Maborosi – A Luz da Ilusão (Maborosi no Hikari),
de Hirokazu Kore Eda (Japão, 1995)

Se algum dia alguém te perguntar porque o cinema é tão fascinante você pode responder: "Porque na mesma semana no Rio estréiam Star Wars, O Evangelho das Maravilhas e Maborosi". Como podem existir três representantes tão diferentes da mesma arte?? E cada um vai ter seus fãs inveterados defendendo que o seu é o melhor, e isso é muito bom. São 3 filmes sobre o qual muito há de ser falado mesmo.

Maborosi é um filme brilhante porque é um filme sobre gente. Sobre estar vivo e como pode doer tanto e ao mesmo tempo ser tão gostoso fazer parte deste mundo. É um filme onde a noção de ação é completamente subvertida. Pouco acontece de fato que se possa narrar. Muito acontece dentro dos corações e mentes, seja de personagens ou dos espectadores. Se vivêssemos no meu mundinho ideal, Maborosi seria um filme entendido e apreciado por todos. Porque é um filme sobre o que significa de fato "ser humano".

O filme de Kore Eda não se critica, se vive. É muito redutor tentar explicá-lo em palavras. Mas, como este é nosso meio, vamos lá: Yumiko, jovem mulher que carrega consigo um trauma da infância, vive feliz com seu jovem marido e o filho recém-nascido. Até que um dia o marido morre atropelado por um trem. Como fazer para recolher os cacos da sua vida daí para frente?? Descrito assim, parece um filme depressivo. Não é. Maborosi é na sua maior parte uma celebração da vida. Mas, a morte e a dor são parte da vida, então elas comparecem, mas sem serem as donas do filme. Nesta obra reconstruir a vida é o que importa. Como é típico dos japoneses, pouco é demonstrado em palavras sobre os sentimentos. E só no final nos é revelado sobre o que o filme realmente trata (e o sentido do termo Maborosi), numa das cenas mais belas do cinema moderno. De resto, Maborosi é um retrato de vida cotidiana, sublime, silencioso, com a câmara sempre parada, com a trilha compondo a cena sem tentar impor uma dramaticidade onde não há.

Haveria mais a escrever sobre cada plano do filme, mas não cabe aqui pois poderia estragar a surpresa de vê-lo pela primeira vez. Ao final desta obra belíssima o espectador se pergunta: o que foi mesmo que aconteceu no filme?? Nada a não ser o milagre e a dor disso que chamamos vida. Ou como disse uma vez o grande quadrinista Lourenço Mutarelli:

"Entre o nascer e o morrer
existe um momento efêmero único
de um fascínio estúpido
a que chamamos vida.

É pena que são poucas as vezes em que percebemos isso
É pena que são poucas as vezes que nos deixam perceber isso."

Eduardo Valente