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Candeias, fiel a sua visão extremamente pessoal de construção de uma realidade audiovisual, mostra em Candinho como o maniqueísmo pode não comprometer um filme. Essa é a história de um deficiente mental que se vê obrigado a vender imagens religiosas pela cidade "imunda" e pobre depois de ser expulso, junto com sua família, da fazenda onde trabalhavam sem atingir as metas de produtividade estipuladas por um patrão feudal. Nesse mundo os capatazes e os donos do poder são muito ruins e os injustiçados estão no extremo contrário. É uma falta de nuances em um universo elaborado para não as abrigar. Comum aos filmes de Candeias, nesse o real é único e formado pela junção de uma imagem suja que se completa com uma montagem nada obvia. O som é colocado de acordo com o que o diretor imagina ser melhor. Exatamente dentro dos padrões. Então, a extrema maldade dos vilões e a inocência gritante dos pobres podem ser vistas como uma peça a mais nesse jogo de funções e significados que compõem as suas obras. Passa a ser possível pensar que Candeias não fez o filme para falar sobre o maniqueísmo e as injustiças dessa vida, mas que os filmou porque, dentro do que ele pensava estar fazendo ao realizar Candinho, existia uma exigência desse tipo, uma falta de uma realidade não complexa, bipolar, onde uma ponta é causa e conseqüência da outra e sem as quais o que Candeias imaginou não poderia ter sido colocado em película. Então o grotesco das situações, da cidade, da vida de Candinho e do próprio personagem assim aparece como algo natural, não forçado. Se alguma coisa tem que chocar o público, que não seja o que foi filmado, mas como foi filmado. O sofrimento arrasador das pessoas, a feiúra intrínseca de tudo o que é colocado na tela não são mais incômodos. Sabemos que a verdade não pode ser tão facilmente colocada. Candeias sabe disso melhor do que todos nós. O maniqueísmo de Candinho não passa de escolha estética para uma concepção autoral do que é o audiovisual. Nesse caso, não é só um grito em defesa dos oprimidos, mas muito mais uma vontade de liberdade absoluta na forma de se pensar cinema. Quem quiser ver outros conflitos maiores, esteja à vontade. João Mors Cabral
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