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"Espíritos
teimosos insistem em falar em erro, pois ainda não compreenderam
que o único erro fatal é não existir". Nas entrelinhas do CN nasceu e progrediu em João Pessoa um ciclo cinematografico fundado exclusivamente sobre o curta-metragem. Os nomes que o ciclo paraibano encerra não são poucos, e, não fôra o pouco cosmopolitismo de João Pessoa, aqueles jovens idealistas já estariam comprometidos na realização de filmes longos. Digo "pouco cosmopolitismo" nao porque queira menosprezar o sentimento de província que se acentua mais e mais fora do Rio de Janeiro e, de certa forma, de S. Paulo, porém, acredito que a qualidade de província tenha trazido àqueles cinéfilos um retraimento necessário e um desejo simpático de começar pelo aprendizado prático que é o grande mérito do curta-metragem. Tive e ainda tenho a preocupação básica de localizar a causa específica do nascimento desse surto cinematográfico em João Pessoa. Em princípio, João Ramiro Mello, realizador e ex-critico de cinema de A Tribuna do Povo, jornal da capital paraibana, não traçou um retrospecto de modo a facilitar a tarefa. Segundo ele o movimento nasceu como reflexo da ida de Alberto Cavalcanti a Recife em 1953, onde e quando rodou O Canto do Mar. E continua, dizendo: ‘‘Não existe grupo, mas uma mentalidade que eclodiu definitivamente em 1953 com a fundação do cine-clube João Pessoa, pelo padre Antonio Fragoso (hoje bispo do Maranhão). Segundo pude apurar, faziam parte do cine-clube nomes como os de José Rafael Menezes (autor de Caminhos do Cinema — Ed. Agir), Willis Leal (autor de Introdução à Problemática do Cinema, ao que parece ainda inédito), Geraldo Carvalho, Antônio Lins Rolim, Milton Veloso, Linduarte Noronha, Wladimir Carvalho e Jurandy Barroso, entre outros. Hiavia, inclusive, o típico clima conservador contra as modernidades que o cinema trazia e isso impediu o pleno florescimento de uma cultura cinematográfica. O próprio João Ramiro só pôde ir ao cinema pela primeira vez aos quinze anos em virtude da forte oposição paterna cujo lema ‘‘cinema é imoralidade" foi derrubado através de muita insistência. Nesta época, João Ramiro já lia, no Diário de Pernambuco, a coluna cinematográfica de José de Souza Alencar, crítico e ex-assistente de Cavalcanti em O Canto do Mar. Em 1955 João Ramiro assumiu a direçao do cine-clube e resolveu dinamizá-lo criando um pequeno departamento de produção que promoveu a realização e a exibicão do documentário em 16 mm, Cabo Branco. Em 1956 o cine-clube fechou e o grupo se refugiou na critica. O sonho documentarista, porém, continuou Linduarte Noronha, Wladimir Carvalho, João Ramiro... Na Faculdade de Filosofia João Ramiro lia Anhembi, revista intelectual paulista, e soube através dela que o Banco do Estado de São Paulo financiava (Cr$300.000) a produção de documentários e chamou Linduarte e Wladimir. O esquema de A ruanda nasceu, porém, sob outra estrutura. O INCE (Instituto Nacional de Cinema Educativo) cedeu-lhes uma câmera (Bell & Howell-Eyemo), tipo reportagem e os trabalhos de laboratório. O sociólogo Odilon Ribeiro Coutinho contribuiu com a película virgem e o Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais do Recife lhes adiantou cem mil cruzeiros. O roteiro original de Linduarte Noronha chamava-se Talhado, a Cidadela do Barro e sofreu modificações. Linduarte Noronha teve Rucker Vieira como fotógrafo e João Ramiro como assistente. Trabalho eminentemente pessoal, Aruanda reflete o primitivismo dos meios e das concepções cinematográficas nascentes no ciclo paraibano. Meu primeiro contato com Linduarte Noronha se deu na 1ª Convenção Nacional da Crítica Cinematográfica em S. Paulo, onde foi estreada nacionalmente sua fita. Foi um contato rápido e anônimo. Minhas preocupações, na época, tenderam para o trabalho exaustivo que deveria ter assolado a Linduarte naquela realização e sobretudo o acúmulo de suas funções, pois a própria narração da fita foi feita pelo realizador. A equipe dividiu-se a partir de Aruanda. João Ramiro e Wladimir Carvalho escreveram Romeiros da Guia que contou com o auxilio integral do INCE. Isso se deu no começo de 1962. Por seu lado Linduarte Noronha realizava um média-metragem sohre O Cajueiro Nordestino. Os filmes do ciclo paraibano foram exibidos para seu público com enorme sucesso em sessões especiais. Volta e meia, Aruanda é mostrado na Universidade e nas Escolas. É muito violento o impacto cultural que apresenta, refletindo o Brasil e certos compartimentos estanques que contém. |
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