Editorial



Em 2002, o cinema brasileiro voltou às conversas, às telas e às páginas de jornal. Terreno quase novo para um cinema a ser reencontrado. O cinema brasileiro é um INVASOR em seu próprio país?
(foto: Paulo Miklos em
O Invasor
de Beto Brant)
   
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fotos da edição: Fernando Duarte

Feliz Ano Novo, Feliz Ano Velho. No cinema brasileiro, como de resto em todos os cinemas do mundo com a possível exceção do americano e do indiano, uma troca no Governo Federal implica numa natural ansiedade com relação a possíveis alterações das regras do jogo que regem a produção nacional (quem poderia esquecer o sinistro início do Governo Collor?). Quando o Governo que assume é o primeiro assumidamente de esquerda eleito pelo povo, e logo em seguida assume a Secretaria do Audiovisual (órgão governamental que lida mais diretamente com o cinema brasileiro) um cineasta e professor de cinema com passado de lutas e bandeiras levantadas em defesa da nossa produção audiovisual, é impossível que estas expectativas não se transformem em franca esperança de melhorias. Ainda mais quando o ano que passou foi tão importante para a consolidação de uma série de posições em relação ao nosso cinema: o fenômeno de público de Cidade de Deus, o reconhecimento da qualidade de inúmeros filmes lançados ao longo do ano que ocasionaram a volta do cinema brasileiro ao centro da discussão cultural no país (tanto com CDD quanto com filmes como O Invasor, Rocha que Voa, Madame Satã, O Príncipe, Edifício Master, Ônibus 174, etc), uma volta do cinema brasileiro de forma contundente ao retrato da situação atual do país em todas as suas facetas. Em suma, 2002 foi um ano especial que permite que as esperanças lançadas para 2003 extrapolem o campo político e sejam, antes de tudo, cinematográficas.

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É por isso que Contracampo, num mês em que tradicionalmente realizamos um balanço da produção nacional do ano anterior, não poderia deixar de sinalizar a importância do ano que passou ao mesmo tempo em que tenta captar os sentimentos e desejos com relação ao que virá. Por isso mesmo, ao nosso Cinema Falado de todos os anos, onde conversamos de forma livre e sem amarras sobre o que aconteceu em 2002 no cinema brasileiro, resolvemos este ano somar um painel de impressões do meio cinematográfico brasileiro sobre este momento rico. Entrevistamos, além do Secretário do Audiovisual Orlando Senna, a presidente do CBC (Congresso Brasileiro de Cinema) Assunção Hernandes, e o diretor da Ancine, Gustavo Dahl. Se esses três nomes compõem hoje o principal tripé de representação institucional do cinema nacional, não podíamos deixar de ouvir também os dois cineastas responsáveis pelos maiores êxitos do cinema brasileiro pós-1994 em termos de resposta de público, crítica (mesmo que polêmicos) e reconhecimento no exterior: Walter Salles e Fernando Meirelles. E ainda enviamos um questionário a um variado grupo de diretores tentando ver como os cineastas que estrearam no longa após a chamada "retomada" vêem a realidade do cinema nacional, e como cineastas veteranos de muitas outras épocas e Governos comparam o momento atual com o tanto já vivenciado por eles. Acreditamos que este painel variado poderá nos servir tanto hoje como no futuro, providenciando um retrato fiel do que passa e projeta o cinema nacional nesta virada de ano de 2002 para 2003..

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Nestes últimos anos de aumento desenfreado do dólar, vimos o número de mostras retrospectivas que dependam de cópias que vêm do exterior diminuir drasticamente, ficando praticamente reduzidas aos trabalhos do Festival do Rio e Mostra de SP, e a ocasionais e raras intervenções de instituições como o CCBB. Como o acervo de cópias antigas existentes no país é limitado, com isso o trabalho de vários autores fica, ou completamente inédito, ou no mínimo de difícil conferência pelo cinéfilo brasileiro. Por isso mesmo é preciso comemorar iniciativas como a compra pelo Grupo Estação dos direitos de boa parte da carreira de Eric Rohmer, e sua exibição em cópias novas. Esta mostra, que esteve ano passado em São Paulo, só chegou ao Rio de Janeiro (lar da maior parte dos redatores da nossa revista) em janeiro deste ano. Como celebração e necessária resposta ao estímulo que foi o contato com estes filmes, publicamos nesta edição uma série de artigos a partir do trabalho do mestre do cinema francês e mundial.

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Completa a edição uma pauta especial em DVD/VHS sobre os filmes favoritos de vários redatores que tratem do ambiente da guerra, no momento em que nos é anunciada a cada dia a proximidade de mais uma insana e inexplicável intervenção militar americana. Vamos ver como o cinema já foi capaz de retratar este que é sempre um dos mais trágicos momentos do Homem, e por isso mesmo, matéria prima para vários grandes filmes. Boa leitura.

Eduardo Valente

ça

fotos da edição: Fernando Duarte