Quem És Tu?,
de João Botelho


Quem és tu?, Portugal, 2001

Exercício de teatro filmado, Quem és tu? encanta logo de início pela forma não-naturalista com que o enredo é apresentado, lançado na tela. Todo filmado em cenários teatralizados, o filme por vezes remete ao trabalho de Manoel de Oliveira (em seu Inquietude) ou ao cinema antinaturalista apresentado por Julio Bressane em filmes como São Jerônimo.

Aqui, porém, ao contar a história da maldição que cerca a família de Dom João VI após seu desaparecimento em batalha, Botelho se alonga demais e faz um cinema por demais hermético para um espectador desavisado. Se no início há um jogo de representações de batalhas e acontecimentos históricos que encantam por suas imagens de síntese teatralizadas, em um segundo momento, a narrativa se torna arrastada e desestimulante. Enquanto na primeira hora do filme temos uma sucessão de cenários e locações curiosíssimas que vão estabelecendo o aspecto não-ilusionista do filme, na segunda hora ficamos por demais presos a algumas poucas locações internas – tão mais palpáveis quanto menos interessantes.

O texto arrastado, apesar das belas falas, adaptada de Frei Luís de Souza de A. Garret, se torna previsível demais para manter o interesse do espectador pelos últimos 30 minutos de projeção. Uma grande pena pois, se tivesse mantido o vigor de suas primeiras seqüências narradas em off, talvez tivéssemos em Quem és tu? um belo retrato representacional do imaginário português do séc. XVI. Uma proposta interessantíssima de cinema teatralizado/ teatro encinemado, mas que já encontrou representantes extremamente mais felizes em outras ocasiões.

No mais, é questão de observar a delicada direção artística do filme em sua tentativa, por vezes feliz, por outras, ineficaz, de fazer da representação de Quem és tu? um reflexo dos tempos sombrios e duvidosos da Portugal daqueles dias. Um filme que merece atenção, mas que requer, também, muito interesse e preparo físico para suas quase duas horas de projeção.

Felipe Bragança