RM: Retomando um pouco
o papo do Leo sobre os filmes que vieram do teatro ou
dos filmes que têm relação com o
teatro e com a Globo, tanto Trair e Coçar,
o Fica Comigo Esta Noite e o Irma Vap
estão entre os dez mais vistos. Depois vêm
alguns outros nomes, mas todos esse três pouco
acrescentaram como cinema, na verdade são filmes
que muito mais se apropriaram, se aproveitaram de um
certo...
RG: Parasitismo, né?
DC: Mas porra, cara, graças a Deus que
existe um pouco de senso de oportunidade num cinema
que ficava completamente com medo de fazer coisas para
o grande público.
RG: Estamos falando de um cinema que no ano passado
deu Zezé di Camargo e Luciano e que já
tinha dado Padre Marcelo Rossi. Eu acho que existe sim
um cinema oportunista no bom sentido, Inácio
já falava isso, agora a questão é
que esses filmes tentaram capitalizar em cima de alguma
coisa – parasitismo claro , mas, enfim, não
tem o menor motivo de sermos essencialistas, poderia
ser um parasitismo interessante. Mas na verdade é
um parasitismo que dá com os burros n’água,
porque nem artisticamente eles conseguem ir além
quem viu os filmes fala que eles vão aquém
mesmo das peças , e nem comercialmente, porque
eles não fazem fenômeno nenhum.
LL: Se você for ver o número de
cópias e o número de público dessas
peças, normalmente elas são consideradas
fracassos. O Irma Vap teve 100 cópias
e 247.000 espectadores. O Trair e Coçar é
Só Começar teve 150 cópias
e 480.000. O Vestido de Noiva teve 5.000 pessoas
pra 16 cópias.
RM: A própria Carla Camurati ainda tentou
fazer alguma coisa diferente, mas acrescenta muito pouco.
É muito pouco, Daniel.
DC: Eu acho que você pode não gostar
do resultado, mas não acho que seja preguiçosa
a Carla Camurati.
RM: Eu acho que a Carla Camurati, o que ela tenta
fazer, é muito mais uma adaptação
obrigatória e forçada da peça de
teatro como defesa do que ela tá fazendo. O filme
não traz nada de novo.
DC: Eu acho que ela faz muito mais uma homenagem
à peça do que de fato uma encenação.
Isso fica bem claro no filme. Acho inclusive que o filme
paga por isso, porque as pessoas queriam ver a peça
e se decepcionam ao ver algo que na verdade nem o Latorraca
nem o Nanini são protagonistas. São aqueles
dois jovens atores. Agora, acho que tanto esse filme
quanto o Espírito Baixou em Mim são
casos diferentes. O que eu acho que evidentemente é
um filme preguiçoso e pesado, que deu errado
e que inclusive historicamente é muito interessante
discutir, e que eu assumo minha falha em ainda não
ter escrito a crítica, é o Vestido
de Noiva. O que eu tenho a dizer sobre o Vestido
de Noiva é o seguinte. O Nelson Rodrigues
fez uma peça que acabou sendo considerada um
marco do teatro, talvez o grande marco do teatro brasileiro
moderno, e aí parece que pra homenagear esse
grande evento, pegou-se então a maior peça
dele, só que pegou-se da maneira mais falha possível,
por quê? Porque na verdade o que era moderno em
1949 no teatro, colocado no cinema fica completamente
diferente. No teatro, o grande truque da peça
é que nada era totalmente visualizado, tudo era
misterioso. No cinema, como arte da visualidade direta,
ele até poderia tentar criar mecanismos pra esconder
as coisas, mas ele não cria: ele mostra. Então
a Mulher do Véu você olha e ela não
é a Mulher do Véu, ela é a Letícia
Sabatella! Você sabe quem ela é, você
sabe que ela é a irmã. Essa peça
do Nelson, naquele momento, naquele contexto, funcionou
como uma revolução moderna, mas ela é,
em termos de estrutura, de trama, ela é provavelmente
a peça do Nelson mais vazia, até por isso
ela se prestou tanto àquelas criações
cênicas, até por isso ela foi tão
moderna. Então você simplesmente recontar
a peça no cinema, como se a trama da peça
fosse o mais importante, é esvaziar ela do que
ela tinha de mais moderno e mais interessante. É
justamente por isso que as outras peças do Nelson
podem ser transmitidas pro cinema de uma forma mais
fiel. Essa não podia! A modernidade virou caretice!
