Responda às questões abaixo. Você
está livre para fazer consultas a quaisquer fontes
de informação, inclusive a Internet:
Qual o valor atualizado
da contribuição conhecida como "metro
linear", criada pela Lei nº6281/75 e regulamentada
por diversas resoluções do CONCINE? Houve
queda ou crescimento na quantidade de cópias
de filmes lançados no período em que vigorou
a referida lei?
Quantos espectadores
atingiu o filme "caipira", A Estrada da
Vida, dirigido por Nelson Pereira dos Santos, protagonizado
por Zé Rico e Milionário? Quais foram
os resultados e praças mais expressivos?
Em valores atualizados, quais eram as faixas de premiação
do "adicional de rendas" de filmes brasileiros?
Quanto representava, percentualmente, na produção
de um filme das "bocas" de São Paulo
e Rio de Janeiro?
Qual a freqüência
dos filmes produzidos por Teixeirinha e quais foram
suas praças mais representativas? Destacar a
performance do filme A filha de Iemanjá,
o último produzido pelo cantor.
Como foi a aceitação
de crítica e pelo público, dos filmes
Boi de Prata e Amor e Traição
(ex-A pele do bicho) nas cidades
do Rio Grande do Norte?
Você conseguiu responder
alguma das perguntas acima arroladas? Localizou alguma
fonte de informações sobre os temas propostos?
Provavelmente, não
teve sucesso em localizar respostas. Poderá ter
encontrado alguém, um ex-funcionário do
INC, do CONCINE ou da EMBRAFILME, que lhe apresentou
pareceres duvidosos e cheios de lacunas. Pois, saiba
que todas essas questões deveriam estar disponíveis
para um consulente, como estão as "séries
históricas" nos arquivos de institutos especializados
do IBGE, do CPDOC ou do Arquivo Nacional. Durante anos
coletou-se, processou-se, compilou-se e se arquivou
dados com um grau de detalhamento que permitiria, por
exemplo, saber quantos espectadores o filme A Estrada
da Vida obteve em cada sessão de um cinema
em Caldas Novas (Goiás) ou em Toledo (Paraná).
Afinal, controlar a indústria era uma das tarefas
estipuladas pelo já referido Decreto-Lei que
extinguiu o INC e ampliou as atribuições
da EMBRAFILME. Para atingir tal objetivo estruturou-se
um sofisticado banco de dados, já informatizado,
nos meados da década de 70.
Se não bastasse
este fabuloso acervo de informações da
indústria cinematográfica, existiam dentro
da estatal, outros centros produtores de informações
referentes ao controle das contratações
e contas-correntes dos filmes co-produzidos, das despesas
de comercialização, da circulação
de cópias, do controle de materiais publicitários,
da produção cultural, etc. Ou seja, arquivos
destinados ao cumprimento das funções
precípuas da EMBRAFILME, acrescidos daqueles
obtidos no atendimento das funções conveniadas
com o CONCINE (além, é claro, dos arquivos
e documentos herdados do INC – Instituto Nacional do
Cinema). Enfim, durante mais de vinte anos, foram depositados
nestes arquivos a história intrínseca
do cinema nacional e, também, da atividade de
cinema no Brasil.
Onde se encontram esses
documentos? Pelo que se tem notícia, estão
jogados em algum canto do Rio de Janeiro, corroídos
por traças, baratas e ratos. Ao violento ato
de destruição da cultura nacional perpetrado
por Collor e seus asseclas, que extinguiram os dois
órgãos de apoio e regulamentação
do cinema, somou-se um profundo desprezo que se tem
pelas experiências passadas, encaradas como obsoletas
e descartáveis. Já se tinha essa "cultura
destrutiva" nos tempos da EMBRAFILME/CONCINE, onde
o acervo do INC/INCE eram tratados como uma herança
inútil.
