AI
Inteligência Artificial,
de Steven Spielberg

AI,
Artificial Intelligence, EUA, 2001

Quem sabe o que
é ter e perder alguém?
No seu primeiro grande
sucesso a estourar nas rádios, Carmem Miranda cantava assim: "Taí
/ Eu fiz tudo pra você gostar de mim / Ó, meu bem, não
faz assim comigo não / Você tem, você tem, você
tem que me dar seu coração (...)". Dorival Caymmi,
mais tarde, compunha algo como "Ó insensato coração
/ Por que me fizeste sofrer? / Por que de amor para entender / É
preciso amar? / Por quê?(...)". Alguém aí
sabe controlar os próprios sentimentos?
* *
*
Mesmo que soe meio
besta lembrar isso: filmes são filmes, pessoas são pessoas
e não é regra constante que os primeiros estejam carnalmente
ligados aos outros. Aos seres humanos, assim como aos demais seres vivos,
a passagem de tempo tende a transformar, amadurecer para melhor ou para
pior segundo o critério de cada um. Podemos julgar um filme, talvez.
Podemos julgar uma pessoa? Se um filme passa por transformações
ao longo de sua duração, é preciso notar que, sendo
imensamente mais curto que a vida de uma pessoa, pode ter suas idéias
resumidas e julgadas de forma menos superficial e também menos
imprópria.
Devemos queimar AI?
Devemos queimar Steven Spielberg, como já se disse sobre Sade?
Uma resposta positiva a uma das questões me parece não implicar
obrigatoriamente em resposta igual para a outra, como notei no parágrafo
acima. Muita gente detesta AI, muita gente detesta só o
final do filme, muita gente detesta só a parte do Spielberg,
muita gente detesta, enfim, Steven Spielberg assim como não falta
quem seja fã e não se sinta bem em pôr em questão
este afeto. Podemos analisar e julgar o filme mais do que isso, é
realmente necessário analisar e julgar o filme, como produto singular
da nossa época (essa característica nem seus maiores detratores
lhe tiram). No entanto, podemos de fato julgar Spielberg?
Ok, nós podemos
antipatizar com o papel que sua figura assume e a que se presta em nosso
tempo e precisamos, inclusive, estar constantemente tomando posições
contrárias a esta figura, decerto. Muitos de nós com certeza
preferiríamos que ele resolvesse que seus filmes não precisam
ser vistos por todas as pessoas ao mesmo tempo e da forma mais lucrativa
possível, em detrimento de tantos outros no mundo inteiro, e que
seus filmes não mais farão parte de um movimento constante
de encarecimento do produto cinematográfico em prol de um fetiche
em torno dos efeitos e cuidados visuais. Preferiríamos, enfim,
que os filmes que dirige e os que produz não se prestassem mais
ao papel histórico (de uniformização americanizante
do pensar) a que vêm se prestando nas últimas décadas.
No entanto, é preciso notar que essa habitual confusão autoral
entre pessoas e seus filmes mesmo sendo absolutamente necessária
e saudável, sem sombra de dúvida, uma atitude de contrapartida
a esse rolo compressor tão representativo da grande indústria
hollywoodiana nos levará a perder de vista a discussão
mais interessante, a das idéias e dúvidas que o filme pode
provocar. O próprio filme, e não a figura pública
do autor. Alguns filmes merecem esse cuidado e AI é um
deles. Certamente AI ganha muito público, destaque, muitas
críticas e consegue render uma boa grana apenas por ser um filme
de Spielberg (como renderam filmes anteriores como Always, Hook
ou Amistad, alguns dos mais problemáticos em sua carreira)
e provavelmente isso pesará na avaliação de qualquer
espectador minimamente informado, para melhor ou para pior. Mas, por Tutatis,
AI não é só isso! Não merece essa obsessão
em identificar autores ainda piorada no caso por toda a importância
de Stanley Kubrick no projeto. Ver o filme como uma composição
entre Kubrick e Spielberg pode ter ajudado na bilheteria e pode ter servido
de assunto, a favor ou contra, para inúmeras críticas e
conversas de bar assim como pode ter sido uma diversão para muitos
identificar a qual autor cabia cada trecho do filme, sendo também
muito bacana identificar quem era representado por cada personagem. Na
verdade, mesmo sendo muito divertido querer descobrir o que é de
Kubrick e o que é de Spielberg, isso não é muito
mais que uma piada (ou golpe publicitário) banal e repetida à
exaustão. Por mais divertido que isso seja, é repetitivo
e pobre como um joguinho de computador o que o filme põe em questão
não é justamente que pode-se definir um sujeito apenas pela
possibilidade de ter sentimentos? Sendo assim, tentemos deixar o filme
nos despertar sentimentos por si só. AI é mais do
que isso. Sua história é muito mais rica em idéias,
questões, tramas, personagens e climas do que faz crer essa rudeza
interpretativa. Pelos problemas que coloca e também pelos problemas
de todo tipo que tem, só se pode dizer que é brilhante.
