Critérios para a lista
de verbetes

Antes
de irmos à lista de verbetes como um todo, dois esclarecimentos
se tornam absolutamente necessários. Um, de ordem prática:
afinal, qual o critério para a colocação de um
nome nesta lista de verbetes? Seguiremos este raciocínio abaixo.
Mas outro, de ordem absolutamente direta, deve começar este texto:
sendo a Contracampo uma revista que privilegia o espaço de reflexão
e discussão do cinema a partir de uma linha de intervenção
subjetiva direta, não se poderia esperar desta lista que fosse:
a) simplesmente jornalística-biográfica; b) com espaço
para reflexão em torno dos 110 nomes (e seus quase 150 longas)
igual ao que se costuma dedicar a cada crítica. O ponto b é
simples de se explicar, afinal a revista precisaria se tornar, na prática,
completamente ilegível pela quantidade de informação.
Mas, mais do que isso, quase a totalidade destes filmes já foi
assunto de texto em Contracampo separadamente (seja com críticas
dos que entraram em cartaz comercialmente, seja na cobertura de tantos
festivais), então acreditamos que os verbetes devam servir, tão
somente, como chance de ir aos arquivos da revista (de críticas
principalmente) para ver o que já se disse aqui sobre os filmes,
em profundidade. Mais óbvio, mas talvez menos simples de se explicar,
e fácil de se desconsiderar, é o ponto a. Ponto-parágrafo
então para ele.
Contracampo,
ao contrário de muitas outras publicações, não
vê o cinema nacional com olhos condescendentes, nem acusatórios.
Consideramos que o cinema nacional, como assunto, é muito mais
importante do que aquele de outros países pelo simples fato de
que nos consideramos parte dele. E, afinal, como escrevemos tão
somente em português, o alcance dos nossos textos se limita mais
ao Brasil, daí termos a consciência de que a repercussão
de cada um deles ser muito maior aqui do que fora. Ao sabermos disso,
porém, não consideramos que nossa pequena possível
parcela neste cinema seja a de "levantar a sua bola", por
assim dizer, indiscriminadamente. Defendemos, antes de tudo, a necessidade
de um cinema brasileiro vivo e pulsante. Mas achamos que, dentro do
que seja este cinema, é nosso dever estar sempre escolhendo favoritos
e menos favoritos dentro da linha que estamos construindo há
quase 5 anos (e que é menos "coerente" em termos de
proposta de cinema do que de visão de mundo). Se assim não
for, não seremos de fato um local da crítica como a entendemos
– espaço de ressonância de um meio de expressão
artística onde ele encontre não um juiz nem um acusador
e sim um companheiro de diálogo.
Isso
tudo para dizer que, sim, estes verbetes são opinativos, e não
puramente "enciclopédicos" por assim dizer. Implicam
em julgamentos de valor junto com listagem completa. Não precisávamos
nem dizer (embora estejamos fazendo justamente isto, aqui) que estes
julgamentos de valor são nossos e de mais ninguém (não
por acaso os verbetes são assinados), e que toda e qualquer inferência
que se faça a partir deles é da ordem do mais puro subjetivismo.
Ou seja: em primeiro lugar, nenhuma destas afirmações
se pretende ser "a verdade" sobre a capacidade de um profissional
(nem muito menos, deve-se dizer por mais óbvio ainda -uma vez
que nunca fizemos isso na Contracampo- de uma pessoa), e sim a "nossa"
verdade, tão transitória e parcial quanto esta possa ser.
Em segundo lugar, este levantamento é um retrato de um momento
no tempo (como, aliás, todo filme é). Portanto, tanto
na análise do que se viu até o momento, quanto especialmente
em prognósticos futuros, absolutamente falível. Como nos
próprios verbetes indicamos (por exemplo, sobre Andrucha Waddington
ou Fernando Meirelles), cada filme pode incluir um novo olhar sobre
um cineasta, e uma coisa que Contracampo nunca fez foi deixar de rever
suas opiniões sob a luz de novos fatos. Não temos o menor
medo de "estarmos errados", nem de "nos corrigirmos",
pois isso é ridículo. Mas, também, não temos
o menor medo de dizermos o que pensamos, pois isso é o mínimo
que, não só nossos leitores, mas nós mesmos, esperamos
do que fazemos.
