Senhor
Póuer, o filme
curitibano de Candeias
O Estado do Paraná, 23 de fevereiro de 1989

Único
filme de Candeias que está invisível para Contracampo (excetuando
os curtas e médias de antes de A Margem), preferimos publicar
uma das poucas matérias relativas ao curta-metragem Senhor Póuer,
produzido por Valêncio Xavier e rodado em 1989. (RG)
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O
cineasta Ozualdo Candeias passou os últimos quatro dias em Curitiba
fazendo o que mais gosta: filmar. Resultado: concluiu um curta-metragem
iniciado há dois anos e fez a documentação sobre
a transferência do Museu da Imagem e do Som para sua nova sede.
Domingo,
19, com uma equipe formada por remanescentes da turma que freqüentou
suas aulas num curso de cinema que orientou na cinemateca do Museu Guido
Viaro, em fevereiro de 1987, pôde, finalmente, concluir as seqüências
que faltavam para que Senhor Póuer possa ser finalizado
e inicie, com certeza, uma carreira em festivais nacionais na categoria
de Curta, 35mm. Já para a Secretaria de Cultura – que o trouxe
para um novo curso de cinema, acabou fazendo um vídeo que não
só documenta a mudança do MIS para sua sede definitiva,
como também mostrará a importância do Museu dentro
da comunidade.
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Mister
Póuer ou Senhor Póuer, a partir de uma idéia
original de Valêncio Xavier, TV-man, hoje diretor do MIS-PR, é
um curta-metragem sobre o jogo de poder que um cidadão, com uma
simples "carteira de autoridade" exerce sobre uma humilde família
que sobrevive apanhando papéis e caixotes no Centro da cidade.
Totalmente rodado em exteriores – Largo da Ordem, Bacacheri, Favela da
Vila Pinto – o filme seria uma produção da Cinemateca, como
parte prática do curso de cinema que Candeias aqui veio orientar
há dois anos. Mas, para variar, a Fundação Cultural
fez das suas: calculou o orçamento tão reduzidamente que
a verba não deu nem para custear os negativos. Pior ainda: devido
ao mau tempo, as filmagens foram retardadas e havia necessidade de Candeias
permanecer por mais dois dias na cidade. O que fez, na época, o
poderoso presidente da Fucucu? Negou a estadia extra ao cineasta.
Íntegro e independente,
Candeias irritou-se e voltou para São Paulo levando os negativos
filmados com sua câmara Ariflex 35mm. Desiludido com a experiência,
nem pensava mais em aproveitar o material mas ao observar o copião
notou que tinha boas imagens nas mãos. Assim, investindo recursos
próprios adquiriu mais duas latas de filme vigem e vindo a Curitiba
para um novo curso - bem organizado, graças à competência
de Valêncio Xavier, decidiu aproveitar a ocasião para concluir
o filme. Cidinho Marques, fotógrafo, funcionário da Cinemateca
e sobretudo excelente caráter, generosamente se dispôs a
remontar a produção (que mereceu, há dois anos, os
seus melhores esforços), conseguindo reunir novamente ao menos
os intérpretes centrais - Adelvani de Lima (uma morena promissora),
Romi Costa Braco e Laerte Rattier e parte da equipe original: Mauro Bride,
Valdir Rigamonte, Fabiano Faccione, Charles a Silva como assistentes de
câmara; Guido Pelegrino Viaro (neto do pintor, filho de Constantino),
Gérson Carvalho e Juliana Vieira na assistência de produção
e mais Carla Cristina Soar e Luciene Gomes, na assistência e continuidade.
Graças a esta esfuziante e idealista juventude, no domingo, desde
as primeiras horas da manhã, aconteceram as tomadas finais – feitas
em um depósito de lixo na Vila Guaíra.
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Simbólico
em sua crítica ao poder, com belas imagens de Curitiba – como se
pode observar pelas imagens montadas num primeiro tratamento, transcrito
em vídeo e que Candeias mostrou à equipe - Senhor Póuer
tem aquela objetividade crítica que o faz um dos cineastas brasileiros
de voltagem. Através de uma viagem pelas ruas de Curitiba (num
dia de greve de ônibus, um cidadão obriga um carregador de
papel a transportá-lo em seu carrinho; fica com seu dinheiro; aproveita
sua comida e violenta sua esposa), Senhor Póuer deverá
ter o mesmo impacto que, há 25 nos, A Margem – também
uma viagem de deserdados da sociedade, ao longo do rio poluído
Tietê, em São Paulo - provocou, fazendo a crítica
nacional reconhecer o talento de Candeias
O
filme, com uma fotografia coloria esmerada, não terá diálogos
- apenas alguns letreiros irônicos, ao estilo do cinema mudo. A
trilha sonora, musical, deverá ser fundamental (em A Margem,
quem fazia a música era o Zimbo Trio, então no auge de sua
forma bossa-novista) e não há diálogos.
Dependendo
da finalização, Senhor Póuer poderá
disputar a categoria de 35mm, curta, no próximo Festival de Gramado.
Uma forma, ao menos do Paraná não ficar totalmente ausente
do mais importante festival do cinema brasileiro.
Aramis
Millarch
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