Sexo é uma Comédia,
d
e Catherine Breillat

Sex is comedy, França/Portugal, 2002


Freqüentemente os filmes de Catherine Breillat se propõe a relatar fatos relacionados a experiência da diretora. Em Sexo é uma Comédia isto se dá de forma ainda mais aberta, pois trata-se mesmo de uma dramatização das filmagens do seu filme anterior, Para Minha Irmã, com freqüentes referências que talvez só ficam claras a aqueles que o viram.

O que há de mais refrescante aqui está justamente na proposta de partir de uma experiência aparentemente complicada e dela extrair uma comédia. Breillat poderia se apresentar como uma artista sofredora que se vê frente a concessões que a obrigaram a abrir mão de sua visão, etc., mas pelo contrário é bastante irônica consigo mesma. Boa parte do humor do filme surge justamente do comportamento da diretora (Anne Parillaud) que parece esquizofrenicamente incapaz de manter a mesma opinião sobre qualquer assunto ou pessoa por mais que alguns minutos e se vê freqüentemente recorrendo a discursos que parecem grandes absurdos. Ela também parece impossível de se trabalhar com, e o filme não foge de mostrar o desespero de parte da equipe técnica e atores com as mudanças de última hora e o comportamento inconstante da diretora.

Todas as cenas do filme dentro do filme são recriadas plano a plano a partir de Para Minha Irmã e algumas delas parecem mesmo existir para o espectador que viu o filme anterior, a primeira, por exemplo, explica porque numa cena chave o casal se encontra sozinho numa praia de um grande balneário em plena alta estação. De qualquer forma, não há como saber o quanto das cenas de bastidores é real e o quanto é ficcionado, mas independente disso há de se admitir que Breillat conseguiu passar um grande senso de autenticidade, o que estamos vendo pode até ser quase todo inventado, mas é fácil comprá-lo como o set de filmagem de um filme de Catherine Breillat.

Sexo é Comédia também coloca em primeiro algo que estava implícito em muitos dos jogos sexuais de outros filmes da diretora: o central neles é um jogo de poder (em 36 Fillette, por exemplo, centrado na relação de uma menina de 14 anos e um playboy trintão, o espectador era obrigado plano a plano a repensar quem estava tirando proveito de quem). Aqui quase tudo gira entorno disso, especialmente a relação da diretora com seu ator principal (Gregoire Colin, ótimo).

Se Breillat consegue trabalhar suas obsessões num contexto mais cômico ainda assim fica a sensação de que o filme seria melhor caso tivesse mais densidade. Isto e um excesso de dependência do filme anterior (que pode fazer que uns se percam e outros se lembrem que aquele era bem superior) acabam jogando o resultado para baixo. Nada muito sério, Sexo é uma Comédia pode não ser um dos melhores filmes de Breillat, mas ainda é bem superior a Romance, o seu trabalho mais conhecido por aqui.

Filipe Furtado