Esta entrevista com Rogério Sganzerla foi realizada por Rodrigo Modenesi
no dia 31/03/2000, no Jardim de Luxemburgo, em Paris,
no dia seguinte a uma apresentação de seu Tudo é Brasil num festival de cinema brasileiro. No final da entrevista,
Sganzerla preferiu falar em francês – o original foi
mantido, seguido de uma tradução.
Quando
vi ontem o Tudo é Brasil, pensei em como a montagem é uma questão central
na sua obra. Eu queria saber então como é que você vê
o trabalho de montagem no cinema.
É bom estar aqui no Jardim de
Luxemburgo, falar sobre montagem, insistindo em uma
questão básica, no próprio Orson Welles, que para mim
talvez é o pai do cinema moderno, porque ele inventou
tudo, não somente a montagem mas a multiplicidade, as
ações paralelas. Eu acho que ele tem a mesma importância
para o cinema, como eu disse ontem na exibição do Tudo
É Brasil, que o Shakespeare tem para o teatro, do
qual nós todos somos admiradores e devedores. Por sua
vez, o Welles diz que a montagem não é um aspecto do
cinema, mas o aspecto, talvez um dos aspectos principais
do processo criativo. E para Godard a montagem é sempre
um batiment du coeur, um movimento interior, sem falar na montagem por atração
no Eisenstein.
E
com relação especificamente a Tudo é Brasil?
Nesse filme eu não tinha os recursos,
a iluminação, os atores de que normalmente disponho
como no próximo, que já está no laboratório para preparar
a cópia final, que chama-se
O Signo do Caos, em francês seria alguma coisa como
Le Chaos revient encore, alguma coisa assim. Nesse filme sim eu disponho
de atores, de personagens, de iluminação, foi rodado
parcialmente em estúdios, e posso então mostrar um talento
próprio, que já foi demostrado há mais de 30 anos, quando
O Bandido da Luz Vermelha fez sucesso não
só de crítica mas de bilheteria no Brasil, em um momento
muito especial, momento difícil e o filme também era
baseado em uma montagem por atração, em uma montagem
dinâmica. E veja bem, o Brasil é um país atrasado, um
país onde as pessoas não têm essa informação, o acesso,
então se faz uma montagem ainda pré-histórica, uma montagem
que não conhece nem o corte em movimento. E eu sempre
fui bastante informado, admirador da obra dos cineastas
japoneses, além de Eisenstein, de Godard e de Orson
Welles – eu gostava muito dos japoneses, conheço bem,
fui crítico e fazia críticas diárias sobre os filmes
japoneses, que às vezes passavam em São Paulo antes
de serem exibidos em Tóquio, devido à colônia japonesa.
Então, pra mim essa santíssima trindade tem diretores
que são desconhecidos na Europa. Agora, um país atrasado
como o Brasil, às vezes até culpado por sua própria
dimensão e que faz 500 anos, quer dizer, isso não é
nada dentro do processo histórico. Não se conhece ainda
esses fundamentos estéticos, que são uma forma de preparação
para vocês que estão querendo partir para estréia em
um longa-metragem. A montagem, além de ser o aspecto
essencial, é também o personagem do meu filme, você pode dizer isso. Você colocou
de uma forma interessante a questão de... como se fosse
uma árvore com várias raízes que se multiplicassem espontaneamente.
Eu vejo mais do que isso: ele tem uma interposição de
textos... enfim, não vamos fazer teoria aqui. O que
eu poderia dizer sobre a montagem é que o filme é uma
imagem e uma imagem diz mais do que mil palavras.
Mas
a sua montagem visa... eu senti que ela visa não deixar
o público passivo...
Sim, jamais. Qualquer filme tem
que partir do princípio de que o espectador não é burro.
O espectador é talvez como uma criança, você
nunca sabe qual filme vai ser bem recebido, vai ser
sucesso comercial, vai ter retorno – eu acredito nessa
utilidade do filme. Eu não acredito em filmes que são
feitos exclusivamente para uma meia dúzia de gatos pingados.