Os
critérios para a "estréia"
Tirando
esta questão do caminho, uma mais prática se faz necessária:
uma vez que esta é uma lista de estreantes, faz-se necessário
dizer qual o critério usado para definir a tal "estréia".
Pois bem, consideramos como estreantes os cineastas que tiveram exibidos
publicamente em película um longa metragem pela primeira vez,
desde 1995 até 2003. Todos estes são critérios
absolutamente discutíveis, mas é importante dizer que
são os nossos, e os que foram considerados. Quando dizemos que
são discutíveis, nos referimos, por exemplo, à
questão do longa-metragem ou da película. No entanto,
era preciso estabelecer algum tipo de restrição ao material
analisado, especialmente quanto à sua efetiva circulação.
Como o formato principal de exibição comercial em cinemas
continua sendo este acima, foi o que utilizamos, até mesmo por
questões de maior controle nesta listagem. Uma vez que "cineasta"
é hoje um conceito que se pode (e deve) usar em vários
tipos de produção, achamos importante esclarecer isto
de saída.
"Então,
quer dizer que se Guel Arraes não tivesse exibido O Auto da
Compadecida e Caramuru nos cinema, ele não estaria
na lista?" Exatamente.
"Então,
quer dizer que se Jorge Furtado não tivesse lançado dois
longas nos cinemas no último ano ele não estaria nesta
lista?" Perfeitamente.
Isso
se dá, acima de tudo, porque com a atual democratização
do acesso em produção a meios como o digital, com o número
de curtas em torno de 150 feitos por ano e com a exibição
ocupando espaços como a TV a cabo ou mesmo as tevês comunitárias,
qualquer outro tipo de recorte, em sua abrangência, se tornaria
inviável. Portanto, como achamos que, a partir mesmo destas restrições,
este recorte faz algum sentido e deve ser olhado em separado, temos
certeza de sua importância. Consideramos a obra dos realizadores,
nos verbetes, em sua totalidade: curtas, vídeos, TV. No entanto,
ao fazer a listagem consideramos apenas os realizadores que se encaixavam
no descrito acima.
Vamos,
por último, citar alguns tipos de produção que
foram ou não incluídos nesta lista final, além
dos de critérios mais óbvios (como a exclusão de
realizadores exclusivamente em curtas, pelo critério da duração):
- Filmes
exibidos em sala de cinema só no formato digital ou em vídeo
– uma simples exibição numa sala de cinema com um canhão
de vídeo muda muito pouco o estatuto de um trabalho em vídeo
em relação a tantos outras obras (sem contar que, nacionalmente
falando, torna-se uma impossibilidade de contabilizar e catalogar).
Já a decisão pelo processo da kinescopia indica, em si
mesma, um desejo de comercialização e exibição
da obra em outro patamar, que fala muito das pretensões do autor
em relação a sua própria obra. Fala também,
é lógico, do acesso a meios financeiros e econômicos.
No entanto, o que diferencia alguém que consegue uma exibição
em canhão de vídeo num cinema local de quem realiza algo
em digital e nunca chega a exibir sem ser em TVs – sejam redes de TV
ou em TVs avulsas mesmo? Como centimetragem da tela nos parece um critério
realmente estúpido, e sob o risco de impedir toda e qualquer
outra listagem se abrimos a todo material audiovisual produzido no país
acima de 60 minutos, sem ligar a uma noção de exibição
específica, optamos por este recorte.
- Filmes
de longa metragem em episódios - entraram na listagem de filmes
realizados aqueles episódios feitos por realizadores que também
fizeram um longa de duração superior a 60 minutos. No
entanto, aqueles que realizaram apenas um episódio em um longa,
não foram listados. Porque, de fato, embora tenham tido lançamento
comercial em salas de cinema, não se pode dizer que o realizador
específico teve uma experiência pessoal (seja em dramaturgia
e realização, seja em processo de exibição)
em nada diferente dos que fazem curtas metragens. E a fronteira ficaria
ainda mais confusa se pensamos em iniciativas de lançar curtas
sem nenhuma relação de produção em programas
mais longos (como a experiência das Quatro Histórias
de Amor, por exemplo). Artisticamente e em impulso criador, não
se pode a sério separar entre a realização de um
episódio independente (tanto que pedaços de Felicidade
é, por exemplo, foram exibidos em separado em alguns festivais)
e um curta. Por isso, estão de fora desta lista nomes como José
Roberto Torero e José Pedro Goulart (de Felicidade é...),
enquanto entraram Jorge Furtado e A.S. Cecílio Neto (outros dois
realizadores de episódios deste longa que lançaram longas
metragens pessoais). Estão fora pelo mesmo critério, ainda:
José Araripe e Edyala Iglesias (de Três Histórias
da Bahia), Cláudio Torres (de Traição)
e Jorge Moreno (de O Circo das Qualidades Humanas).