Único, one of a kind, como se diz do protagonista.
Deve-se queimar? O
filme se defende no tom que tem, o do exaustivo (quase insuportável)
lamento do robô-criança David: "Não me queimem!
Eu não sou Pinóquio!" é o que ele grita
num certo momento.
* *
*
Certo, livremo-nos
dos autores e falemos do filme, de seus imensos problemas e interesses,
antes que seja tarde demais!
É um conto-de-fadas
doentio e sintomático, que relê a história de Pinóquio,
com paralelos evidentes ainda com Frankenstein e com o homem-de-lata do
Mágico de Oz (e até com o herói dos gibis
Visão, por que não?). O protagonista é David, um
robô-criança, o primeiro de uma série capaz de ter
um amor programado por uma pessoa no caso de David, sua pretensa "mãe".
Ela não é sua mãe, e qualquer sentimento (principalmente
o mais nobre, o amor) não pode ser comparado a um programa de computador
e esse é só o primeiro dos furos da trama. Mas, aí
é que está o ponto singular de AI: o enredo é
escrachadamente cheio de furos, como poucas fábulas tiveram um
dia a cara-de-pau de ser, mas não é a verossimilhança
que faz valer uma fábula é sua regra ética, é
aquilo que ela pretende demonstrar através de sua história.
E o que torna o filme mais contraditório é que esta fábula
tão complicada indica em vários momentos simplesmente não
estar segura do que pretende dizer. AI não se constrói
sobre certezas ao contrário, provoca dúvidas e questionamentos
do início ao fim. Sua moral da história é
ambígua, provavelmente porque a narrativa explicita uma fragilidade
imensa e confessa do narrador que nos identifica com um robô com
sentimentos que logo se tornará obsessivo por uma figura e por
uma vivência que nunca teve, que mais tarde irá destruir
alguém igual a si e, logo depois, tentará se suicidar. Este
é David, o menino-robô.
Falei em fábula?
Mais adequado será o termo usado lá em cima: Conto-de-fadas.
Que, ao contrário da fábula, pressupõe absoluta identificação
com um protagonista necessariamente problemático e uma resolução
através da chegada de um Deus Ex Machina, uma figura poderosa capaz
de restaurar a justiça e realizar os desejos buscados pelo herói.
* *
*
Comentei ali em cima
que o enredo é cheio de furos, mas é preciso notar que estes
furos são muito mais evidentes e complicados na primeira e na segunda
parte do que no epílogo, ao contrário do que se comentou
em geral na recepção ao filme. De fato, o epílogo
foi bastante mal-recebido por alguns, por conta do surgimento dos super-robôs
após uma elipse de dois mil anos. Se o recurso dos Deus Ex Machina
sempre incomodou platéias diversas, no caso isso se intensifica
por conta da imensa passagem de tempo. Mas, oras, Deus Ex Machina é
assim, não adianta chiar diante das suas regras de verossimilhança
ou vamos reclamar também com os encenadores de Ésquilo.
E, uma vez surgidos os robôs super-sábios, não há
grandes absurdos dali em diante. Bem, certo, há sim, há
os cabelos da mãe que o ursinho Teddy guardou por tanto tempo
mais do que dois mil anos, ele os guardou o filme inteiro! e também
aquele delírio de recuperar a memória de seres mortos, coroado
pela idéia de que os seres clonados só viveriam um único
dia. Mas, oras, nesse momento já está mais do que claro
que a trama caminha em busca de sua moral, de sua justificativa.
