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Performance, de Donald Cammel
Um projeto que nasceu como “o A Hard Day’s Night dos Rolling Stones” acabou sendo um dos mais radicais e agressivos filmes já feitos por uma grande produtora. Performance, dirigido por Donald Cammel (e creditado também a seu diretor de fotografia, Nicolas Roeg) permanece, mais de trinta anos depois de ter sido feito, um dos mais arrojados trabalhos jamais filmados na Grã-Bretanha. Tudo começou quando o roteiro The Performers, de Donald Cammel, foi aprovado pela Warner Bros britânica. Tendo como “passaporte” a presença de Mick Jagger no elenco, o projeto recebeu carta branca da direção da empresa, que deixou o diretor-roteirista-montador e o produtor Sandy Leiberson com total liberdade para fazer o que quisessem no set de filmagem. Toda essa liberalidade acabou na sessão do primeiro corte do filme para a diretoria da empresa: sustos, caras de nojo, e a mulher de um dos diretores vomitando foi o resultado à exposição a esse filme. Ninguém estava preparado para aquela celebração de decadência perpetrada por Cammel, Jagger e cia. Todos estavam esperando algo mais para Help que para Scorpio Rising, como foi entregue. A sanidade e os “standards” profissionais do produtor, assim como seu caráter, foram questionados, e Leiberson foi acusado de “alta traição”. Um dos executivos sugeriu que os negativos de Performance fossem queimados ali mesmo... O grande diferencial deste filme para tantos outros feitos em meio ao “swinging London” é o excepcional trabalho de montagem, feito por Cammel e Frank Mazzola. Cortes bruscos, flash backs e flash forwards, justaposições de tempo e espaço, associações não digeríveis à primeira vista, enfim um festival de fundamentos pouco comuns no cinema popular da época (e que continua raro fora do underground hoje em dia). A dupla “fraturou” a estrutura linear do filme, dando origem a um ritmo mais abstrato e emocional. Todo o tom já é dado na seqüência de abertura, que fica interpolando um foguete decolando, um carro correndo em uma auto-estrada e um casal fazendo amor ferozmente. Como nem sempre é claro o que está acontecendo na tela, Performance é um filme que se presta (e se beneficia) a mais de uma sessão. Provavelmente Performance é o cult movie mais literato da história. O roteiro do filme é inspirado em “Desespero”, de Vladimir Nabakov, com “toques” de “Uma antologia pessoal”, do escritor argentino Jorge Luis Borges. Identidades, dublês, gangsters, labirintos, quebra-cabeças estão colocados dentro do roteiro. A imagem de Borges chega a aparecer, em uma cena chave do filme. Claro, o filme enfrentou diversos problemas de censura em sua época. Foi proibido pela censura brasileira, passou com censura de filme pornográfico nos Estados Unidos, foi exibido inteiro em poucos lugares do mundo. Isso que a versão “liberada” pela Warner foi a quarta montagem, bastante “suavizada” em relação ao original, a ponto de Nicolas Roeg ter solicitado que seu nome fosse retirado dos créditos. Segundo as más línguas, boa parte desses cortes foram impostos pelos gangsters britânicos Kray Brothers, que se incomodaram por seu “mundo” ser exposto aos olhos do mundo. Assim como outros filmes de sua época (Os Demônios, Os Deuses Malditos), Performance é um filme maldito dos arquivos da Warner. Não está disponível em lugar nenhum do mundo em DVD. A fita disponível nos Estados Unidos (disponível via Amazon), pelo menos, está completa, com seus 105 minutos, ao contrário dos 102 anunciados na capa (e da censura ‘R’ proeminente na lombada).
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