Atos Proibidos de Amor e Vingança,
de Sergio Corbucci


Giallo Napoletano, Itália, 1978


É curioso o título dado pelos distribuidores nacionais para Giallo Napoletano, porque o filme chama atenção pela grande leveza com que Corbucci o conduz, leveza esta que o título jamais deixaria o espectador suspeitar. Só que por baixo deste tom leve, reside mesmo uma história de mistério bastante pesada, mesmo que o espectador só comece a suspeitar disso quando ela caminha para o fim (a maioria da ação acontece fora de cena).

Sergio Corbucci, da leva de cineastas italianos que precisam ser redescobertos, fez de tudo de comédias de Totó a épicos, flertando freqüentemente com cinema engajado quase sempre com belos resultados – O Vingador Silencioso, faroeste político feito em 68, é tão bom ou melhor que os de Leone. Giallo Napoletano é um trabalho mais descontraído, onde Corbucci resolveu fazer uma comédia de mistério que homenageasse o gênero (os créditos do filme passam sobre um painel com fotos de Hitchcock e Fritz Lang, como a anunciar as intenções), auxiliado por um excelente elenco (Marcello Mastroianni, Ornela Muti, Michel Piccoli).

O filme segue as confusões em que se mete um professor de bandolim, feito por um Mastroianni completamente desglamourizado, manco (ele tem poliomielite), sempre mal vestido, dominado pelo pai (um aposentado que apesar de sustentado pelo filho parece ter como maior diversão critica-lo) e não muito esperto, depois que, para pagar uma dívida, ele faz uma serenata as cinco da manhã e vê um corpo cair pela janela. A partir daí a trama se torna propositalmente complicada demais para ser explicada (no final existem dois longos monólogos para dar conta dela e ainda assim fica-se com certas dúvidas sobre quem matou quem); basta dizer que ela envolve um famoso maestro (Piccoli), sua misteriosa nora (Muti), uma chantagem e uma série de corpos que insistem em cair de janelas sempre que Mastroianni está por perto.

Há também uma bela trilha sonora composta por Riz Ortolani, elemento importante num filme em que dois personagens centrais são músicos e onde a chave do mistério não se encontra numa imagem (Argento, De Palma), mas justamente numa composição.

Corbucci vai enfileirando situações e elementos que relacionamos com filmes do gênero, uma casa misteriosa com fama de mal assombrada, um carro sem freios, um barco que afunda, um morto encontrado numa geladeira, etc. Vai inserindo neles sempre algo de inesperado e cômico, muito por conta do nada heróico personagem de Mastroianni que não leva nenhum jeito para eles.

No fim, quando a tragédia familiar se instala (o que não deixa de ser uma referência a toda uma tradição de cinema de mistério italiano), o filme nos lembra que todo o seu humor é construído sobre assuntos com conseqüências muito sérias, sem com isso deixar de lado a fantasia. Giallo Napoletano talvez seja exatamente isto, um elogio a necessidade do artista de usar do artifício para melhor se expressar.


Filipe Furtado