Eu acredito no cinema como uma força dinâmica, como
fator de conhecimento, de reconhecimento e de transformação.
Todos os meus filmes têm essa qualidade, cada cena,
cada seqüência é colocada de uma forma dinâmica. Nós
não podemos agir como se não existisse cinema sonoro,
não podemos fazer cinema mudo em um momento em que existem
tantos recursos, como essas câmeras numéricas japonesas.
Quando não havia nada disso, se fazia tudo com pouco.
Hoje que tem tantas possibilidades e a miniaturização
traz essas conquistas, pouco ou quase nada se faz em
termos de criatividade.
Parece
que existe uma relação inversa, mais técnica e menos
inventividade.
É... devido à falta de informação.
Há, inclusive, uma desinformação. E voltando ao Godard,
ele falava: a montagem é “mon bon souci”, é um dos artigos dele, que é quase um manifesto, publicado
no Cahiers du Cinéma nos anos 50, do qual nós somos em um certo sentido devedores,
porque aprendemos a valorizar também o verdadeiro cinema
americano, não esse lixo que está sendo feito, que está
sendo jogado diariamente como se fosse uma grande latrina
do universo. E, nesse sentido, a crítica francesa descobriu
o jazz, descobriu o
cinema americano, produziu um texto muito bom,
devido à presença do André Bazin, que, para mim, é o
maior crítico do mundo – e que era muito amigo do Orson
Welles e vice-versa. As primeiras entrevistas do Orson
Welles na França foram decisivas quando o filme estreou
em 1946 – devido à guerra, as cópias só chegaram posteriormente
no pós-guerra. E o Bazin posteriormente fez um livro
com o Jean Cocteau sobre essa questão básica da linguagem.
E em seguida teve as entrevistas com os espanhóis nos
anos 60, como o Buñuel, eles reuniram grandes entrevistas.
E, mais à frente teve o Bill Krohn que é um crítico
do Cahiers, embora more em Los Angeles, e que é meu
amigo em particular, veio várias vezes ao Brasil, eu
também estive em Los Angeles e ele me concedeu entrevista
para o filme Tudo
é Brasil. E agora eu soube - fiquei satisfeito –
que ele ganhou o prêmio de melhor livro – esse livro
do Hitchcock ‘ao trabalho’, que é uma belíssima publicação.
[Há uma pausa devido à chuva]
Bem...
A chuva deu uma leve interrupção
aqui. Eu estou achando...Paris é a cidade luz... eu
que realizei O
Bandido da Luz Vermelha, estou me sentindo em casa.
Eu estou, então, à disposição dos jovens, dos estudantes.
Você estuda onde?
Na
Universidade de Paris III.
Na nova Sorbonne.
Exatamente.
Pois é, acho que até o Montaigne
andou por lá, em áureos tempos. Eu gosto muito do Michel
de Montaigne. Li toda a obra dele, os ensaios.
A
parte de ética?
Exatamente. E tem uma belíssima
tradução em português do Sérgio Rouanet, que eu conheci
e que, por um dos artigos da crítica especializada brasileira,
eu soube que era também o livro de cabeceira do Orson
Welles, os Ensaios.
Os
Ensaios de Montaigne... Eu queria comentar que seu documentário
coloca algumas questões. Ele não responde, como você
falou ontem no debate, não responde questões e que um
filme não deveria responder, deveria colocar questões.
Quando o Orson fez o Macbeth em 1946 - quer dizer, quando eu nasci -, ele na estréia falou,
quando perguntaram “O que você quer com esse filme?”, ele disse: “Não, os grandes cineastas primam pela enunciação
dos problemas, não pela sua resolução”. A função
básica, essencial, é você trazer perguntas e formular
questões, indagar. Eu acho que o filme deve ser vivo.
