Eu Sou o Irmão de Josh Polonski,
de Raphael Nadjari


I Am Josh Polonski's Brother, EUA, 2000

O filme começa com o almoço de uma família judaica. A câmera se perde, se movimenta pela mesa, pelas conversas e pelos rostos tentando procurar alguma coisa, um olhar oblíquo, um gesto destoante...sem sucesso. Nada que pareça atrapalhar a vida dos Polonski, comerciantes de tecido em Nova York, uma família judia muito coesa e, a se supor pela cena inicial, sem qualquer problema possível. Filmado em câmera super-8, Eu Sou o Irmão de Josh Polonski aproveita-se da precariedade das imagens e da mais freqüente utilização do formato – filmes familiares – para fazer um filme decididamente menor, um relato pessoal, uma espécie de "aproximação" à família Polonski, aos códigos de valores embutidos daquele mundo tão aparentemente fechado em si mesmo.

É quando algo acontece e muda esse mundo que o filme de fato começa. Logo depois dos créditos, Josh é assassinado na rua, em frente à loja de tecidos dirigida pelos três irmãos (além de Josh, Ben e Abe). Daí para frente, Eu Sou o Irmão de Josh Polonski será o desmoronamento progressivo dos códigos da família judaica, e seu vetor será Abe, o irmão que estava do lado de Josh no momento da morte. De uma hora para outra, ele não parece entender mais o mundo em que vive, não consegue mais achar um solo abaixo dos pés, passa a se mover num outro mundo, precisa abrir-se para o mundo que está lá fora. E esse mundo será justamente aquele que colocou em perigo o irmão Josh. Com o pretexto de afundar-se na barra-pesada novaiorquina para entender a fascinação do irmão e descobrir seu assassino, Abe mergulha naquele universo de forma quase suicida, como se fosse a sua última chance de salvação. Isso tudo é intensificado pela impressionante interpretação de Richard Edson – Daunbailó –, que faz de Abe Polonski um ser quase autista, com uma fala calma, poucos movimentos, e um olhar incrivelmente vazio, bestificado.

Abe acaba apaixonando-se por Jill, uma prostituta muito cara. Passa a ter que pedir dinheiro diariamente a Ben, que torna-se o único irmão a cuidar da loja e da família. Quando o dinheiro não aparece mais, ele terá que tomar uma decisão extrema que só piorará sua situação: indignado ao mesmo tempo que fascinado pelo mundo de pecados e perdição que freqüenta, ele abre o jogo a Jill, diz que é irmão de Josh (daí o título do filme), ao que é jogado imediatamente para fora do quarto. Alucinado, dirige-se ao cafetão dela para libertá-la daquele mundo. Como em Eyes Wide Shut, um ideal de pureza eclipsa o mundo do personagem principal. Quando Abe recebe a notícia que Jill está livre, que ela não é prisioneira de ninguém, ele colapsa e é espancado. O uso do super-8 não é em Eu Sou o Irmão de Josh Polonski um simples achado para "vender" o filme, mas uma escolha estética muito bem realizada para narrar o périplo de desespero por um mundo que não pode corresponder às espectativas imaginativas do viajante. De uma granulação forte na imagem, que em momentos não nos consegue revelar nada – nas cenas escuras só vemos alguns borrões –, o filme tem uma plasticidade muito bonita e a obtusidade luminosa do super-8 expressa toda a dimensão psicológica de Abe Polonski, um personagem notável, cassaveteano. Fraco e oprimido por um ambiente (mais mental do que físico) que o esmaga, Abe é a falência de um código existencial que preferiu se distanciar dos males do mundo para assim poder olhar ingenuamente para a vida. Eu Sou o Irmão de Josh Polonski é a prova da insuficiência dessa ingenuidade.

Ruy Gardnier