WHERE THE TRUTH LIES
Atom Egoyan, Where the truth lies, Canadá/Inglaterra/França, 2005

Há cineastas cuja repetição de determinados recursos estilísticos e maneirismos ao longo de sua obra acabam por levar a um sucessivo enfraquecimento da mesma, especialmente a partir do ponto em que tais recursos tornam-se previsíveis, passando a funcionar como meros cacoetes. É nesta situação, ao que parece, que encontra-se atualmente Atom Egoyan. A estrutura de seus filmes, que apresentam-se como um conjunto de camadas sucessivas, muitas vezes aparentemente desconectadas, que aos poucos vão convergindo para a definição de um todo funcionou, e impressionou tremendamente bem em Exótica (1994), e atingiu níveis de brilhantismo e perfeição com O Doce Amanhã (1997). A partir de Ararat (2002), Egoyan deixa de surpreender, principalmente pelo fato de cair em um universo de reiteração e auto-citação, tornado mais evidente pelas maiores pretensões daquele projeto, que abandona um microcosmo e um grupo restrito de personagens que povoavam os filmes de 94 e 97, e manifesta um desejo – frustrado, diga-se de passagem – de realizar um retrato da alma e do holocausto do povo armênio, origem étnica do cineasta.

Com esse trabalho mais recente, Where the Truth Lies, Egoyan abandona parcialmente uma proposta de cunho histórico e quase universal, fazendo, à sua maneira, um filme de gênero. Temos basicamente uma história de investigação. Karen (Alison Lohman) é uma jornalista que escreve um livro sobre uma dupla de comediantes que atingira seus tempos de glória nos anos 50, mas que contém uma névoa em seu passado: a morte de uma moça, cujo corpo foi encontrado na banheira de um quarto de hotel usado pelos dois. A dupla, formada por Lanny Morris (Kevin Bacon) e Vince Collins (Colin Firth), encontra-se separada em 1972, momento em que Karen faz seu trabalho, motivada não somente pela investigação em si, mas também pelo fato de reencontrar-se com seus ídolos de infância.

Egoyan desenvolve a trama, baseada em romance de Rupert Graves, aplicando mais uma vez sua estrutura calcada em gradativas revelações. Que aqui, seja pelo já destacado desgaste dos recursos de Egoyan, seja pela previsibilidade dos elementos e personagens de Where the Truth Lies, já não guarda qualquer resquício de algum impacto que possa ter existido nos filmes anteriores do diretor. Motivações e atitudes das personagens são demasiado óbvias, e um pouco de atenção nos leva a antecipar uma trama que se pretende construir através de revelações surpreendentes. Isso poderia até ser pouco importante, caso as principais intenções de Egoyan fossem fazer uma desmitificação do culto e da construção de celebridades, ou centrar-se em algum outro tipo de abordagem crítica ou até mesmo nostálgica. Se tais intenções não deixam de aparecer de forma tangente, o que sobressai em Where the Truth Lies parece ser o desejo de Egoyan em fazer um filme no qual “simplificaria” um pouco seu estilo rebuscado, de forma a contar uma história mais acessível, um filme mais vendável, apelando inclusive para elementos de uma exploração sexual aparentemente gratuita, mas pertinentes no contexto geral.

Se Egoyan consegue evocar de forma satisfatória os diferentes elementos das épocas (1957 e 1972) nas quais se desenvolve a ação de Where the Truth Lies, além de atingir um eficiente trabalho com os atores –Kevin Bacon e Colin Firth estão bastante bem e Alison Lohman bem que se esforça, mas fica devendo alguma coisa numa personagem mais madura – isso é muito pouco para tirar da vala comum da mediocridade a carreira de um cineasta que há menos de uma década vinha sendo incensado como figura expressiva no panorama cinematográfico. Falta a Where the Truth Lies, acima de tudo, autenticidade e verossimilhança. Esse último fator, conforme bem destacou Alfred Hitchcock, seria de pouca importância como elemento essencial a um cinema de gênero, mas parece inevitavelmente necessário a um filme cujo título original propõe a idéia de buscar onde mora a verdade.

Gilberto Silva Jr.