A Lua no Deserto,
de Shinji Aoyama


Tsuki no sabaku, Japão, 2001

Desert Moon é o oitavo filme de Aoyama Shinji e seu primeiro depois do sucesso de Eureka, surpresa do último Festival do Rio. Trata da história de Nagai, um empresário de sucesso que trabalha com desenvolvimento de tecnologia para a Internet, que passa por uma crise familiar. Sua esposa o abandona levando sua pequena filha, refugiando-se num quarto de hotel e no copo. Nagai passa a viver atormentado pelas lembranças, preso às imagens de uma pequena câmera digital, destruindo seu relacionamento com os sócios da empresa. Ele conhece por acaso Keechie, um jovem michê, para quem faz uma proposta: encontrar sua esposa e levá-la para a cama em troca de uma boa soma.

O filme começa com uma imagem em câmera lenta mostrando dois corpos deitados na grama, em perfeito conluio com a natureza. Essa imagem-chave, quase uma carta de intenções para o que se segue, é uma referência direta a Um Mundo Perfeito, de Eastwood: trata-se de uma apropriação de significados, de apresentar o conflito interno da trama remetendo àquela outra que traz toda uma carga de um passado de abuso familiar, da morte como libertação, de misantropia, mas também de amadurecimento e aprendizado. Os dois corpos pertencem a Akira, a esposa, e Kaai, sua filha, num adiantamento da situação que compõe o terceiro ato do filme. Segue-se uma montagem ao som de uma bela balada dos Beach Boys, na sequência dos créditos, de intensa melancolia. É essa melancolia, uma revisão das relações humanas e da alienação de Antonioni (melhor dizer uma adaptação contemporânea), que vai dar tom à história das quatro personagens. Eles se encontram, se chocam, interagem sem qualquer troca íntima, isolados cada qual em seu universo particular, cada qual com sua missão.

Desert Moon é um filme difícil, estranho, lento e angustiante. Há um tom de distanciamento e reprovação em relação às personagens que incomoda todo o tempo, exigindo a participação constante do espectador. Talvez falte-nos as referências da cultura japonesa para compreender os objetivos do realizador, mas fica claro que um deles é fazer uma parábola moderna sobre o impacto do capitalismo nas tradições e valores japoneses. Lugar comum nas ficções modernas, Aoyama explora seu tema com audácia e reverência a outro mestre dessa situação que é Ozu.

Um desses filmes que pede uma revisão atenta, Desert Moon corre o risco de ser visto como um filme menor e esquecido na correria de um festival. Só resta torcer para que tenhamos uma chance de revê-lo, e estudá-lo como merece.

Fernando Verissimo