Crônica

 

Não tive oportunidade e disposição para acompanhar o Festival deste ano, e tampouco pude ir a São Paulo, é pena. Desde o início da mostra anual promovida pelo Grupo Estação, há mais de uma década, que acompanho a folia vendo sempre algumas dezenas de filmes. Foi onde vi pela primeira vez O Processo, A Mulher de Todos, Faça a Coisa Certa, Canção da Estrada, e por aí vai... Pois é, e este ano, durante o período da mostra, vi apenas sete, a maioria fora do circuito nobre, e não acompanhei as retrospectivas. Em suma, não sou nada indicado para apontar erros, ainda mais num Festival que cada vez amplia mais seu público. Mas tem algumas coisas que eu gostaria de observar, algumas reclamações até um pouco contraditórias entre si, como convém aos resmungos.

A primeira, e mais evidente, é sobre o gigantismo da mostra, em comparação com a penúria dos demais meses. Cria-se uma temporada de folia cinefílica, para meses seguidos das peneiras nacionais e internacionais convivendo com as mega-campanhas dos blockbusters. O pessoal do Grupo Estação cada vez mais desinteressa-se por sua herança cineclubística, é um processo natural que nem acho que devemos dar ares de vilania. Mas este espaço está cada vez mais vago no Rio de Janeiro, vivendo de eventuais pequenas mostras, no MAM, CCBB ou no próprio circuito Estação, e também de iniciativas ainda isoladas.

Bem, de toda maneira, foi muito legal, por exemplo, a criação da mostra "Première Latina". É um espaço para aparecerem filmes feitos daqui do lado e que, às vezes, a gente nem fica sabendo que existem. Por outro lado, é lamentável o esvaziamento da mostra "Tesouros da Cinemateca". Ambas as mostras são fundamentais, nesse mar de filmes tão complicado de filtrar. Poderiam ser feitas em outro período do ano, para receberem o destaque que merecem. Mas aí talvez não se viabilizassem.

Nessa confusão de nomes, cada um apela para as suas idiossincrasias para fazer suas escolhas. Diretores, atores ou países, algum terá que ser o critério de escolha. Desta forma, essa ausência de perfil do Festival chega a ser cruel. Melhor seria se dividisse em duas temporadas, uma só para os filmes do ano, outra só para retrospectivas diversas. Por menor que fosse, alguma ordem já se dava ao caos.

Mas, quanto às minhas opções, chamam-me a atenção as cinematografias de três países, nos quais arrisco minhas fichas, a espanhola, a portuguesa e a argentina.(Além, é claro, da brasileira).

Da primeira, vale notar o filme de Bigas Luna, ainda de estréia incerta, Volaverunt – A Maja Desnuda. Da segunda, Carlos Reichenbach já nos chamou a atenção sobre a coragem do filme de Pedro Costa, No quarto da Vanda. Dos argentinos, é pena que tenha passado em brancas nuvens a comédia amarga O Armário, tão ligada à nossa época, tão corajosa e original.

Pena que estive atolado no mês da festa. Sem dúvida é isso que motiva meus resmungos, e bem que eu quero poder acompanhar tudo no ano que vem. Mas que seria mais fácil se as mostras se dividissem melhor ao longo do ano, ah, isso seria, com certeza...

Daniel Caetano