RM: Eu acho esse problema do Vestido de Noiva
muito próximo do Irma Vap, que também
vai perder essa transposição do teatro
pro cinema, uma vez que uma das coisas que mais chamava
atenção na peça era aquela interatividade
e a rapidez. A rapidez na troca de roupas. E no cinema
como você faz, se você vai cortar e juntar
um plano a outro?
DC: Mas ela não se acomoda. Ela tenta
fazer diferente. O Vestido de Noiva não.
Ele é fidelíssimo ao texto, ele parece
não entender que o texto é feito pra teatro.
RM: Bem que a Carla Camurati poderia ter mantido
o texto que aí o filme teria alguma coisa de
bom, né?
DC: É, se ela fosse preguiçosa
talvez as pessoas gostassem mais, talvez até
o filme saísse melhor. Eu simpatizo com o filme,
vejo que o filme não é acomodado, que
ela tentou fazer um filme, diferente da transposição
de uma peça. A transposição da
peça do Vestido de Noiva é acometida
da estupidez de achar que, enfim, é só
você pegar o texto de uma peça moderna
e botar no cinema que vai ficar com a mesma força.
Não é. Ele esvazia completamente tudo
que a peça tinha de forte. Parece não
entender a própria obra do Nelson. Com o passar
do tempo as peças do Nelson foram se enchendo
de enredo, né? Você conta a história
e ela é mirabolante. O Vestido de Noiva
é uma não-história, não
tem história nenhuma.
LL: Mas essa característica que o Ruy
falou bem eu acho que pode ser aplicada a meio que todas
as peças, pelo menos em nível de relevância
crítica ou até mesmo de público.
Todos os filmes baseados em peça nesse ano são
de peças que, nos seus mais diversos graus, fizeram
grande sucesso – sem querer dar mérito de qualidade
a elas , mas que no cinema não conseguiram repetir
o sucesso exatamente porque pra fazer essa transposição
de uma peça pro cinema, uma peça comercial,
na maior parte dos casos, você tem que pensar
como vai ser essa transposição e o que
o público vai querer dela. O único caso
de sucesso é um que nenhum de nós viu
porque não estreou em lugar nenhum fora Minas
Gerais, que é o Acredite! Um Espírito
Baixou em Mim.
DC: Embora o Irma Vap seja exatamente
aquela história...é um fracasso relativo.
Porque o filme teve razoável público e
vai ter razoável público no dvd, mas é
um fracasso relativo diante do que se esperava dele.
LL: Todos os outros são fracassos relativos,
fora a Máquina, que realmente é...
DC: A Máquina também é
um fracasso relativo, porque perto dos outros filmes
ela teve grande público. Só que esperava-se
dela que fosse um grande blockbuster, e realmente
ficou muito aquém do que se esperou.
(silêncio)
DC: Vamos falar de Estamira? Eu acho que
deveríamos falar de Estamira porque, enfim,
eu não gosto do filme, mas acho que é
o filme que mais confunde, mais difícil de se
posicionar. Gostar ou não gostar é muito
fácil, mas se posicionar eu acho uma coisa muito
complicada. Conversando com o Ruy, eu me lembro que
a minha comparação imediata é com
o outro filme que eles fizeram juntos, que é
o Ônibus 174, e que me pareceu, em um primeiro
momento, que o Estamira e o Ônibus 174
têm basicamente falhas muito parecidas, na aproximação
com o personagem e na visão de mundo que o filme
apresenta. Mas o Ônibus 174 me parece ser
um filme que arrisca de fato, ele tá falando
de uma questão política, ele topa errar,
mas ele ta lá querendo botar um dedo na ferida,
enquanto no Estamira eu me sinto um pouco no
zoológico. Me senti meio mal com aquele retrato
dela, me senti meio mal com as provocações
que ele faz a ela, como se quisesse transformar ela
num personagem circense.