Acredito no cinema como uma arte que... uma coisa móvel,
flutuante. Acho que é essa a generosidade do artista:
trazer as perguntas, questões e procurar respondê-las
com outras novas perguntas. Essas perguntas têm que
ser sempre bem formuladas no sentido da inteligência
da pergunta. Porque a pergunta cretina é uma coisa que
pertence ao reino da ditadura do audiovisual, que nós
lá atravessamos de uma forma muito conspícua devido
à intransigência da concorrência das emissoras, que
têm um grande potencial econômico, um grande equipamento
técnico e, então, ali, sobretudo no Rio de Janeiro,
onde eu moro, elas são um concorrente forte demais,
que praticamente anula o cinema, que sempre primou por
essa enunciação e é talvez o que o cinema brasileiro
tem de melhor - que é esse lado, o da produção independente,
do qual eu sempre fiz parte. Eu comecei como crítico.
Fiz um filme chamado Documentário
em 1966 que me deu um prêmio de uma viagem à Europa.
Estive no Festival de Cannes em 1967. Vim a Paris, atravessei
toda a Europa Oriental e foi aí que eu escrevi o roteiro
do meu primeiro filme, escrevi aqui na Europa.
O
Bandido da luz vermelha
Exatamente. Um filme que ainda
permanece ainda quase inédito. Bom, existem cópias no
MOMA, em Nova York. É considerado um pequeno tesouro
do nosso audiovisual, mas aqui na Europa poucas ou quase
nenhuma pessoa toma conhecimento disso. É porque não
existe uma política de valorização de cópias com subtitulagens,
legendagens, como a que a gente viu aí nessa recente
experiência.
E
também por não explicar mas colocar questões... Por
exemplo, eu acho que seu filme questiona o que seja
a realidade.
É, é um filme de cinema, como
eu chamaria desde o primeiro. O Bandido da Luz Vermelha é um filme de cinema de Rogério Sganzerla.
E o Tudo é Brasil
não poderia escapar disso porque, como eu disse, não
tem atores, é um filme sem atores, sem elenco, praticamente
sem história e o trabalho é com papel, com elementos,
com afrescos, com desenhos e poemas escritos em guardanapos
e com muita coisa inédita. Eu acho que é um filme bem
apropriado para a televisão e não é um filme televisivo;
eu acho que ali você sente o cinema; o cinema documentário
é um gênero maravilhosamente cinematográfico.
E
como você mistura as citações, as imagens, como é que
isso vem? Por exemplo, você tem uma cena de um filme
japonês...
Filme japonês? Qual?
Um
cara (japonês) voando em um avião.
Sim, exatamente. Nós estávamos
falando da eclosão de três fenômenos: a descoberta da
Carmem Miranda pelo cinema americano, porque ela foi
exportada em seguida, quando ela estourou nas paradas
de sucesso no Cassino da Urca com a música do grande
compositor brasileiro que é o Dorival Caymmi, foi aquela
música “O que é que a baiana tem?”, que é a abertura
do filme, é quase um videoclip e é um material
inédito, tinha sido usado mudo alguns fragmentos, mas
ali colocamos a seqüência - é o que restou de um filme
rodado em 1938 chamado Banana da Terra. Mas na mesma semana, por
uma coincidência do destino, ocorreu também essa eclosão
(como foi o grande sucesso no Brasil) nos Estados Unidos,
a Guerra dos Mundos,
que constituiu
um divisor de águas, e que só se tornou o que ela foi
porque ela produziu pânico coletivo. Ela foi um fator
que nunca mais se repetiu no rádio, trazendo a figura
de um jovem, o locutor espiroqueta,
que é um dos maiores mitos da história da comunicação
humana; só se tornou possível devido ao terror que a
Europa sentia com as transformações, com a ameaça do
totalitarismo que naquele exato momento era o encontro
dos ditadores, alemão e italiano, que é retratado naquele
filme do Charles Chaplin, O
Grande Ditador. Mas ali a gente colocou material
autêntico, existe muita coisa espalhada no Brasil, não
só sobre a presença do Orson Welles, mas também os filmes
brasileiros da Carmem Miranda e também esse material
de um momento delicado em que Paris é invadida. Há um
Primeiro de Maio hitlerista em Paris, há uma submissão
total dessa cidade que deixava todo mundo apavorado.
