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Porco
Rosso,
de Hayao Myazaki

Kurenai
no buta, Japão, 1992
Porco Rosso
é descrito por seu criador como "um filme para homens cansados
de meia-idade". Originalmente concebido como um média-metragem
para exibição em vôos da Japan Airlines, Porco conta
a história de Marco, um herói italiano da Primeira Guerra
Mundial que abandona a carreira militar com a escalada do fascismo. Agindo
como um mercenário caçador de recompensas no Mediterrâneo,
Marco combate gangues de piratas aviadores, por amor à aventura
e em busca de riqueza.
Acontece que Marco
é um porco. Uma espécie de porco gigante que fala. Ficamos
sabendo ao longo do filme que Marco passou por algum tipo de transformação
mágica -- não sabemos as razões, causas ou circunstâncias
do fenômeno.
Miyazaki é
chamado por alguns de "Disney japonês", título que não
lhe agrada. Com razão. A caracterização de seu porco
humanizado não encontra antecedentes nos desenhos da Disney e obedece
a questões muito particulares da cultura oriental. O estranhamento
é um dado trabalhado na narrativa, sendo motivo para a retomada
eternamente adiada de um antigo romance (pressupomos que o retorno à
forma original humana é a única possibilidade do reencontro
de Marco e Gina, proprietária de um hotel na costa do Mediterrâneo)
ou marca de sua condição marginal ("prefiro ser porco a
fascista", diz o protagonista enquanto assiste escondido a uma parada
fascista). Em alguns momentos podemos nos surpreender com o fato de que
este ser mágico apresenta uma sexualidade madura e bem definida.
Miyazaki parece se
interessar mais por um painel de época do que por uma narrativa
convencional (embora haja um rigor clássico na condução
da história), como demonstra a longa sequência em que um
grupo de mulheres, familiares de militares fascistas, reforma seu hidroavião.
O fato de nunca trabalhar com um roteiro pode ser uma causa, embora Porco
Rosso seja baseado num mangá de sua autoria, Hikoutei Jidai,
uma série de aquarelas de quinze páginas publicadas em 1989
(algumas dessas aquarelas podem ser vistas nos créditos finais).
Nascido em uma família que fabricava material de aviação,
Miyazaki sempre foi um apaixonado por aviões, a ponto de batizar
sua produtora com o nome de um (Ghiblin, vento do deserto, era o nome
de um avião de combate usado em treinamento do exército
italiano na II Guerra). A atenção que dedica aos detalhes
estruturais dos hidroaviões só é superada pelo cuidado
dedicado à construção das sequências de combate
aéreo.
São estas sequências,
com uso extremo de movimentos de câmera visualmente deslumbrantes,
que demonstram toda a beleza do cinema de Miyazaki. Acompanhadas da música
do excepcional Joe Hisaishi, estas cenas são puro deleite cinematográfico.
Se por fim Porco
Rosso não serve como uma introdução ideal ao
cinema de Miyazaki, devido ao seu caráter extremamente pessoal,
é uma obra que satisfaz enormemente seus fãs.
Fernando Verissimo
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