RG: Na verdade, me parece muito mais com o Ônibus
174 do que me parece com alguns filmes do Werner
Herzog. O filme se deixa deslumbrar pela loucura dela
como se fosse uma loucura santa, ou uma loucura que
seria como a verdade do humano. E ele tenta extrair
uma certa graça disso. Mas ao mesmo tempo você
vê que em certos momentos de filmagem ele cativa
a câmera, a câmera tem uma posição
de cativar o fato de que ela comece a gritar contra
Deus. Acima de tudo, eu acho um filme com alguns momentos
encantadores. Acho que a entrega que o filme dá
em alguns momentos me parece encantadora, não
como proposta geral. A proposta geral me parece extremamente
cínica, mas confesso que eu vi o filme muito
tarde, muito depois de todo mundo, e, na verdade, no
fim da projeção, eu não saí
nem tentando entender o porquê de certo deslumbre
nem tentando entender o porquê de certo asco em
relação ao filme. Porque no fundo ele
é tão inconsistente no approach
que ele parece basicamente um filme vão.
DC: É, mas ele deslumbrou muita gente
com aquela coisa fotográfica e com aquela personagem
que se cria.
RG: Sem dúvida, mas se der pra fazer uma
fórmula ele é, sei lá, A Pessoa
é para o Que Nasce misturada com Werner Herzog.
DC: Eu me sinto muito mal, assim, porque na verdade
existem duas personagens em Estamira e ele não
investe nelas. Ao contrário, ele procura criar
um mito Estamira. Existem dois personagens muito evidentes.
A Estamira com a câmera é uma bruxa, uma
divindade, que domina a natureza. A Estamira com a família
é uma mulher com trauma, que vem à tona
e que ela começa a praguejar. Eu me sinto muito
mal com o fato, enfim, não sei se é por
questão de documentário que identifica,
não sei se é um problema, eu teria de
elaborar bem pra mim mesmo...
RG: Não me incomoda o lado mitificador
não. Inclusive eu acho que ela com a câmera,
ela monologando, é muito melhor do que ela em
companhia.
DC: Eu acho mais forte, mas ao mesmo tempo eu
acho estranho que o filme não tente, em nenhum
momento, criar um ruído nessa mitificação
dela. Isso sim que me incomoda realmente no filme. Ele
parece se aproveitar de um lado pitoresco de uma mulher
que fica praguejando contra Deus por ter tido um problema,
enfim, grave. A família dela começa a
provocar, o escândalo dela é uma coisa
muito forte.
RG: Você vê que tem um molequinho
meio gordinho, bochechudo, que fica provocando ela,
e fica dando risadinha, porque sabe que ela vai estourar.
Fica dando risadinha pra câmera, né?
DC: É, exatamente. É uma relação
de cumplicidade que eu acho estranha....Eu prefiro a
mitificação criada no Ônibus
174, porque é óbvio que o personagem
Sandro é mitificado no Ônibus 174 como
a Estamira é mitificada nesse, mas o cara, enfim,
tá tentando meter a mão num vespeiro social,
e ele sabe que essa situação é
uma forma de entrar nesse vespeiro social, é
uma fora de entrar naquela cadeia. A maneira como ele
vai pro lixão e fotografa, tudo bem, é
fotograficamente muito bonito mesmo, mas não
sei se esse lixão fotográfico com essa
bruxa seja algo que me fascine. Eu me dissocio do filme.
Me sinto mal com ele, não me prende.