Isso é que produziu a Guerra
dos Mundos e a Guerra dos Mundos foi um fator que tornou
possível o contrato legendário, do qual eu escrevi muito
em 1965, quando houve essa reprise na imprensa brasileira,
e se tornou possível devido ao sucesso da emissão. E
esse contrato previa três filmes: o Cidadão Kane, The Magnificent Ambersons e It’s all true. Quer dizer,
o filme brasileiro é uma conseqüência do programa de
rádio. Então o filme não deixa de ser uma combinação
de elementos. Todo filme é feito de pedaços de realidade,
nesse sentido, eu não poderia fugir à regra fundamental,
que é a do jogo cinematográfico, que é de você... a
interpenetração, o subentendimento e a intersecção de
elementos os mais díspares como se fossem... inclusive
o material japonês, exatamente é bem oportuno porque
a Guerra dos Mundos
só se tornou o que é devido ao medo de uma invasão
na Califórnia pelas forças japonesas, que ocorreram
três anos depois. E houve um blecaute em Los Angeles
onde estavam concentradas as grandes fábricas de aviões.
Era
uma época de terror.
E houve inclusive a tentativa
de um desembarque sobretudo pela aviação japonesa, os
aviões japoneses. E o filme não deixa de ser atento
a esse fato.
Parece
que tinha alguma coisa de muito ruim naquela época da
história que você retratou no filme, o ano de 1942.
É, 1942 foi um ano crítico, crucial
para a civilização, um ano que gerou muitos mal-entendidos
e desse mal-entendido a grande vítima foi um pescador
que era um líder social que se coloca, até hoje, sob
suspeita o seu desaparecimento frente à equipe do Welles.
E o resultado: a grande vítima foi o próprio Welles
e, por conseqüência, todo o cinema moderno. Então, vários
capítulos, não são páginas somente da história do cinema,
foram interrompidos devido àquele afundamento, naufrágio,
quase uma tragédia para a história da cultura americana
e brasileira também, porque o Welles estudou, se interessou,
procurou e praticou o melhor cinema de exportação. Ele
fez o cinema que depois se iria fazer nos anos 60. Essa
tese foi colocada por mim muito antes de ser descoberto
o material existente, por Bill Krohn no filme que fez
em seguida, para o qual me convidou como assistente
de direção. Aí eu pude ver o trabalho que dá pra fazer
um filme, porque quando eu dirijo, eu nunca tinha sido
até então assistente... Você sempre pede mais da equipe,
você sempre quer avançar com o filme. Eu acho a preguiça
a origem de todos os males, sobretudo no Brasil. Então,
como eu nunca fui preguiçoso, sempre trabalhava mais
e não sentia o cansaço, quando a gente é assistente
a gente vê.
E
uma outra coisa em que seu filme toca é a questão do
imaginário coletivo.
É, sobretudo o humor da época.
Cada época tem o seu próprio humor. Ali talvez tenha
sido o mau-humor. E a viagem do Welles foi uma bad trip, não só para ele como para o cinema de uma forma geral. E eu
sempre senti isso antes de começar a pesquisa, isso
foi em 1976, 1977, que só um brasileiro poderia tentar
romper aqueles obstáculos, aquela armadilha que foi
preparada com dólares para um cineasta que só tinha
26 anos no momento crítico da sua carreira. Aquela grande
armadilha era uma coisa tão pesada que só um brasileiro...
porque o Brasil é um país mágico. Eu tive uma experiência
assim nos anos 70, eu fiz um filme na África, esse filme
nunca deu certo, embora totalmente rodado e concluído,
como foi o filme do Welles no Brasil. Mas ele não chegava
a dar certo porque a África é mágica e não houve
ninguém lá interessado, então eu achei que tinha a obrigação
de fazer isso somente pelo desejo de querer aprender
ou reaprender o cinema. Veja bem, eu já tinha feito
sucesso com meus próprios filmes, fiz um sacrifício
para chegar a levantar esse véu da história.
