Piranha, de Joe Dante

Piranha, EUA, 1978
Fruto
de uma longa safra de filmes com ameaças marinhas realizadas nas costas
de Tubarão, o filme de Dante em momento algum tenta esconder este
fato, e o cineasta logo joga isto na imagem de um dos protagonistas do
filme (Heather Menzies) jogando um fliperama baseado no filme de Spielberg,
onde quem se controla é o tubarão, e o objetivo é devorar o máximo de
pessoas. Mas o mais atento terá notado que poucos minutos antes, Dante
disparava uma referência que lhe parece bem mais pessoal: O Monstro
da Lagoa Negra, de Jack Arnold. E isso não é tão diferente da maneira
como a qual Dante irá conduzir inegavelmente apoiado pelo bem resolvido
roteiro de John Sayles, e a bela trilha de Pino Donaggio essa sua
estréia solo no cinema, onde irá tirar em meio ao produto que precisa
apresentar, belos momentos de cinema (e tal processo pode ser encarado
em uma grande quantidade de seus filmes).
Apesar de seus fortes momentos de humor e diversão, Piranha é também
um filme de horror bastante sério e incomodo. O teor político que geralmente
surgia de maneira bastante superficial nos filmes desta safra (e pode-se
dizer que lembra um tanto o que ocorria com uma porção de filmes de zumbis)
aqui é tratado como um assunto que de fato interessa a quem o realiza.
Não será calcado na política que o filme se apoiará, mas este seu lado
está sempre presente em cena, seja com o personagem de Kevin McCarthy,
seja com os militares, ou o personagem de Dick Miller; aqui a política
passa longe de estar presa a questões relacionadas com o poder, ela passa
por isso, mas não termina nisto. O pós-climax do filme é dotado de tal
sombriedade, que mesmo após o ato final de heroísmo do protagonista (e
personagem em que guardamos forte esperança), é impossível que se ostente
um sorriso de felicidade a câmera passeando pelos feridos (incluindo
o próprio herói) e jornalistas, até o final com uma entrevista com a cientista
militar, é filmada de tal forma que impossibilita que o ato heróico, por
mais importante e necessário que tenha sido, passe por cima do que ainda
caminha pela terra.
Dante também já demonstra aqui que subverter pequenas questões
importam tanto quanto diversos detalhes quando se é um grande cineasta.
Dante irá pegar momentos dispersos de nenhuma sutileza, seja nas
já citadas referências, seja no corte seco na montagem que sai de uma
cena bastante pesada onde figuram uma porção de crianças feridas pelos
ataques das piranhas, e se teme o novo rumo da criaturas, e corta direto
para uma porção de banhistas se divertindo despreocupadamente, onde fica
claro que logo serão somente alimento para os devoradores; seja numa gravata
escandalosamente cor-de-rosa de Dick Miller; ou em Barbara Steele caprichando
na entoação ao dizer science-fiction para o que acabavam de contar nossos
protagonistas (sendo que aqui Dante faz questão de não mostrá-los contando,
como quem entende que acabará de mostrar tudo aquilo e não precisava resumir
em palavras) serão estas cenas que à primeira vista são
dotadas de nenhuma sutileza, que subvertidas por Dante, se tornaram então
a maior das sutilezas. Mais do que simplesmente dar início à uma brilhante
carreira, Piranha é um filme importante, tanto para se entender
Dante já apresenta a maioria das características que o cineasta
iria despojar ao longo dos anos como para o cinema em si, pois
acima de tudo, trata-se de noventa e três minutos de puro cinema.
Guilherme
Martins
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