E o que dizer dos absurdos que se sucedem até então?
Deixando para analisar
à frente certos absurdos que são utilizados para suscitar
questões ao espectador, enumeremos algumas inverossimilhanças
usadas apenas para dar prosseguimento à trama: Por que Teddy guarda
o cabelo da mãe? Se foi Henry que se responsabilizou por David
diante da Cybertronics, por que não é ele quem leva o robô
de volta para ser destruído? Se entre os robôs apenas David
pode amar, por que Teddy e Gigolo Joe o ajudam? (Na verdade, cabe notar
que todos os robôs, em maior ou menor escala, são claramente
humanizados, o que, ok, pode provocar algumas idéias acerca do
que representam os robôs). E como a companhia podia rastrear tão
rapidamente o robôzinho que tão logo ele acaba de ser atendido
pelo Dr. Know já há um helicóptero à sua disposição
e alguns policiais dispostos a fazer um teatrinho para que ele possa escapar?
Aliás, como é que eles conseguem decifrar aquele enigma
do "fim do mundo" e dos "leões que choram"
com tanta rapidez e certeza? E o que dizer do momento em que Gigolo Joe
é preso pela polícia, em pleno prédio da Cybertronics
e ninguém da companhia vê o que está se passando,
de forma tão fabulesca que em seguida David embrenha-se pelo fundo
do oceano tendo somente Teddy como companhia? E onde estava então
o interesse que ele teria despertado até então na empresa,
sabe-se lá por quê? Enfim, indo por este caminho logo chegaremos
à implausibilidade básica de filmes com robôs: como
é que esses troços se mantêm em funcionamento? Por
que será que todo robô de filme de ficção funciona
como um moto-contínuo, sem precisar de qualquer espécie
de energia a se recarregar?
Ok, não vamos
estragar o prazer de ver filmes com robôs eles funcionam e pronto,
ora bolas! O que importa é onde essa história toda quer
chegar. AI, sendo plenamente consciente de todas as suas forçadas
de barra, traz a nós uma série de idéias capazes
de embatucar qualquer um.
* *
*
E quais são
essas idéias, então? Bem, David não controla os seus
sentimentos e a sua obsessão, e essa é com certeza a chave
central do filme. Há uma certa sugestão dada pela trama,
mas que o filme passa à margem: e se o amor fosse por uma amante,
e não por uma mãe? Como a tecnologia já permitia
programar sentimentos, por que não fazer Gigolo Joes com coração
de David? O filme foge da confusão entre amor e desejo, mas sigamos
com a dúvida: e aí, o que aconteceria? Diga-me, leitor,
o que aconteceria se você tivesse um robô eternamente atrás
de si, obcecado em lhe deixar feliz e satisfeito, sempre dependente de
carinho? É possível tal relação? E o que aconteceria
então? É o que é lembrado logo no início por
uma cientista e se o ser humano que programou o robô para lhe
amar um dia mudar de idéia? Vale lembrar o dito do Pequeno Príncipe
de Saint-Exupéry, cada um se torna definitivamente responsável
por aquilo que cativa. Bem, talvez o dito de Exupéry esteja fora
de moda e possa ser posto em questão mas não é
ainda uma regra ética válida se trocarmos "cativar"
por "criar"? Ou alguém dirá que não somos
responsáveis nem ao menos pelo que criamos?
E como reage o criador
quando questionado pela sua colega cientista? Compara a situação
com a criação de Adão pelo Deus cristão! E
como reage diante do sofrimento de sua criação, quando David
enfim o encontra? Lava as mãos, relembra seu filho perdido, seu
mundo pessoal e seu sonho psicótico. Seus robôs? São
apenas robôs, no fim das contas. Mas eles amam! O que mais define
um sujeito além de suas paixões? Alma? Ainda é possível
acreditar em alma, em espírito? AI talvez seja isso, um
filme possível sobre a alma (cinema da alma, como se dizia antigamente),
numa época que não sabe mais o que define uma "alma"
e em que as pessoas nem sabem mesmo se ainda podem crer na existência
dela.