RG: Engraçado, porque basicamente Estamira
foi o documentário falado do ano, e curiosamente,
sei lá, da mesma forma que eu prestava muito
pouca atenção em documentários
como Janela da Alma, ao mesmo tempo eu via valor
em alguns filmes de fórmula, com uma qualidade
que você sabe que mesmo que o filme seja muito
bom ele vai ter um valor restrito, porque ele já
é confeccionado numa determinada fórmula
específica, mas que mesmo assim encanta. O filme
que não me parece especial, mas que me parece
extremamente competente no que faz anteriormente foi
o filme do Evandro Teixeira, e esse ano eu gosto do
Carnaval, Bexiga, Funk e Sombrinhas, que apesar
de ser um filme extremamente desigual na estrutura,
que num dado momento não sabe como passar de
um assunto pro outro, ele tem uma certa vivacidade,
um certo desejo de levar a câmera pra rua e filmar
o lado da cidade que as pessoas não dão
muita atenção, o fenômeno off
do carnaval, mas o fenômeno off que não
é cult, ou ainda não foi apoderado
pelo cult, que é o dos bates-bolas, dos
clóvis, que basicamente são figuras de
Zona Oeste, têm trabalhos nada glamurosos, e convivem
numa área que tem delegados, numa área
que tem traficantes, muitos dos próprios clóvis,
parece, andam armados, são arruaceiros, então
o filme trabalha todo um imaginário que me parece
que, se ele não tem um acabamento, digamos, perfeito,
ao mesmo tempo ele tem um certo encantamento, uma certa
entrega que eu sinto muita falta nesse documentário
recente que é cheio de dedos, né? Por
uma influência, uma digestão mal-feita
do Coutinho, tem toda essa idéia do respeito,
de uma relação da câmera parada
com aquilo que tá sendo filmado, filmando placidamente
o que tá acontecendo. Só que é
algo que funciona no registro do Coutinho, no recorte
do Coutinho, mas que é digerido de uma maneira
que parece que serve como uma fórmula pra todo
tipo de cinema. Nesse sentido, o Carnaval, Bexiga,
Funk e Sombrinhas me aparece como uma exceção
muito interessante, ainda que os méritos, volto
a dizer, sejam restritos, mas enfim, dentro do universo
que ele trabalha, ele trabalha com muita competência
e algum brilho.
DC: É o mesmo tema de um filme do Leon
Hirszman, né?
RM: Só pegando um outro ponto agora. Esse
negócio de documentário e ficção,
que já no começo da discussão a
gente tinha definido muito, principalmente nos filmes
que figuraram nos menos vistos ou que ficaram poucas
semanas em cartaz, a gente tinha definido como "documentário",
esses "documentários", e a Contracampo sempre
teve uma postura de não ser tão definitiva
nessas....
RG: Bom, a questão da Contracampo sempre
foi fixar que no documentário o que importa é
a mise en scène. A mise en scène
cria um mundo no documentário tanto quanto na
ficção.
RM: Exatamente. Mas é curioso como existem
meio que dois tipos de documentário nessa lista,
que é uma coisa que a Tati estava falando, e
eu estou só retomando. Filmes muito mais conteudísticos,
ou que tem muito mais um tema e vai investir nele sem
se preocupar com posicionamento de câmera, ou
com escala de plano, ou trabalhando menos a questão
da mise en scène, e curiosamente são
esses os filmes que normalmente são feitos em
digital, e são menos vistos, e têm a distribuição
mais restrita, e outros filmes que bem ou mal trabalham
outras questões, como Estamira, ou Soy
Cuba.
EG: Tem a Mochila do Mascate...
RM: A Mochila do Mascate eu não
vi, não sei se também é assim.
Mas esses são filmes que bem ou mal tão
pensando numa estética que não é
a do documentário padrão, ou do documentário
que a gente vê mais com cara de televisão,
como foi citado aqui algumas vezes. Mas, enfim, era
só um adendo a essa discussão...
DC: O Soy Cuba especificamente, assim,
acho que ele tem um amor pelos seus personagens e pelo
seu objeto que é muito interessante, e tem um
interesse pelo que pode ser um fracasso artístico
e o que é de fato esse objeto mexendo na vida
das pessoas, e eu acho isso muito bonito. O que me incomoda
no Soy Cuba só, que acho que é
um problema do filme, é que em um determinado
momento ele se apaixona tanto pelo objeto que ele se
sente obrigado a nos convencer que o Soy Cuba original
é um grande filme.
EG: Mas o Brilhante também é
assim, né? O Brilhante se apaixona, fica
elogiando o filme o tempo todo, como aquele filme mudou
aquela cidade, como as pessoas se transformaram por
conta da produção daquele filme lá,
fica só nisso também, né?
RM: Eu ia até falar isso no começo...como
os filmes tiveram estratégias diferentes. Até
você mesmo, Estevão, comentou como seria
interessante se o filme original do Orlando Senna tivesse
sido lançado agora, junto e tal...
DC: O Soy Cuba também não
foi relançado, porque o filme é um horror!
Esse é o grande problema do documentário.
O filme original é chatíssimo! Tem quatro
ou cinco planos que você vê e no resto do
filme você dorme. É um filme bom pra quem
tem insônia...
