Scratch,
de Doug Pray
Scratch, EUA, 2001
É claro que,
assim como acontece com os filmes de ficção, existe um número
grande de maneiras de julgar o sucesso de um documentário. No geral,
porém, podemos nos ater a um número menor de "regras básicas"
quando tentamos avaliá-los. Por exemplo: ineditismo do tema, adequação
estética e narrativa ao tema, pesquisa e exposição
de imagens relevantes, capacidade investigativa, etc. No entanto, os documentários,
como acontece bastante também com as comédias, costumam
ser subestimados (a não ser em casos excepcionais como o de Promessas
de um Novo Mundo dentro do próprio Festival, devido a seu tema).
Geralmente se passa por cima destes critérios básicos, como
se documentar ou fazer rir fossem tarefas menos nobres, e fáceis.
Muito disso tem a ver com o excesso de documentários e jornalísticos
na TV, que quebram um pouco a fascinação de se assistir
a um filme do gênero.
Mas, nada disso deve
servir para, neste caso, nos desviar do que é o principal: Scratch
é um belíssimo documentário. Sua maior qualidade
é conseguir pegar um tema que num primeiro olhar parece menor e
limitado, e expandir as fronteiras de significação que este
possa ter. Em todas as categorias acima o filme passaria com louvor. Ao
falar do surgimento de um estilo em si (os DJs e o scratch, que
nada mais é do que aquele ato de manusear um LP, arranhando-o com
a agulha e produzindo um som característico), acaba explicando
toda uma série de situações sociais e culturais dos
anos 70 até a atualidade. Boa parte de sua qualidade vem da seriedade
da pesquisa histórica, seja de imagens, seja de entrevistados.
O filme tem muito pouco de "ouvir dizer", vai a fundo em tudo que busca
passar. A contextualização histórica é conduzida
de forma inteligente, fazendo com que o mais indiferente espectador se
interesse pelo assunto.
E, uma vez conseguido
isso, o filme embarca num outro método clássico do documentário:
o de criar personagens constantes cujas vozes passamos a ouvir, e com
eles nos identificar. Esta "face humana" é importantíssima,
pois esquenta as informações, mesmo as mais burocráticas.
O resto fica por conta do tema em si, porque inegavelmente ele dá
espaço para personagens, cenas e depoimentos altamente energéticos,
cheios de vida e de paixão. A montagem é inteligente ao
se mesclar ao estilo do seu assunto, sem no entanto cair na armadilha
de querer aparecer mais do que ele, o que muitos documentaristas costumam
fazer.
Em suma, o segredo
da coisa toda é fazer com que conseguir montar este painel pareça
uma coisa simples, quase natural. Sabemos muito bem que não é
assim, por isso mesmo, palmas para Doug Pray e equipe, que fazem um trabalho
de primeira.
Eduardo Valente
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