E
a relação dos artistas com os marginais? Porque o Orson
Welles é também marginal, ele é um artista bem sucedido,
mas ele dizia que tinha que a achar brechas no sistema
para poder produzir.
Você teria que ver um filme que
eu fiz em 1984, projetado em Berlim, chamado Nem Tudo é Verdade, homenagem ao artigo
It’s Not Quite All True, do Richard Wilson, com quem
eu vinha me correspondendo desde 1975, 1976. Nesse filme
eu tenho um diálogo com um ator maravilhoso chamado
Arrigo Barnabé, que parece, devido à semelhança física,
que parece baixar o espírito do Welles; ele diz que
é era um outsider em qualquer lugar
do mundo. Eu não acredito na marginalidade, eu
acredito na vanguarda das artes. E a gente tem sempre
que avançar em terrenos inexplorados, como o Welles.
Não vamos buscar sempre a mesmice, a repetição... Enfim,
o cinema, para mim, é a arte das evidências e a evidência
é que o Orson é um gênio total, que pode ser visto como
o herói da revolução da linguagem devido ao conhecimento
que ele tinha da história do cinema. Era um grande admirador
de Meliès, que, para mim, é o maior cineasta do mundo
de todos os tempos. Quando não havia nada, em que as
câmeras precisavam... os filmes eram enrolados em sacos
pretos, para trazer ao estúdio precisava de três operadores,
e tinha um operador português... Ele fazia tudo, inventou
praticamente todos os recursos na mesma medida em que
o Welles também trouxe essa contribuição para o cinema
sonoro. E hoje que tem tudo, se faz pouco ou quase nada.
Está aí o Godard, continuando a trabalhar, ainda dependendo
dessa respiração, dessa ternura. Eu acho fundamental
o respeito, a consideração e mais do que isso: a amizade
– acho que é o motor, a matéria prima do cinema. Eu
fiz muitos amigos em todos os lugares do mundo não só
em Los Angeles, como na Alemanha, como... no Brasil,
né?... E até o governo brasileiro, que tinha sido mais
ou menos o mentor da vinda... Que tentou, por causa
dos mal-entendidos e do fascismo naquele momento, e
obstaculizou essa produção, ele veio, posteriormente,
a dar recursos, condições materiais, equipamentos, como
o Centro Técnico do Audiovisual, no Rio de Janeiro,
para tornar possível esse sonho.
Mas
não existe uma fascinação em torno do artista marginal?...
Acho que em todo o mundo temos
uma desvalorização do talento e não se valoriza os projetos
em si. Há sempre um mecenato voltado para grupos. A
própria fragmentação e os fenômenos decorrentes dessa
estética pedem maiores recursos, que são sempre negados,
e que seriam, às vezes, não tão vultuosos. E o problema
do Brasil é essa coisa do desperdício: se tiver que
escolher entre uma obra-prima do Orson Welles e um lixo
qualquer de quinta categoria, as elites vão, por serem
culpáveis devido à culpabilidade colonial, elas vão
exatamente querer esconder de baixo do tapete a realidade
e valorizar o ruim, o pior, e impor isso de uma forma
arbitrária. Então, eu acho que o Orson foi o primeiro
artista que tentou mostrar a realidade brasileira e
tirá-la debaixo do tapete. E isso pode ter criado problemas
com o poder vigente do Estado Novo e, nesse sentido,
o filme é uma denúncia – tem que ser visto. Eu acho
que a França pode também valorizar um artista que foi
quintessencial do cinema, que mereceu até a legião de
honra francesa. [aqui Sganzerla começa a falar em francês
– à frente, segue-se uma tradução] Welles a reçu la legion d’honneur, ce n’est pas un citoyen comme quelq’un, il avait une importance magistrale. Moi, je
ne veux pas immiter à Welles, ça serait ridicule. Ce
