JAGODA NO SUPERMERCADO
Dusan Milic, Jagoda u supermerkatu, Sérvia e Montenegro, 2003

Um homem armado invade um supermercado, recém inaugurado, revoltado por terem mal-tratado sua querida avó.

Claramente interessado em decalcar dispositivos dramáticos do cinema de seu produtor (Emir Kusturica), Jagoda e o Supermercado aposta nos absurdos da realidade do pós-guerra na Sérvia como ponto de partida de uma comédia de erros que alterna de um lado um humor absurdo e mordaz e, de outro, soluções narrativas sem qualquer inspiração. Da premissa da inauguração de um “supermercado yugo-americano” em plena Sarayevo, o filme discorre um arsenal de comentários críticos/cômicos ao modo de funcionamento do “maravilhoso” supermercado e as reações das pessoas não acostumadas a lidar com aquele tipo de espaço. Piadas, bem-sucedidas, sobre os produtos e costumes norte-americanos são dispostos de forma a apresentar um painel caricatural da relação entre uma Sérvia pós-Milosevic e seus novos “amigos” norte-americanos, mas não vão além disso.

Com encenações e interpretações farsescas, uma trilha sonora inspirada (produzida pelo mesmo Kusturica) e o uso de alguns personagens clichês de fácil identificação, Dusan Milic tem um bom material em mãos, mas que se esgota logo na primeira metade da projeção. Depois de uma boa apresentação de personagens, de território e de boas piadas (como a do coro popular que seguirá toda a trama como a platéia de um espetáculo teatral) o filme alcança seu eixo narrativo quando a jovem caixa de supermercado se mostra enamorada pelo suposto “terrorista”. A partir daí, com todo o circo armado, o roteiro (do próprio Milic) parece não saber muito bem para onde ir...Ou pior: até sabe, mas ainda tem uns 40 minutos para cobrir até lá com a mera repetição das mesmas (e agora não mais tão boas) piadas.

O filme se torna monótono, dividido em esquetes, fazendo com o que antes seduzia pela inteligência, se transforme num festival muito mais de “sacadas” do que de idéias. Um certo humor rancoroso em relação aos Estados Unidos pode agradar aos interessados em se divertir satanizando os “todo-poderosos”, mas soam um tanto juvenis e, por demais, auto-complacentes.

Há diálogos interessantes entre as autoridades sérvias (como as disputas entre um policial “conservador” e um “democrata”) e eficientes brincadeiras com clichês de linguagem (apelidos, codinomes de guerra, patentes militares, sistemas de governo), mas nada que consiga tirar o filme de uma certa previsibilidade que, pior de tudo, insiste em se travestir como “inusitada”.

Um belo curta-metragem, talvez, flutue por ali em alguns pontos, mas nada que se sustente com brilho por 90 minutos.

Felipe Bragança