RM: Mas o que eu ia falar que é curioso
é que o filme teve uma campanha ancorada num
filme que ninguém viu, o Soy Cuba é
um filme muito pouco revisto e tal. Mas enfim, o filme
já fazia uma referência de estratégia
publicitária mesmo, de marketing, sobre um filme
que ninguém viu. Ele mitifica o filme já
desde antes de seu impacto como "Soy Cuba, o Mamute
Siberiano". Até no título ele coloca
o filme original como um peso.
LL: Mas ao chamar de mamute siberiano ele está
falando exatamente do fato de ninguém ter visto...
BB: O problema do Soy Cuba é que
eu acho que ele acaba utilizando uma narrativa tão
didática, por isso mesmo que o Raphael falou,
de ninguém conhecer o filme a princípio,
que o tempo todo parece que aquilo tudo é muito
ingênuo. A maneira que ele arranja as idéias
com uma certa ingenuidade, o jeito dele de contar a
história como uma auto-descoberta dele mesmo
acaba virando uma descoberta de criança, não
uma descoberta apaixonante e interessante.
DC: Eu acho bonita a maneira como ele vai reencontrar
as pessoas que trabalharam no filme, vai juntar elas,
eu acho esses momentos do filme muito fortes. Esse é
o momento em que ele vai tentar pensar o lugar social
da produção de cinema que eu acho muito
legal, do choque entre os mundos e o fato deles terem
se aproximado e não terem conseguido criar uma
relação. Eu acho legal inclusive o fato
de ter aquele diretor que é ultra-sofisticado
querendo...
RM: Eu não acho que seja compartilhado
com o espectador. Você fica lá vendo aquela
coisa, aquele cara deslumbrado...
DC: Eu sinto uma emoção. Eu acho,
aliás, que a gente tinha que esquecer o filme
Soy Cuba, usá-lo só como desculpa,
porque acho que quando ele mergulha nos personagens
e nas pessoas o filme é bom. E o filme fica ruim
quando ele quer dizer que o Soy Cuba, sem ninguém
ter visto, é o filme mais influente da América
Latina, que pra mim é um contra-senso.
BB: O filme fica ruim principalmente porque ele
levanta um monte de questões no início
que ele vai abandonando, e eu até concordo com
você, Daniel, quando ele abraça os personagens
o filme fica mais interessante, principalmente na meia-hora
final. Aliás, na meia-hora final ele questiona
se o Soy Cuba realmente foi tão bom ou
se ele na verdade não conseguiu se adaptar à
Cuba. Só que levanta um bando de questões,
como a formação da cinematografia latino-americana,
ele fala da influência dos fotógrafos soviéticos
na cinematografia cubana, só que ele esquece
em dois minutos. No início ele levanta um monte
de questões, mas vai se confundindo, se confundindo
e se perde.
DC: De todo jeito, é um filme sobre cinema
muito mais interessante do que o Sal de Prata,
que pra mim foi uma decepção, porque o
Gerbase é um cara que tem um carinho pelo cinema
de gênero, como o Joffily, mas nesse daí,
enfim, não tiro nada.
RG: Bom, mas quem já tinha visto Tolerância...
DC: Mas Tolerância é um filme
muito mais humilde do que esse...
EG: Tolerância é muito melhor
que Sal de Prata.
DC: Com certeza.
LCOJr: Bom, então eu dei sorte de não
ter visto Sal de Prata.
EG: Porque Tolerância tem essa filiação
com gênero mais feliz que o Sal de Prata não
tem. Sal de Prata é uma coisa mais de
umbigo mesmo. Pega a linguagem dos diretores lá
que fazem cinema em Porto Alegre e fica só nisso,
né?
RG: Eu devo confessar que vi bem no comecinho
do ano, e que já me fugiu inteiramente da cabeça.
E curiosamente no final do ano a gente viu Anchietanos,
que de alguma forma lida com o desejo de audiovisual,
com roteiros e tal, e entre os filmes que envolvem a
produção de audiovisual feitos no sul
do país, certamente eu fico com Anchietanos,
feito na verdade ainda na década de 90, e
como um produto televisivo, do Jorge Furtado, pro Comédias
da Vida Privada. E então, mais algum desses
filmes-problema, ou vamos para os quatro?