qu’on a fait c’est un effort pour retrouver ce petit
tresór, et là nous avons présenté à Munique, où ils
ont fait une rétrospective du “Welles Inconnu”. Dans
tous les pays, dans l’Anglaterre... Il avait un film
français tellemente merveilleux, il revèle le travail
de Welles à le télévision, aux années 50, à Paris. C’était
presque la estétique de la Nouvelle Vague bien avant
la Nouvelle Vague, comme il a découvert. Il a fait du
Cinema Novo aux années 40, c’est-à-dire, vintg ans d’avance,
et aussi en France, à l’Anglaterre, à l’Espagne, aux
États-Unis. Seulement à l’Italie,
ils ont fait un film contre Welles, et ça c’est
ridicule. L’Italie c’est un pays gai, à mon avis, c’est
une chose tragicomique qu’ils ont fait: en voulant démontrer
son amour pour Welles, ils ont fait... J’espère qu’ils
vont peut faire un autre filme sur ce sujet, d’une façon
plus juste, la justice é uma coisa essencial para
se poder estudar a questão da valorização da forma no
cinema moderno. O Tudo É Brasil, pra concluir, é um filme diferente,
c’est un film de cinéma différent, sinon unique, et le film raconte le
moment le plus spéctaculaire de cette transformation
qui durait six mois. Les épreuves faites pour le père
du cinéma moderne sont réstituées d’une manière vivante,
en particulier de cette perilleuse voyage au pays des
merveilles inattendues. Or ce serait un pays de culpables,
je ne sais pas... On dit que le Brésil c’est un pays
de voleurs, les élites ne sont pas responsables, c’est
une question de responsabilité historique. Et nous avos
toujours de choses à apprendre avec l’amour de Welles
pour le peuple brésilien, qu’il n’a jamais oublié, avec
son éffort pour colocar o Brasil no mapa do cinema
mundial.
[tradução: Welles recebeu a Legião de Honra,
não foi um cidadão qualquer, ele tinha uma importância
magistral. Eu não pretendo imitar Welles – isso seria
ridículo. O que foi feito foi um esforço para redescobrir
esse pequeno tesouro, e já o apresentamos em Munique,
onde fizeram uma retrospectiva “Welles Desconhecido”.
Em todos os países, na Inglaterra... Havia um filme
francês realmente maravilhoso, que revelou o trabalho
de Welles na televisão, nos anos 50, em Paris. Já era
quase a estética da
Nouvelle Vague muito antes da Nouvelle Vague,
como ele a descobriu. Ele fez Cinema Novo nos anos 40,
ou seja, vinte anos antes, e fez o mesmo na França,
na Inglaterra, na Espanha, nos EUA. Somente na Itália
fizeram um filme contra Welles, uma coisa ridícula.
A Itália me parece ser um país divertido, é uma coisa
tragicômica o que eles fizeram: querendo demonstrar
seu amor por Welles, eles fizeram... Eu espero que eles
venham a fazer um outro filme sobre o assunto, de uma
maneira mais justa – a justiça é uma coisa essencial
para se poder estudar a questão da valorização da forma
no cinema moderno. O Tudo É Brasil, pra concluir, é
um filme diferente, é um filme de cinema diferente, senão único,
e o filme conta o momento mais espetacular dessa transformação
que durou seis meses. Os registros feitos pelo pai do
cinema moderno são restituídos de uma maneira vigorosa,
em particular daquela perigosa viagem ao país das maravilhas
inesperadas. Ou seria um país de culpados, não sei...
Diz-se que o Brasil é um país de ladrões, as elites
não são responsáveis, trata-se de uma questão de responsabilidade
histórica. E nós temos sempre coisas a aprender com
o amor de Welles pelo povo brasileiro, que ele nunca
esqueceu, com seu esforço para colocar o Brasil no mapa
do cinema mundial ]
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