Cacá
Diegues
(A Grande Cidade, Xica da Silva, Chuvas de Verão,
Bye bye Brasil, Deus é Brasileiro - 15 longas em 40 anos de
carreira)

- Como você compararia as dificuldades
de realização de um filme no momento atual com outros já
vividos dentro do cinema nacional? E no lançamento dos filmes e
sua chegada ao público?
As dificuldades variam, mas sua natureza
é sempre a mesma: o cinema, no Brasil, não é uma
atividade permanente, vive de regras e sistemas e modelos que são
constantemente alterados, conforme se fecham ou se iniciam novos ciclos.
Assim, cada filme é sempre um primeiro filme, mesmo para um diretor
veterano, com décadas de trabalho e mais de uma dezena de filmes
feitos. Só mesmo a paixão pelo cinema justifica tanto esforço
para enfrentar esse mito de Sísifo moderno.
A entrada das grandes distribuidoras internacionais
na distribuição de filmes brasileiros deu um outro patamar
ao lançamento de nossos filmes no Brasil, um patamar que não
conhecíamos desde o enterro da Embrafilme. Mas só a quantidade
de filmes vai gerar uma qualidade de produção suficiente
para criar um hábito. "Deus é brasileiro" foi beneficiado
pelo sucesso de "Cidade de Deus", assim como esse foi beneficiado pelo
sucesso do "Auto da Compadecida" e esse pelo de "Central do Brasil" e
assim sucessivamente. Se esse movimento for interrompido pela falta de
filmes, começa tudo de novo.
- Como você vê o cinema brasileiro
no momento atual, falando em termos de filmes e estética?
Com muita esperança. Nesse período
chamado de "retomada", se fizeram cerca de 250 filmes dos quais mais de
70 são de estreantes, primeiros longas de diretores jovens vindos
de várias regiões do Brasil. Grande parte desse filmes é,
no mínimo, interessante; outros são excelentes; e alguns,
verdadeiras obras primas. Parece que o país tem uma vocação
irresistível para o cinema, é só não sufocar
esses jovens talentos com dogmas inventados pela academia, com cânones
de quarenta anos atrás.
- Quais as expectativas para a entrada
de um novo Governo (o que sempre significa toda uma nova série
de orientações para o andamento da produção)?
Quais áreas você consideraria as mais emergenciais em termos
de ação deste Governo?
O projeto de modelo novo para o cinema brasileiro,
gestado durante os últimos 4, 5 anos e parido duramente depois
de muito debate, de comissões no Senado, de dois Congressos corporativos,
de um Grupo Executivo federal e de uma MP exaustivamente discutida, não
pertence a nenhum governo, mas à própria atividade que o
gerou. É natural que um novo governo queira adaptar esse projeto
às suas próprias metas; cabe aos cineastas defendê-lo
com unhas e dentes, para inclusive ganhar autoridade e respeito junto
a quem toma decisões. Se não fizermos isso, com muito empenho,
em pouco tempo estaremos começando tudo de novo, brigando por uma
nova "retomada".
A emergência neste momento são
duas: primeiro, consolidar a estrutura institucional idealizada pelos
cineastas e consagrada na MP que criou o Conselho Superior de Cinema,
a Ancine e a SAV; simultaneamente a isso, é preciso criar condições
para reiniciar com urgência a produção de filmes,
interrompida por essas discussões de transição.
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