Os Vagabundos Trapalhões,
de J. B. Tanko

Brasil, 1982
Os Vagabundos Trapalhões
está inserido em um momento de preocupação com temáticas
sociais do grupo, durante a década de oitenta e que tem articulação
com o que poderíamos chamar de temática nacionalista, na
medida em que temos a questão da identidade nacional mesmo que
atrelada a uma linguagem cinematográfica hegemônica, e a
uma proposta estética importada.
Renato Aragão
retoma seu personagem Bonga, de Bonga, o vagabundo (1969), agora
acompanhado dos três trapalhões, para narrar a história
de um grupo de vagabundos (esse termo está associado à pobreza
principalmente) que acolhe crianças abandonadas e que as direciona
para famílias ricas. Isso é feito de maneira simples e ingênua:
simulam pequenos acidentes de carro com as crianças para que o
motorista a conheça e se sensibilize com ela, resultando em uma
possível adoção. Mas isso é apenas uma solução
provisória, visto o número crescente de crianças
que eles têm para cuidar.
Forma-se então
um núcleo bastante interessante, no modelo de família circense
com o qual os quatro comediantes têm tanta proximidade. Morando
em uma caverna, eles têm um espaço anárquico, porém
de caráter assistencial e até mesmo educacional junto às
crianças. Soma-se aos quatro a personagem da vagabunda interpretada
por Louise Cardoso, par romântico de Bonga (um amor ingênuo),
que tem como promessa só se casar com ele quando conseguirem arranjar
um lar para todas as crianças. Os cinco formam, assim, uma miserável
trupe pronta a fazer pequenos bicos e pequenas armações
para arranjar comida e família para o grupo todo. É curioso
como são permitidos e aceitos (pela narrativa e pelo público)
pequenos roubos e enganações em nome de um projeto de vida
que vira praticamente um projeto de integração social, um
substituto emergencial de falhas institucionais. A figura do "palhaço
malandro" é utilizada, portanto, como uma maneira cômica
de driblar as dificuldades do dia a dia e, de alguma forma, estabelecer
um vínculo com a sociedade a qual pertence de forma marginal: são
desempregados, miseráveis, sem teto, esfomeados e ainda, artistas...
O desenrolar da narrativa
segue um modelo recorrente nos filmes dos Trapalhões: depois de
apresentados os personagens do quarteto, entram em cena os personagens
que farão o par romântico. Nos é apresentado um problema
a ser resolvido com o auxílio dos humoristas e, junto com ele,
antagonistas (comumente movidos pela ganância) que irão dificultar
a resolução da questão.
Conhecemos então
o menino Pedrinho que foge de casa por causa da pouca atenção
recebida do pai empresário (Edson Celulari); ele se junta à
trupe dos Trapalhões onde é recebido com todo o carinho
possível. Seu pai, muito arrependido de sua conduta, oferece uma
recompensa milionária para quem souber o paradeiro de seu filho.
Começa então uma fuga de Pedrinho e dos quatro Trapalhões
para driblar pessoas inescrupulosas interessadas no menino, e então
acontece a grande virada da história. O reencontro de Pedrinho
com seu pai e deste com Bonga. Temos a revelação de que
Bonga é avô de Pedrinho, pai do personagem de Edson Celulari
e, portanto, dono de uma fortuna inestimável. Afastado da sua família
verdadeira para poder se dedicar a questão das crianças,
Bonga só conhece seu neto por este fugir de casa e este encontro
é que propicia uma solução para o problema complexo
do abandono de crianças: com a fortuna que tem nas mãos
Bonga funda um grande espaço de acolhimento que chega a se confundir
com um parque de diversões.
O final feliz está
dado e Bonga pode voltar a sua vida simples de vagabundo junto com Louise
Cardoso. Um roteiro com muitas falhas e que se estrutura muito fortemente
na figura de "salvador da pátria" que Renato Aragão
costuma levar para seus personagens. O dinheiro aparece como uma solução
milagrosa e praticamente definitiva para a questão do abandono
de crianças. Este final feliz vem acompanhado também da
realização amorosa de pai de Pedrinho com sua professora
e também do vagabundo Bonga com sua parceira. Como na maioria dos
filmes, os outros três trapalhões somem da trama assim que
a instituição de crianças é criada.
Apesar de ser um filme
ingênuo e que de forma alguma dá conta de uma discussão
ampla de problemas de sociais (e, ainda,com alguns problemas narrativos),
Os Vagabundos Trapalhões tem o grande mérito de tocar
em um tema pouco presente e, até mesmo, arriscado para filmes comerciais,
principalmente quando é lançado como atrativo das férias
escolares. A grande bilheteria deste filme confirma o grande potencial
de comunicação com o público (através do humor
e do auxilio do poder televisivo), até mesmo no tratamento de questões
nacionais mais delicadas. É uma participação efetiva
do quarteto num projeto de cinema que vai além da mera diversão
e da atualização do cinema hegemônico.
Marina Meliande
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