Editorial



Emmy Rossum e Sean Penn em Sobre Meninos e Lobos de CLINT EASTWOOD, grande destaque entre os lançamentos dofinal do ano. A adolescência é uma das problematizações mais ricas no cinema americano recente (cf. Gus Van Sant, Larry Clark, etc.)
   
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fotos da edição: Fernando Duarte

Adeus ano velho. Nossa edição de dezembro chega alguns dias atrasada e rápido nos deparamos com um mês novo, e conseqüentemente com um novo ano. Mesmo que o inventário de idéias e estéticas do ano de 2003 seja na edição seguinte, algumas impressões foram nascendo ao longo do ano e sendo ratificadas com o passar dos meses. Uma delas é que, a despeito da excepcional média de ocupação de salas de 22% para o cinema nacional, 2003 terá permanecido como um ano entre parênteses para o cinema brasileiro. Nenhum filme a ser defendido incondicionalmente – ao passo que no ano passado haviam três, que não por acaso figuraram em nossa lista de melhores do ano –, discussões sobre cinema remetidas aos lugares-comuns de sempre (toda a criação de factóides acerca da contrapartida social, os caminhos e descaminhos da Ancine), a Globo Filmes em seu melhor (Lisbela) e em seu pior (Normais, Casseta e Planeta) dominando as telas do país, alguns filmes de peso, certamente (Amarelo Manga, os dois de Jorge Furtado, Carandiru, Gregório de Matos, Separações ou Apolônio Brasil). Mais sobre isso tudo em janeiro.

Outra constatação forte desde janeiro é que os grandes cineastas americanos estão em crise com seu país. Desde janeiro, com Gangues de Nova York, até dezembro, com Sobre Meninos e Lobos (passando pelos festivais, onde encontramos Elefante e Ken Park), a sociedade americana está no divã para discutir acerca da constituição de sua sociedade e da violência interna reprimida do país. Reflexões, inclusive, muito mais profundas, pertinentes e complexas do que certos documentários que supostamente tratariam do assunto – sabemos do que estamos falando, não? Um dos principais focos temáticos desses filmes, curiosamente, girou em torno da vida adolescente nos Estados Unidos. Mais do que problematizações, esses filmes juntos tentam criar um estatuto do que seja a adolescência a) no cinema; e b) no mundo de hoje. Eternos recalcados do pensamento (Sartre, por exemplo, via a adolescência como uma "não-idade" entre a infância e a vida adulta) e do cinema (Hollywood e as séries de televisão americanas via de regra colocam atores adultos para representar o papel dos adolescentes), os adolescentes pedem a palavra e nós tentamos ouvir.

Uma grande novidade de 2003 foi a volta da cinefilia. Durante um tempo estagnada em guetos, o hábito de ver filmes fora do circuito comercial explodiu em 2003 com uma multidão de cineclubes (entre os quais o dessa revista com o Grupo Estação), com a volta da Cinemateca do MAM, com a programação revigorada do CineSesc em São Paulo, com a continuidade de outros grupos (CCBBs ao redor do Brasil, Centro Cultural São Paulo, etc.) e com as mostras e festivais anuais, como o É Tudo Verdade e a Curta Cinema, que a todo ano crescem e se consolidam no cenário cultural brasileiro e carioca. Acompanhamos tudo isso e nessa edição de dezembro tecemos nossas considerações sobre um pouco de tudo que vimos na sala de cinema nesse final de ano, dos curtas-metragens até as mostras dedicadas a Yasujiro Ozu e Roberto Rossellini. Um grande 2004 para todos nós.

Ruy Gardnier