O Professor Hobby,
o criador de David, é de um desinteresse impressionante diante
do sofrimento de sua criatura é pior que mais silencioso dos
Deuses dos piores pesadelos de Ingmar Bergman! David que se arranje, ele
que continue a procurar sua tão sonhada Fada Azul, porque, no que
depender do seu criador, ele está frito. E não custa lembrar
o que David descobre em sua absurda visita à Cybertronics e ao
seu criador: ele não é único, é só
o primeiro de uma série (the first of a kind) podemos
imaginar todos os outros meninos-robôs tendo toda sorte de problemas
possíveis! E ainda disseram que o narrador se identifica com o
inventor então, que narrador louco tem este filme, por Tutatis!
* *
*
Mas não é
com a sorte do professor Hobby que as platéias se preocupam, é
com David, o menino-robô. Talvez, como já se disse por aí,
pudéssemos nos despreocupar do drama do garoto já que
ele não é um garoto, é um robô, e seu sentimento
não é um sentimento, é um programa de computador.
Por que iremos nos preocupar com o destino de um robô a quem não
cabia mais do que ser destruído? Bem, com isso descartamos então
qualquer drama vivido por inumanos, incluído os já citados
Pinóquio e Frankenstein, mas cada um escolhe sua opção
de entender ou não uma história. Igualmente, muito se falou
de um certo aspecto doentio das platéias em se identificar (?)
com o menino-robô, com suas falhas de caráter e sua ladainha
interminável em busca de se tornar humano e de ter sua mamãezinha
de volta. Ora, mas então às boas histórias só
cabem protagonistas heróicos ou exemplares? David é um anti-herói,
uma figura problemática que nos põe em questão
se um dia o sujeito de uma peça precisava matar o pai para ser
rei e casar com a mãe-mulher para procriar, e se um dia o sujeito
de outra peça descobria que tinha perdido seu lugar no mundo porque
seu tio já tinha feito tudo isso, agora temos um sujeito que nem
se reconhece como sujeito, que vive num mundo que não é
dele, criado por gente diferente dele, que busca um amor que nunca teve,
uma mãe que nunca o gerou e que lhe parece inatingível,
num sentimento que só existe porque ele o afirma e ele só
se define pelo sentimento que tem. Num mundo sem alma, o que nos constrói
é nosso afeto, é o que amamos e o que buscamos é
o que parece nos tornar essencialmente diferentes uns dos outros. E assim
é David: ao encontrar um robô absolutamente idêntico
a si, ele o destrói de forma violenta. Mais do que apenas denunciar
a fragilidade do caráter do personagem, a cena evidencia que é
apenas seu afeto o que o robô percebe torná-lo único:
quando arranca a cabeça do seu igual, o menino grita, pensando
na mãe: "Você não pode tê-la, ela é
minha mãe! Eu sou David!". Ao se descobrir idêntico
a uma série de robôs, sente que seu sentimento não
é único, que ele é apenas um entre muitos, sem nada
que o torne especial e em seguida vai tentar se suicidar. A princípio
isso parece remeter a uma crise da adolescência, mas é mais
do que isso se ele for salvo, voltará à questão
interminável. Talvez então AI mostre como é
doentio encarar um sentimento de forma estanque, como um robô
mas talvez isso não seja tão inimaginável em seres
humanos por falar em cinema, alguém aí gosta de A História
de Adèle H, do Truffaut?