RM: Eu só ia falar do Mulheres do
Brasil que, curiosamente, é o filme que faz
meio que um contraponto assim do negocio do documentário
e ficção, que é um filme que é
uma ficção, mas enfim, que tem lá
essa coisa de documentário, de retrato, que até
no filme é o que mais me incomoda, que eu acho
que funciona absolutamente... mal, como ele tenta dá
conta do mundo e se... essa forma de documentário,
ehh, como se fosse um resguardo mesmo, de aquilo lá
como verdade mesmo. Acho que a diretora do... Malu de
Martino vai totalmente contra o que a gente pensa mesmo,
né. Sem fazer essa diferenciação
do documentário e da ficção, como
um respondendo mais ao que seria uma realidade, ela
parece seguir o caminho contrario assim, acha que o
documentário vai revestir o filme dela de uma
verdade.
EG: É verdade. Ela usa os depoimentos
para legitimar...
RM: Legitimar! Exatamente!
RG: Como tinha feito o filme... daquele rapaz
de São Paulo...
DC: Tá falando de quem, do Flávio
Frederico?
RG: Não...
EG: Cama de Gato?
RG: Cama de Gato! Que também tem
essa relação com o documentário.
LL: Sem contar que o filme já estabelece
um problema por se chamar Mulheres do Brasil!
RM: Lançado no Dia Internacional da Mulher!
DC: Ah, garoto!
LCOJr: É verdade.
LL: Tinha um problema desde o inicio.
EG: É um filme todo em torno de clichê.
Por exemplo, uma mulher carioca, o que é a mulher
carioca? É uma porta-bandeira (risos).
RG: Afinal de contas, toda mulher carioca é
uma porta-bandeira!
RM: Não, e esse é o tipo de filme
que me incomoda profundamente por essas questões
assim, de como ele se coloca como verdade.
RG: Acho que tem alguns filmes que poderiam evocar
alguma coisa, como Dia de Festa do Toni Venturi,
pode evocar alguma coisa. Moacir, Arte Bruta pode
evocar alguma coisa. Ou até mesmo Zuzu Angel
pode evocar, mas francamente eu acho que são,
ehh.. alvos fáceis demais.
DC: 1972 a gente pode falar como um fracasso
interessante.
LCOJr: Não precisam de um espaço
extra.
LL: Mas o Zuzu Angel não é
um filme problema desse ano especificamente. É
um tipo de filme problema que já vem há...
RM: O problema dele é que ele é
o mesmo problema há vários anos.
LL: É. Exatamente!
DC: O 1972, eu sei que só eu simpatizei
com o filme, mas eu simpatizei.
RG: Eu simpatizo com o filme.
DC: Acho que o filme... ele tem algumas coisas
que falham, mas ele tenta entrar na coisa do cinema
de gênero, comédia romântica, de
uma maneira que eu simpatizo. (confusão)
RG: Sobre o Zuzu Angel, acho que o plano
em que a Patrícia Pillar fica deitada no quarto
de hotel e a gente vê um relâmpago de computação
gráfica no fundo diz tudo que é o filme,
tudo de tosco, de efeitos primários... é
o tatibitate da câmera. Se fosse uma poesia, ele
ia ficar rimando pão com feijão.
DC: Estaria com faria.
RG: Pois é. Essa coisa totalmente primária.
E realmente não justifica... (risos)
RG: Eu concordo com 1972. Elencar os defeitos
seria infrutífero porque eles são por
demais evidentes. Mas ao mesmo tempo tem uma pequena...
Tecnicamente, ele é muito frouxo... Ele não
tem uma coisa a mais.... Uma dramaturgia mais trabalhada.
EG: Tem personagens horríveis, como o
personagem do Toni Tornado.
RG: Bom, o personagem do Toni Tornado realmente
é o...
DC: A falha do filme é o personagem do
Toni Tornado.
EG: É, não só, né....
Parte 1: Estrutura,
documentários
Parte 2: Globofilmes,
cinema e televisão, Brasília 18%
e
O Maior Amor do Mundo, A Concepção.
Parte 3: O Veneno
da Madrugada, Árido Movie e
estréias em longa-metragem.
Parte 5: Os
quatro filmes preferidos.
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