Tata
Amaral
(Um Céu de Estrelas, Através da
Janela)

- Tendo lançado seus primeiros
filmes recentemente, queríamos que você falasse sobre a sensação
posterior ao processo de um filme chegar no mercado e até as pessoas,
comparando com aquele sonho de realizar um filme, e com o processo tão
duro de torná-lo realidade. Em que a experiência te enriqueceu,
em que você se decepcionou?
Acho que um filme se completa quando chega ao público. Sinto que
termino o processo quando um filme que fiz é exibido. É
quando a parte mais importante do diálogo acontece. Digo isto porque
acho que o diálogo entre a idéia (ou sonho) começa
junto com a produção do filme, entendendo produção,
inclusive, o momento da captação. É quando a idéia
começa a ser exposta, discutida (por que não? vendida);
depois disto, acontece o momento do diálogo com a equipe, os atores.
O filme vai se construindo, se concretizando. É quando ele está
sendo ensaiado, filmado, montado, mixado. Finalmete ele se realiza, quando
é exibido ao público, que se apropria dele. Então
posso perceber aquilo que realmente comunicou, o que pôde ser compartilhado.
Todo o trabalho de comercialização de um filme, sua divulgação
etc, acontecem sob esta perspectiva: o contato com o público. Fazer
e mostrar é meu grande barato. Gosto do corpo a corpo do lançamento,
de estar com as pessoas, apresentar o filme para diversos públicos,
estar presente nas sessões, falar com os jornalistas, com o distribuidor.
Tenho muito prazer em fazer isto e o faço com muita alegria e interesse.
- Como você vê o cinema brasileiro no momento atual, falando
em termos de filmes e estética?
Acho que o cinema brasileiro continua atendendo a sua vocação
de ser um cinema plural, em termos de produção: continuamos
a fazer filmes para todos os gostos, em várias partes do país.
Este ano que passou fomos surpreendidos por O Invasor e Cidade
de Deus, filmes que deram o tom do realismo na tela, que conquistaram
público para isto. Antes disto, havia o mito de que o público
brasileiro acorria às telas, em massa, para ver comédias
leves de costume. Acho que "Cronicamente Inviável" já prenunciava
esta mudança de interesse. Estes filmes dialogam com inquietações
muito precisas do público e, acima de tudo, contam muito bem suas
histórias... que são histórias que precisavam ser
contadas no cinema. Além disto, em ambos existe uma busca formal
no sentido transpor para o cinema um tipo de realismo. Acho que O Invasor
e Cidade de Deus deram o tom do ano.
Continuamos a fazer filmes para todos os gostos. Mas acho que nossos distribuidores
precisam ousar mais na distribuição dos filmes para todos
os gostos. Temos subsídios para produção, precisamos
ter mais para distribuição, prêmios de desempenho,
prêmios por quantidade de filmes distribuidos, sei lá. Acho
que falta ousadia neste setor. Bem como junto aos exibidores.
- Quais as expectativas para a entrada de um novo Governo, o que sempre
significa toda uma nova série de orientações para
o andamento da produção? Quais áreas você consideraria
as mais emergenciais em termos de ação deste Governo?
Acho que precisamos continuar incentivando a produção plural,
que ela aconteça em todo país, precisamos ter mais projetos
para produção e distribuição de curtas-metragens.
Os prêmios estímulos locais são soluções
para esta necessidade, a de falarmos todas as nossas línguas. Acho
que o Brasil é um país onde a tolerância para com
o outro, o diferente, é bem maior que em outros por onde andei.
Isto se deve às suas dimensões, ao trânsito migratório,
ao respeito às produções locais. Mas podemos explorar
mais este potencial e o cinema é um veículo privilegiado
para isto.
Precisamos também incentivar a produção e distribuição
de filmes de curta e longa metragem que signifiquem mais em termos de
pesquisa, de experimentação, do que resultado de bilheteria.
Precisamos ampliar o público para estes filmes.
Precisamos de programas de formação de platéia. Hoje
em dia está claro que nosso cinema ocupa muito menos do mercado
que lhe cabe: falta fazer o filme chegar em todas as partes do país,
ou pelo menos em suas grandes cidades.
Por falar nisto, precisamos de programas de alfabetização
audiovisual nas escolas para que tenhamos um público menos passivo
diante das televisões.
Precisamos garantir uma faixa de mercado importante para o nosso cinema,
precisamos amplia-la, distendê-la. Falta também interesse
por parte dos distribuidores em exibir filmes, ainda que para um público
mais reduzido que aquele do cinema americano. Falo isto baseada no contato
que tenho com pessoas de várias partes do país onde os filmes
não chegam, mas onde, evidentemente, existe grande interesse por
eles. Por isto falo em mais ousadia na distribuição, menos
ganância, mais empenho na exibição.
Nós cineastas estamos fazendo nossa parte. Precisamos da cooperação
destes outros setores.
Conto que este governo, de vocação democrática, também
possa desenvolver programas no sentido de erradicar nossa fome de nós
mesmos, da nossa cultura, do nosso cinema, do nosso teatro, da nossa música,
da nossa dança, da nossa televisão. Amém.
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