filmes que poderiam evocar alguma coisa, como Dia de Festa do Toni Venturi, pode evocar alguma coisa. Moacir, Arte Bruta pode evocar alguma coisa. Ou até mesmo Zuzu Angel pode evocar, mas francamente eu acho que são, ehh.. alvos fáceis demais.

DC: 1972 a gente pode falar como um fracasso interessante.

LCOJr: Não precisam de um espaço extra.

LL: Mas o Zuzu Angel não é um filme problema desse ano especificamente. É um tipo de filme problema que já vem há...

RM: O problema dele é que ele é o mesmo problema há vários anos.

LL: É. Exatamente!

DC: O 1972, eu sei que só eu simpatizei com o filme, mas eu simpatizei.

RG: Eu simpatizo com o filme.

DC: Acho que o filme... ele tem algumas coisas que falham, mas ele tenta entrar na coisa do cinema de gênero, comédia romântica, de uma maneira que eu simpatizo. (confusão)

RG: Sobre o Zuzu Angel, acho que o plano em que a Patrícia Pillar fica deitada no quarto de hotel e a gente vê um relâmpago de computação gráfica no fundo diz tudo que é o filme, tudo de tosco, de efeitos primários... é o tatibitate da câmera. Se fosse uma poesia, ele ia ficar rimando pão com feijão.

DC: Estaria com faria.

RG: Pois é. Essa coisa totalmente primária. E realmente não justifica... (risos)

RG: Eu concordo com 1972. Elencar os defeitos seria infrutífero porque eles são por demais evidentes. Mas ao mesmo tempo tem uma pequena... Tecnicamente, ele é muito frouxo... Ele não tem uma coisa a mais.... Uma dramaturgia mais trabalhada.

EG: Tem personagens horríveis, como o personagem do Toni Tornado.

RG: Bom, o personagem do Toni Tornado realmente é o...

DC: A falha do filme é o personagem do Toni Tornado.

EG: É, não só, né....

Parte 1: Estrutura, documentários

Parte 2: Globofilmes, cinema e televisão, Brasília 18% e
O Maior Amor do Mundo, A Concepção
.

Parte 3: O Veneno da Madrugada, Árido Movie e
estréias em longa-metragem
.

Parte 5: Os quatro filmes preferidos.

 

 






Irma Vap – O Retorno, de Carla Camurati


Estamira, de Marcos Prado