- Filmes
de longa metragem dirigidos por mais de um realizador – Nestes casos,
quando os cineastas envolvidos só realizaram filmes juntos, foram
tratados como apenas um verbete (a separação faria pouco
sentido, uma vez que ninguém vai ficar achando o que é
marca de quem no mesmo filme). Quando houve filmes realizados em separado,
passam a ter dois ou mais verbetes.
- Filmes
que não estrearam comercialmente – desde que tenham tido exibições
públicas em película, foram considerados, pois é
assim que datamos um filme aqui na revista. Afinal, quem pode dizer
que, por exemplo, Cidade de Deus já não possuía
relevância mesmo antes de seu lançamento (claro que esta
se multiplicou depois disso), ao ser exibido em Cannes e a partir de
sua resposta. Ou quem pode dizer que Narradores de Javé,
por exemplo, ainda inédito, já não possui importância
no cinema nacional? O único problema que isto criou é
que, de fato, houve filmes que não conseguimos ver antes desta
pauta, mesmo já os considerando englobados nela. Foram os casos
de Deus Jr., de Mauro Lima (só exibido no Festival do
Rio de 2000, quando não foi visto por nenhum de nós),
de Onde Os Poetas Morrem Primeiro, de Willy e Werner Schuman
(exibido no Cine Ceará e Curitiba em 2001, idem acima), de Benjamim,
de Monique Gardenberg (exibido este ano em Sundance, mas inédito
no Brasil) ou de Concerto Campestre, de Henrique Freitas Lima
(Recife, 2003). Destes, apenas os irmãos Schuman estavam realizando
seu primeiro filme, por isso apenas eles estão ausentes conscientemente
de nossa lista (lamentamos muito esta omissão, mas sabemos ainda
que podemos ter deixado de fora outros nomes por desconhecimento – no
entanto, se houver, serão pouquíssimos). Os outros filmes
são citados e listados nos verbetes dos cineastas, algumas vezes
citando recepção dos filmes, mas destacando-se sempre
que não os vimos. E vários outros filmes/cineastas que
não tiveram lançamento comercial estão verbetados
porque vimos seus, mesmo que raros, filmes em festivais ou afins: exemplo
de Os Cristais Debaixo do Trono, de Del Rangel (só exibido
em Recife, em 2001), Histórias do Olhar, de Isa Albuquerque,
A Cobra Fumou de Vinicius Reis, O Prisioneiro da Grade de
Ferro, de Paulo Sacramento, Celeste e Estrela de Betse de
Paula, e vários outros – o número de filmes ainda inéditos
nos últimos dois anos cresceu muito, algo de preocupante não
só para os estreantes.
- Filmes
não exibidos publicamente – Existe um pequeno número de
filmes já mostrados em sessões limitadas (cabines de imprensa,
comissões de seleção, etc) que ainda não
foram exibidos publicamente, nem em festivais – como é o caso
de 5 dos concorrentes de Gramado (4 deles de estreantes, e 1 segundo
filme de cineasta estreante pós-95). Infelizmente, estes filmes
serão os primeiros a, em menos de um mês, tornarem nossa
lista desatualizada. No entanto, seria impossível evitar este
tipo de acontecimento em qualquer momento que escolhêssemos –
e para isso temos um outro texto que listas as próximas estréias.
Esperamos
com este texto resolver a maior parte das dúvidas que os leitores
possam ter sobre nossa listagem, ou pelo menos aquelas que nós
mesmos tivemos ao fazê-la. Se você tiver mais alguma, porém,
não deixe de perguntar. Quem sabe não erramos ou esquecemos
de algo?
Eduardo
Valente
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