Para Sempre Lilya,
de Lukas Moodysson

Lilja 4-Ever, Suécia/México, 2002


Lukas Moodysson sai do tom doce de seus filmes na Suécia para a árida história de uma adolescente russa abandonada pela família e destinada a uma vida de miséria até que descobre a hipótese da prostutição. Relegada a um inóspito cafofo pela tia malvada, sem nenhum dinheiro ou amigos a não ser um menino que se encontra diante dos mesmos problemas que ela (apanha dos pais, precisa sair de casa), ela tenta uma virada na vida e acaba sendo transformada a sua revelia em prostituta e escrava sexual na Suécia. Sobre En La Puta Vida, espécie de irmão-gêmeo uruguaio, Para Sempre Lilya leva algumas vantagens. Inicialmente pela caracterização da personagem principal, Lilya. Em se tratando de uma adolescente, seguimos com carinho o desamparo da moça de uma família pobre que é abandonada pela mãe (que vai para os Estados Unidos), mesmo que a maneira como o filme mostre as bruscas mudanças na vida da menina como uma montanha russa um pouco hilariante (seqüência por seqüência a mãe vai embora, a tia lhe apresenta o cafofo onde vai morar e lhe toma a casa, falta água e comida, a melhor amiga lhe passa a perna e a faz ser humilhada por todos os outros jovens do bairro...)

A segunda parte do filme é de longe a mais tocante e convincente. Tentando reconstruir aos poucos seu mundo com o que lhe resta, Moodysson prefere privilegiar não a humilhação que é a iniciação como prostituta, mas antes a felicidade da menina depois de conseguir dinheiro para sustentar sozinha a si e a seu amigo. Nesse momento, a atriz Oksana Akinshina, bonita e indefesa, cola no coração do espectador. A fase seguinte do filme quase desabona a segunda. Na boate, Lilya encontra um jovem sueco bem-sucedido que quer tirá-la da prostituição e arranjar-lhe um emprego em seu país, mas para isso ela deve deixar seu amigo, sob a promessa de vir buscá-lo depois. Em cima do muro, o filme não mostra nem o temor da menina pela opção que faz (afinal, estará tomando a mesma decisão que sua mãe, antes dela) nem recoloca a personagem em perspectiva de heroína trágica, que cede à hybris e prova as conseqüências dela. Jovem prostituída, sem qualquer documento de identidade num país desconhecido, sem qualquer um que lhe ajude (o namorado, conhecemos a história, "tornou-se" o assistente do chefe de uma funcional máquina de escravas sexuais). A partir daí a moça será estuprada, espancada, mas o filme permanece sempre sem assumir um ponto de vista subjetivo sobre o assunto (sou uma menina sem capacidade ainda de decisão, tenham pena de mim) ou objetivo (tomei minha decisão, escolhi errado, agora entendo minha mãe). Tentando captar das duas opções apenas o melhor que elas têm a dar, Para Sempre Lilya acaba redundando no drama barato, sem real dedicação a seu personagem ou a uma criação verossímil de ambiente.

Ruy Gardnier