Tudo Sobre Meu Pai,
de Even Benestad

Alt om min far, Noruega, 2001


Certamente este filme não tem circulado os festivais mudiais pelos seus méritos artísticos e sim pelos dois fatos peculiares sobre sua realização: primeiro o de ser sobre um homem heterosexual com uma família de dois filhos que gosta de se vestir como uma mulher; e segundo o de ser dirigido pelo filho deste mesmo personagem
. É o tipo de equação que garante matérias em jornal e espectadores curiosos. No entanto, se certamente existe uma malandragem por parte da programação dele em festivais, por outro lado é uma pena que se esteja perdendo de vista o principal: trata-se de um belo filme sobre o ser humano.

E isso acontece porque o diretor/filho não sucumbe às duas possibilidades mais canhestras que, certamente, levariam seu filme para o buraco: culpabilizar ou querer heroicizar seu pai. Ao longo do filme percebemos que, muito pelo contrário, o filme não passa de uma sincera e dolorida tentativa de entender o pai, algo que até então a família não havia conseguido. Mas, o mais interessante é que, ao final do mesmo, fica uma sincera dúvida se algo foi atingido neste departamento. No entanto, o que inegavelmente transpira do filme o tempo todo é um profundo respeito pelas opções incomuns do pai, e acima de tudo, amor, sem com isso eximi-lo de possíveis erros.

O outro fator essencial para o sucesso do filme como proposta é o fato do pai, personagem principal, ser uma figura cativante e cheia de empatia. Logo, logo, ele se torna muito mais do que uma personagem estranha e nos faz pensar em todas as idéias, desejos ou pensamentos incomuns que cada ser humano tem, mas que muitas vezes esconde ou sublima, e aqui não nos referimos apenas questões de gênero ou sexuais. O golpe que o diretor consegue dar para ganhar esta empatia do espectador está no encaminhamento narrativo da chamada "trama": ao começar com uma revisão de vida familiar, meio nostálgica (marcada por super-8 de família, etc), para então ir entrando no que torna esta família "diferente", quando chegamos ao fato em si o espectador já está do lado da simpatia dos personagens envolvidos. Além disso, as entrevistas são ótimas, e os discursos de cada parte muito engajantes.

Claramente nascido como uma sincera tentativa de ajuste de contas pessoal e familiar, termina conseguindo muito mais do que poderia imaginar e propôr. No caminho, aprendemos um pouco mais sobre as dualidades, complicações e maravilhosas contradições do tal ser humano, e pensando bem, o que mais devemos pedir de um filme?

Eduardo Valente