Batman, O Filme


Batman foi um dos heróis da DC que mais sofreu nas mãos dos mercautores. Perde para o Super-homem, que foi morto e ressuscitado numa saga inverossímil, onde falaram mais alto as decisões mercadológicas que a integridade do personagem. A morte do Super-homem nos quadrinhos foi o começo de uma agonia que culminou com a queda nas vendagens das comics americanas no Brasil e no mundo.

Talvez os quadrinhos estejam passando hoje pelo que o cinema passou no início dos anos oitenta. O cinema perdeu espectadores para o vídeo, assim como os comics para os jogos digitais cada vez mais sofisticados. A transposição das salas de cinema para shoppings seguiu um caminho natural: um filme cercado de produtos por todos os lados. Para a família não perder tempo. Depois da sessão, compre os produtos do filme. Rapidez e comodidade. Os heróis dos quadrinhos também deram sua resposta: passaram a perder suas características próprias, pois o mercado exige adequação ao minuto precedente. Foi comum na década de noventa, a transposição do herói para o futuro: Homem-Aranha 2000, Batman 2000, com suas roupas e poderes revitalizados; ou sua transgênese, quando um herói era criado com a fusão de dois outros, tipo: Homem de Ferro com Capitão América, resultando no American Ferro, ou algo assim.

Batman, de Tim Burton foi feito no período de agonia dos heróis dos quadrinhos. A estagnação de Batman já havia sido muito bem captada pelos traços e arte de Frank Miller no memorável Cavaleiro das Trevas, uma revista visionária. Ali, o projeto de destruição do personagem tomava forma, concluindo-se mais tarde com a realização do filme de Burton.

Se Clint Eastwood fizesse o papel de Bruce Wayne, Batman seria um filme realmente bom. Mas o escolhido foi Michael Keaton, que desenvolvera bem o papel de Beetlejuice, em Os Fantasmas Se Divertem, muito embora não tivesse o tipo Wayne. O resultado foi a presença tosca de Keaton dentro da fantasia de Batman. Não houve compatibilidade de gênio entre eles. Tanto é verdade que as continuações da série tiveram outros nomes representando o herói. Que também não criaram identidade com ele. Este demérito da série pode ser perdoado pelo show dado pelos vilões protagonistas, principalmente nos primeiros episódios. Talvez o diretor se identificasse mais com os vilões sinistros, em suas fantasias megalômanas, que com as bat-neuroses.

O Coringa-Nicholson vale a pena ser visto. Está sempre à vontade com o sorriso cínico. A seqüência em que ele entra na galeria de arte e destrói tudo, sujando os quadros, quebrando as esculturas, é uma atitude punk de ares bem saudáveis. A melhor seqüência do filme.

A construção dos personagens é bem fidedigna às origens. A história de Batman, de como se tornou um herói, respeita a versão dada pelos quadrinhos. Isto, de uma certa forma, faz com que nos irritemos menos com a presença estranha de Keaton. Pelo menos algo verossímil enquanto Batman é apresentado no filme.

Gothan City também ajuda na caracterização do personagem. A cenografia, o figurino, a música além de fornecerem o ambiente, são elementos que mantém a unidade estilística com os outros filmes do autor, que participa ativamente na confecção de seu universo, desenhando os personagens e o cenário. A linguagem dos quadrinhos também é uma referência na obra de Burton, o que faz com que a narrativa não soe artificial ao ser transposta para a cinematográfica.

No final das contas podemos dizer que Batman, O Filme, apesar de seus bons momentos, não consegue salvar a agonia do herói por muito tempo. Os outros títulos da série confirmaram o cadáver comercial em que foi tornado o nosso Homem Morcego, ao ser interpretado muitas vezes de maneira leviana, aproveitado em histórias inexpressivas, ocas, repetitivas. Talvez, no futuro, o Batman que fique em nossas memórias seja o do seriado de tv mesmo: o barrigudo e aboiolado anti-herói.

Guilherme Sarmiento