Pelo que se vê,
tal mentalidade continua igual. Os estudos que arrazoaram
o novo projeto de lei do áudio-visual e que cria
a ANCINAV citaram todo o processo de desenvolvimento
regulamentar da França, desde os anos 30 até
nossos dias, mas, foi incapaz de citar um único
ato ou fato relacionado à ampla experiência
nacional que já privilegiara alguns dos tópicos
apresentados. Foram ignoradas medidas bem sucedidas
que em um dia permitiram que se produzisse, anualmente,
mais de cem filmes por ano; que se tivesse quase um
terço de participação no mercado
nacional, que por sua vez, era composto por quase quatro
mil salas de exibição. Ignorou-se que
o INCE tivesse um catálogo com centenas de filmes
científicos e culturais que circulavam em milhares
de escolas, possuidoras de projetores 16 mm. Desprezou-se
a experiência de distribuidores regionais que
foram capazes de transformar Mazzaroppi ou Teixeirinha
em campeões de bilheteria.
O abandono da documentação
produzida no INCE/INC/CONCINE/EMBRAFILME é um
crime de lesa-pátria. Tão importante quanto
conservar e recuperar as obras audiovisuais é
organizar, estudar e colocar os documentos referentes
as obras e a atividade cinematográfica passada
à disposição do público.
Se não fosse assim, os viadutos, as avenidas,
os postes de iluminação, as estradas,
os prédios públicos e tantos outros ativos
físicos bastariam como as únicas fontes
de interpretação histórica dos
governos e das nações, destinando aos
fornos crematórios a documentação,
enfim, o que se possa chamar de "papéis".
A guarda e a colocação
dos documentos dos antigos órgãos de cinema
para a consulta pública são deveres da
União. Mais do que isso, o MINC – Ministério
da Cultura e a ANCINE devem propor a recuperação
desse acervo, financiando e incentivando convênios
com instituições públicas e fundações
para pesquisa-lo. A experiência nacional, passada
e vivida, será de grande valia para o entendimento
de momentos históricos e contribuirá para
o estudo e formulação de políticas
futuras.
Neste momento, alguém
estará perguntando sobre a importância
das cinco questões propostas no início
deste artigo. Vejamos:
O "metro linear" foi um sistema
de taxação aplicado sobre a copiagem de filmes estrangeiros
no Brasil, uma espécie de antecessor da CONDECINE por
volume de cópias proposta no projeto de lei que cria
a ANCINAV. Portanto, o conhecimento da experiência do
"metro linear" seria, no mínimo, bem-vindo.
O filme A Estrada
da Vida foi o primeiro lançamento no país
em que se "cruzou" a cobertura regional de
sinais de televisão com os cinemas lançadores
do filme. Na época, todos os grandes lançamentos
eram realizados em cadeia nacional. Os resultados da
estratégia adotada foram positivos e podem servir
para o balizamento para grande parte dos lançamentos
da produção nacional que não possuem
verbas para a colocação maciça
no mercado.
A ANCINE está
discutindo a re-introdução do "adicional
de rendas" que em determinada época, representou
a mais importante fonte de financiamento de filmes independentes,
não vinculados ao financiamento estatal. Mesmo
em se tratando de momentos historicamente diferentes,
a compreensão de tal mecanismo poderá
contribuir na elaboração de regulamentos
atualizados.
Teixeirinha e Mazzaroppi
foram os maiores fenômenos populares do cinema
brasileiro regional. No caso do cantor gaúcho,
seus filmes chegaram a superar 1,5 milhões de
espectadores, obtidos apenas nos três estados
do sul do país. Eram co-produzidos por distribuidores
e exibidores locais, que lhes asseguravam a permanência
em cartaz. Sua última produção,
A filha de Iemanjá foi distribuída
pela EMBRAFILME com fracos resultados. Uma análise
mais detalhada dos resultados de exibição
pode conduzir a uma melhor compreensão da relação
regional da distribuição e da exibição.
Por último, os
dois filmes citados, Boi de prata e Pele do
bicho foram produzidos no Pólo Cinematográfico
do Rio Grande do Norte. Os pólos regionais eram
convênios de co-produção da estatal
com governos estaduais, visando a regionalização
da produção cinematográfica. Existe
questão mais atual
que esta?
Luiz Gonzaga de Luca |