Cartas dos leitores


Sobre a projeção do UCI

Enviamos para o email de contato da rede UCI carioca o artigo publicado no Plano Geral sob o título UCI - Entre o céu e o inferno, no qual tecíamos elogios e reclamações sobre as salas de cinema. Do mesmo jeito que reclamamos e reclamaremos sempre que acharmos necessário, é vital darmos a mesma atenção quando nos julgamos corretamente tratados. Por isso, precisamos registrar aqui que o diretor-presidente da UCI Cinemas José Carlos Oliveira não apenas respondeu pessoalmente ao nosso email (o que sempre poderia ser contestado, como algo escrito em nome dele), como entrou em contato pelo telefone para conversar sobre o conteúdo do artigo.

Sempre no clima mais atencioso e amistoso, o que mais surpreendeu agradavelmente no diretor foi poder ver seu indisfarçável carinho pelo ato de ir ao cinema. Isso ficou claro na sua confissão de ter realizado uma "cabine" pessoal de Apocalypse Now Redux na maior sala do UCI carioca, antes da estréia do filme, apenas para poder assistir o filme no cinema. Qualquer cinéfilo se identifica com o impulso e o prazer de se ver um filme como este no cinema, sozinho. Já que José Carlos tem acesso a este brinquedo de luxo, parabéns para ele, de verdade. Tomara que nos convite para a próxima... (risos meus)

De resto, o diretor conversou sobre o problema da abertura das portas antes do fim dos filmes e do acendimento dos holofotes (aquilo não são luzes...) sobre a tela durante os créditos. Afirmou serem erros de conduta que não devem se repetir, porque trata-se de uma "otimização desnecessária" do trabalho, que acaba com o clima de se ver um filme. Que um executivo de exibição se mostre sensível a algo tão pouco prático e lucrativo como a noção de "clima" mostrou porque o UCI tem a melhor projeção do Rio.

Conversamos longamente ainda sobre o problema da projeção de um filme com a janela inadequada, levando ao visionamento de refletores e microfones em cena. O diretor mostrou mais uma vez conhecimento dos detalhes de projeção, e nos esclareceu (o que é tecnicamente plausível) que o problema no caso era da legendagem do filme que impedia que ele fosse projetado corretamente sem prejuízo às legendas. Assim, era uma opção dura: ou microfones com legendas corretas ou projeção na janela certa com legendas cortadas. Ele ponderou que as legendas seriam fruto de muito mais problemas com o público, mas reconheceu que era grave a falha com relação ao filme.

Da mesma forma conversamos longamente sobre o comportamento da platéia nos cinemas (especialmente público jovem), e o diretor mostrou-se atento e estudioso da questão, citando inclusive teorias e pesquisas sobre percepção e nível de atenção, muito interessantes. Citou ainda as campanhas que têm sido realizadas pelo cinema com vinhetas que imitam trailers de filmes estrangeiros com o intuito de pedir que não sujem as salas ou desliguem os celulares, e disse que uma das próximas será sobre conversas durante o filme. Estes filminhos (os hilariantes Dirty Crime e Forever Passion) são realmente interessantes, embora eu mesmo duvidasse muito de sua eficácia, mas José Carlos mencionou estatísticas sobre o lixo nas salas que parecem provar sua utilidade. Confesso que quando ele falou que o público não percebia que eram filmes brasileiros eu fiquei meio constrangido de dizer que sempre achei que eles eram propositadamente cômicos, quase chanchadescos (o diálogo "Why you wear sunglasses at night?"/ "To not see too much shit" de Dirty Crime é impagável e inesquecível), e que já se tornaram cults pessoais na minha ida ao UCI. Mas, se funcionam e as pessoas levam a sério, tanto melhor.

Em suma, precisávamos registrar esta longa conversa porque ela surpreende vários mitos da exibição (verdadeiros em tantas outras cadeias). Quem jamais podia imaginar um diretor-presidente ligando para os representantes de um pequenino site, discutindo detalhes técnicos da projeção, o "clima" e emoção de assistir um filme, teorias da percepção da platéia. Mostrou que mesmo que o UCI se igualasse aos outros cinemas, no mínimo na parte de marketing ele já está anos-luz à frente.

Diretor José Carlos, abre um mais perto do que a Barra, vai. E me desculpe se eu torço pelo fim das férias e pelos dias de semana, porque o UCI é uma maravilha de projeção, mas vazio fica bem melhor...

Eduardo Valente