* *
*
Já escrevi
acima que, ao contrário de um conto-de-fadas típico, AI
não se constrói sobre a certeza de uma regra moral que se
explicitará ao fim da história. Diferentemente da larga
maioria do que se produz em cinema (e diferentemente de todos os demais
filmes assinados por Steven Spielberg), AI se constrói sobre
dúvidas, medos e insegurança e suscita mais questões
do que certezas. No entanto, há sim uma certa regra, uma determinada
ética, que o filme postula em seu final e é essa regra
que parece buscar o narrador quando inventa uma elipse de dois mil anos
e o surgimento de super-robôs capazes de realizar de uma determinada
forma o desejo de David. Têm eles a chance de proporcionar a
David alguns instantes em que seu sonho se realiza, em que ele pode ter
sua mãe de volta, só para si tendo de volta uma vivência
que, a rigor, ele nunca teve. Então, tendo a oportunidade de moldar
a realidade de acordo com sues desejos e sentimentos, David pode enfim
viver alguns instantes com sua mãe amada, ter ela só
para si, num mundo em que "não há Martin, não
há Henry" (filho e marido de sua mãe), um mundo,
enfim, sem uma realidade que possa roubar a atenção da pessoa
amada. Esse sonho deixa mais evidente do que nunca como o sentimento
e a carência de David se tornaram doentios e ele pode enfim perceber
como a vivência dos sentimentos tem sua hora e sua vez, pode perceber
que a obsessão por um sentimento passado é mórbida,
que, mesmo que seja possível reviver este sentimento como num sonho,
a mera reprodução desse desejo será morta, automática,
insatisfatória. Quando vive seu dia único com sua mãe,
David percebe que aquele sonho que ele tinha de ter de volta a pessoa
amada não faz mais sentido porque a pessoa amada não é
mais a mesma, porque a realidade mudou, porque seu sonho , mesmo virando
fato, não é real como ele gostaria que fosse não
é a mesma coisa. Porque sentimentos e afetos devem ser vividos,
e não idealizados e sonhados. Percebendo isso, o menino se transforma
e pode se ver livre do mundo idealizado que o atormentava como um fantasma.
Seu afeto se destinava a um passado morto, do qual ele enfim se torna
livre. É difícil aceitar a perda? É, mas seja bem-vindo
ao mundo real: viver também é isso. E é aceitando
isso que se pode viver.
* *
*
Não é
fácil amar AI. Como seu protagonista, o filme parece ser
um interminável novelo em torno de uma ladainha constante de falta
de amor. Além disso, não são raros os momentos em
que o narrador parece apelar para os truques sentimentalóides mais
óbvios ou forçados. Para confundir ainda mais as coisa,
AI ao contrário do menino-robô e a despeito de todos
seus artifícios encantadores não tem nenhuma preocupação
em satisfazer o espectador e impedir qualquer frustração
da parte dele. Ao contrário, temos no filme alguns dos momentos
de maior amargura e fragilidade do protagonista feitos no cinema americano
como no momento da sua tentativa de suicídio ou no instante em
que a estátua que lhe parecia ser sua redentora Fada Azul se estilhaça
diante do seu toque. No entanto, AI traz a quem o assiste de olhos
bem abertos a possibilidade de se reconhecer instável, inseguro
e problemático sem trazer qualquer espécie de conforto,
mas também sem julgar arrogantemente essa fragilidade. Quem sabe
o que é ter e perder alguém, perder da maneira que for?
Querer de volta e viver constantemente com esse fantasma? O leitor que
se identificar com isso, por um instante que seja, levante a mão
por favor.
Se for o seu caso,
fica a sugestão: (re) veja o filme. Não é perfeito.
É impressionante.
* *
*
Ainda vivemos sob
a sombra do mito da alma-gêmea, daquele mito tão bem expressado
por Aristófanes no Banquete de Platão aquela fábula
cômica sobre um tempo em que os humanos eram todos compostos de
corpos duplos (com quatro pernas, braços, olhos) que, por um acidente,
se dividiram em dois e nos tornaram como somos: com dois braços,
duas pernas, dois olhos e um coração só inseguro
e inconstante. Eis a que nos pode levar essa "alma-gêmea",
esse autêntico fantasma de filme de horror alguém aí
quer ser como David? Não, há sempre outro caminho é
preciso parar de ter medo diante da idéia de andarmos com nossas
próprias pernas. Para continuar a viver.
* *
*
Já que começamos
com letra de música, vamos terminar com letra de música.
Cantava Luiz Gonzaga, numa canção que fez com o parceiro
Humberto Teixeira : "Se a gente lembra só por lembrar /
do amor que a gente um dia viveu / saudade inté que assim é
bom / prum cabra se convencer / que é feliz sem saber / pois não
sofreu // porém se a gente vive a sonhar / com o amor que a gente
um dia perdeu / saudade intonce assim é ruim / eu digo isso por
mim / que vivo doido a sofrer".
É isso aí.
Aprendamos com os erros do poeta, então.
Daniel Caetano
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