Batalha Real,
de Kinja Fukasaku


Battle Royale, Japão, 2000

A situação chave de Batalha Real, o argumento inicial armado para colocar em confronto as figuras inocentes de 40 adolescentes condenados a se matar numa ilha, é extremamente curioso e se mostrava potencialmente um espaço de discussões de forte valor para os dias de hoje. A partir do absurdo de suas regras, o filme-jogo estabelece o tom de ironia fina que faz do filme não apenas imagens violentas mas uma metáfora para uma suposta sociedade selvagem dos dias atuais.

O que decepciona no filme, porém, é seu encaminhamento narrativo: deixando de lado a postura distanciada, documental de suas primeiras imagens, Batalha Real acaba elegendo uma dupla de personagens como protagonistas-heróis de sua trama. Ao invés de manter as discussões em torno do absurdo e do incompreensível daquela estranha lei que estabelece o auto-extermínio de jovens japoneses – o filme se foca na caminhada de um casal de jovens ingênuos. Dessa forma, perde metade de sua energia; já que passa a se mostrar como uma história contada no passado, isso é, acompanhando os passos passados dos heróis já sabidos. Perde-se a urgência das imagens perdidas, aos poucos vamos tomando partido naquela guerra e o que poderia ser um espaço de discussão riquíssimo se resume a uma fuga de dois jovens do mundo louco que os circunda.

Todas as tentativas dos personagens de se agrupar e se salvar juntos vão por água abaixo. A união passa como uma utopia incapaz de se colocar num mundo de desconfianças e onde todos traem a todos. A resposta do filme para a vitória é a união egoísta de um casal que, apesar de começar pacifista, termina o filme comprando uma arma para cada um e indo enfrentar o mundo real das ruas de Tóquio...

Uma conclusão perigosa e egoísta que resume a sociedade contemporânea como uma espécie de jogo de violência onde aqueles que não estiverem armados e/ou não souberem correr, estarão condenados...Corra! diz o letreiro final do filme, instigando a platéia a tomar parte daquela batalha...

Um filme que se inicia com uma narrativa incerta e politicamente impressionante e que acaba por se resumir na vitória de dois indivíduos diante da inimiga sociedade repressora... Nesse ponto do filme, a rica ironia de seu início se perde, e vemos apenas realmente a vitória dos dois adolescentes. A ironia é substituída por um sarcasmo perigoso, negativista e que se perde em velhos códigos dos filmes de ação tais quais perseguições, tiroteios intermináveis e afins. Quanto mais grosseiras as cenas de violência em Batalha Real, mais forte seu sentido de ironia. Quanto mais diluídas na tentativa de identificação do espectador com o casal, menos interessante se torna e menos estimulante se mostra à violência absurda de suas imagens.

Um bom argumento derrotado pela tentativa óbvia de se criar heróis e pela fuga fácil como resposta a uma sociedade inimiga em comum de seu egoísmo... "Não confie em ninguém..." diz um dos personagens mais experientes, enquanto outro, com trejeitos de inimigo do finado Jaspion, surge em meio às chamas de uma explosão... com ainda mais sede de vingança.

Felipe Bragança