Herói Acidental,
de Jan Hrebejk


Musime si Pomahat, República Tcheca, 2000

Existe uma piada corrente entre os cinéfilos segundo a qual o filme para ser indicado ao Oscar de filme estrangeiro, precisa apenas ter um ou mais dos seguintes ingrediantes: crianças indefesas, velhinhos sábios, Segunda Guerra mundial, trilha sonora melosa, mensagem de esperança e superação. Como toda boa piada, esta também tem o seu fundo de verdade. E quando sabemos que este Herói Acidental se passa na República Tcheca em plena Segunda Guerra começamos a entender sua indicação ao Oscar... mas se serve de consolo: não há crianças nem velhinhos entre os protagonistas.

Brincadeiras à parte, a impressão que fica sempre num filme destes é que há um número limitado de histórias que se possa contar, mesmo sobre um evento tão grandioso historicamente quanto a Segunda Guerra. Porque nesta história de uma cidade ocupada pelos nazistas, onde um casal dá refúgio a um judeu fugitivo, a maior pergunta deve ser: o que esta situação inicial pode nos apresentar que o cinema já não tenha feito exaustivamente? A necessidade de se aceitar calado alguns absurdos dos nazistas para poder sobreviver? Os erros cômicos ou trágicos que quase podem botar a perder o esquema? As complicadas relações dentro de uma casa que vive com uma pessoa que pode condenar todos à morte? As populações de cidades ocupadas vivendo entre o patriotismo envergonhado, o colaboracionismo escondido e a hipocrisia geral? Tudo isso já estamos cansados, literalmente, de ver, o que torna o desenvolvimento narrativo do filme um certo esforço.

É verdade que ele consegue acertar em uma ou duas instâncias, como o retrato do vizinho colaboracionista, que no começo parece um caricatural calhorda, mas vai trocando de tom tragicamente no final; ou a introdução que a partir de pequenas cenas de menos de dois minutos apresenta 6 anos de evolução (?) da guerra; ou ainda a intriga que envolve uma gravidez. No entanto, isso apenas esconde a confusão estética e temática que toma o diretor, claramente ciente de que precisa fazer algo de diferente mas não conseguindo achar o quê. Com isso temos um absurdamente irritante e repetitivo recurso de câmera lenta usado sem qualquer critério ou efeito, talvez tentando fugir do "look" clássico do filme de época, mas não sendo nem um pouco bem sucedido. Da mesma forma, a trama da gravidez podia insinuar algo de mais poderoso e dúbio na intriga humana, mas se dá sempre no registro do "sacrifício da boa gente" para sobreviver aos tempos difíceis.

Por isso, quando chegamos aos planos finais, quase patéticos na sua elegia brega do "espírito humano superando os tempos difíceis" fica claro qual tipo de público o filme se dirige: os velhinhos da Academia, que certamente choram com aquela câmera lenta, os planos em contra plongé, a trilha sonora redentora, a aparição dos mortos em meio às ruínas. Para eles, e para grande parte do público que não se cansa mesmo de ver sempre as mesmas coisas, o filme é programa ideal. Para quem quer que busque algo mais, especialmente numa maratona de cinema como um festival, melhor nem tentar.

Eduardo Valente