Tuvalu,
de Veit Helmer
Tuvalu, Alemanha/Bulgária,
1999
A primeira palavra que vem à
cabeça ao final da projeção de Tuvalu é:
ingenuidade. Uma ingenuidade "do bem", sem dúvida, dentro
deste novo tipo de classificação tão na moda hoje
em dia. Mas, ainda assim, ingenuidade.
O filme percorre um fascinante
caminho onde, no início, o espectador o enfrenta com estranheza,
procurando decifrar as "regras" do jogo proposto. Primeiro de
tudo: um filme sem diálogos, ou melhor, com diálogos ininteligíveis,
ou apenas expressões gestuais. Em segundo lugar, uma terra não
determinada, num tempo incerto, marca de um certo cinema que, dependendo
da análise, pode-se chamar de "globalizado" ou de universal,
que é o enfoque buscado aqui, claramente. Os personagens são
interpretados pelos atores num estilo antinaturalista, over, perto do
registro típico do cinema mudo, claramente uma inspiração
para a figura do clown que é Anton, o personagem principal.
Esteticamente, então, o filme tenta se equilibrar sobre esta estrutura.
Por si só isso é um feito, pois uma vez que a novidade deste
modelo radical caia, o espectador dificilmente se mantém interessado
estritamente pela proposta estética, o que faz desta opção
uma armadilha tanto quanto um atrativo.
Então, embora superficialmente
o que vá se discutir mais sobre este filme sejam estas opções
estéticas, deve-se necessariamente ir além e ver se o que
está por baixo sustenta a superfície. Neste ponto é
que o filme se mostra ingênuo e "do bem", ao mesmo tempo.
"Do bem" acima de tudo pela idéia básica que o
move: retratar um grupo de pessoas claramente marginais e decadentes,
numa alusão bastante óbvia aos países socialistas
pós-Muro, de forma carinhosa, respeitosa, e acima de tudo, calorosamente
humana, mesmo no exagero. Acreditando sempre no sonho, que é o
que não apenas os move adiante, mas os faz ver beleza na decadência
que os cerca. "Do bem" ainda quando aparecem as forças
da modernidade ("technology system, profit", a única
frase compreensível do filme), tentando demolir o espaço
da piscina pública habitado pelos personagens para realizar um
projeto arquitetônico moderno.
Esta linha narrativa ganha uma
força especial por conta do clima absurdo que cerca o ambiente
e os personagens, típico do melhor cinema do Leste Europeu, e que
tira um pouco da obviedade retratada ("moços maus querem acabar
com os sonhos de moços bons e ingênuos"). Isso porque
não deixar de ser fantástico ver um homem obcecado por derrubar
uma piscina decadente no meio de uma imensa planície vazia e derrubada,
quando poderia construir algo em qualquer outro lugar. Este tipo de lógica
antinatural é que empresta o charme ao filme, e que mantém
o espectador surpreso pelo caráter onírico das suas imagens.
Quando chegamos ao final é
que o olhar mais atento percebe a verdadeira ingenuidade do realizador.
Jurando que está filmando um final poético, em que Anton
e sua amada somem juntos no horizonte após a demolição
da piscina e a internação do "vilão" num
hospício, o que ele acaba propondo é o exato contrário
do que ele parecia defender. Uma saída individual e escapista onde
a luta através da união coletiva dos marginais, que compõe
a mais bonita sequência do filme na piscina, é deixada para
trás e esquecida. Não se constrói nada coletivamente
para o futuro. O capital não chega a vencer o sonho, mas o desestrutura
e força os personagens à uma fuga individual. Pode ser um
retrato da atualidade, mas não pode ser uma mensagem de futuro,
de sonho, de utopia, que é o ambiente do filme até aí.
Em suma, um filme de ótimas intenções, grandes momentos,
mas sem a força ou a coragem, ou mesmo o interesse de ir até
o fim no que propõe.
Eduardo Valente
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