Minha Cidade,
de Yousri Nasrallah


La Ville, Egito/França, 1999

Minha Cidade traça o percurso de Ali, um jovem de uma família de mercadores que deseja fazer uma carreira no teatro. Ele interpreta no teatro de variedades local, com sucesso. Mas ali não há futuro: num diálogo com o grande ator do local, vemos que mesmo os grandes homens do teatro acabam sem seu reconhecimento. A figura narrativa principal de Minha Cidade é o impasse: ele jamais tem uma boa saída para seu futuro: largar a cidade, viajar à França, tornar-se lutador de boxe em lutas armadas, mendigar, etc.

A singularidade do filme, e seu maior interesse, reside no profundo amor com o qual Nasrallah filma o cidade e seus povoadores, ajudado pela rapidez e documentalidade da câmara digital. Os momentos de agregação de amigos são filmados com um coração aberto e sem pressa, dando uma espécie de serenidade ao filme. Lembra-se ao menos uma cena, impressionante, em que Ali se reúne com os amigos para beber cerveja, à noite, boiando numa piscina natural. A cena é iluminada apenas com dois lampiões incorporados à cena, mas é o suficiente para nos sentirmos em casa dentro do filme.

Mas nem tudo são flores na vida de Ali, e nem em alguns momentos de escolha de direção. Quando Ali decide não entregar uma luta e é atropelado, ele é levado para um hospital e perde a memória. Os momentos no hospital, apesar de emotivos, são filmados com um procedimento desagradável: a luz inteira na médica enquanto o fundo permanece azul, em sobreposição, dando um tom absurdo de irrealidade a uma cena que entretanto deveria ser filmada com um máximo de realidade possível.

Mas Minha Cidade encanta pela história de Ali, jovem humilde que sonha ser Robert de Niro em Touro Indomável e é reprovado pelo pai na carreira. O filme acompanha o personagem com igual humildade, filmando sempre a interação de Ali com seu meio – afinal, o filme chama-se Minha Cidade –, e tem a verdadeira profundidade de jamais querer terminar alguma coisa, jamais dar a chave de ouro. Mesmo quando termina, o filme não dá lição de moral, não conclui: ele apenas acompanha seu personagem por uma hora e meia de filme, e deppos o abandona como encontrou: preso à fugacidade do momento, na porta de um ônibus lotado, em movimento.

Ruy Gardnier